sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Além da IMaginação

A série de TV “Além da Imaginação”(Twilight Zone) foi uma das coisas mais interessantes da época em que surgia o videocassete e a transmissão via satélite. Em Belém esteve no Canal 2(TV Marajoara), filial da Rede Tupi. O apresentador era Rod Serling, autor da maioria dos roteiros. As filmagens eram feitas na MGM. Mas tinham historias de Richard Matheson, hábil em sy-fy, morto este ano aos 87. Ele chegou a assinar 16 episódios. E a maioria era criativa, pulando armadilhas de mesmices. Revejo hoje boa parte da primeira temporada desta série(1959/60) reeditada em DVD.Alguma coisa envelheceu, mas ainda há episódios que dignificam a saudade da estreia.O que mostra uma cidade edificada nos sentimentos de um homem saturado das injustiças de um trabalho árduo, aquela comunidade antiga que ele vê de um trem e que acaba por desembarcar e na realidade aparecer morto é um deles. Também o da jovem motorista que vai trocar pneu careca de seu carro e daí em diante passa a ver um mendigo pedindo carona. Quando ela sente necessidade de uma voz amiga e telefona para a mãe sabe que esta se encontra hospitalizada pelo trauma da morte da filha em desastre rodoviário. E há muito mais nos 5 discos que estão sendo vendidos em um estojo cada um com 5 episódios. Amostragem de um cinema imaginoso que hoje faz falta...

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Dois Filmes Nacionais

“Elena” é um filme privado lançado corajosamente em público. Explico: a irmã da principal personagem fez o trabalho colando sequencias de filmes domésticos realizados desde que ela era criança (e a irmã, personagem-título, bem mais velha). Basicamente trata da busca pela tal Elena que se foi para os EUA| tentar o meio artístico. Não deu mais sinais de vida. Petra, a irmã, vai atrás. E a busca não dá conta das pouco mais de duas horas de projeção. O que interessa é o que sentia a cineasta, o quanto ela amava a mana. É impressionante como os filmes familiares deixam margem à difícil poesia cinematográfica. Não há palavras descrevendo os fatos. Na verdade Elena morreu –e dizem que se matou. Mas entre as lágrimas de irmã e de mãe estão as cenas da vida em comum e do sonho da jovem, perseguido sem se alcançar. Vendo este filme em seguida a “O Concurso” renovo meu respeito pelo cinema nacional. Sim, pois “O Concurso "é o que de pior se pode fazer com câmeras. Piadas gastas pelo uso, estereótipos da mesma forma, reprisam a pretensa comédia norte-americana “Se Beber Não Case”. Só que desta vez não se trata de casamento. Há sexo como nas pornochanchadas de todos os tempos, mas um Zach Galifianakis não existe. Ainda bem que o endereço às plateias descerebradas não é a única alternativa em programação. Há saídas como “Elena”. Mesmo que muitos espectadores saiam no meio do filme. Difícil se acostumar com cinema denso.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Aniversário de filmagem

Precisamente há 62 anos filmei pela primeira vez. Meu pai me deu uma câmera 16mm Bell Howell com magazine para 50 pés. O problema é que eu nada sabia de fotografia e nem manejar fotômetro. Soube que a abertura do diafragma em 11f ou 16f dava para se ter, à luz do dia, boa imagem (com filme Super X ou XX). E assim agi. Em 1952 cheguei a fazer pequenos filmes de ficção com vizinhos e gente de minha casa. Fui aprendendo errando e muito devo a Fernando Melo que me ensinou muita coisa dessa arte que nesse tempo precisava de técnica hoje suprimida com os enfoques automáticos. Filmei depois com câmera maior e usando rolos e 100 pés. Fazia a edição na hora da filmagem para não cortar filme positivo (não tinha recursos para usar negativo e copião). Só guardei dois títulos dessa aventura. Aprendi cinema vendo e fazendo. Lembro com saudades dessa ousadia.

Paciência Equina

Agnés Hranitzky e Béla Tarr são diretores húngaros. O ultimo, de 58 anos,é conhecido por suas sequencias de uma só tomada, extremamente lentas,fato que chegou a influenciar cineastas de outras plagas como Gus Van Sant. Esse tipo de linguagem o cineasta e companheiro usam em “O Cavalo de Turim”(A Torinói Ló/2011). Mais: as tomadas são geralmente fixas, com a câmera no tripé (ou grua). Lembrei ao ver o filme “Sacrifício”(Offret) de Andrei Tarkovsky onde uma tomada ficava na tela e só mudava depois da gente ir atender telefonema ou comer qualquer coisa. Não tenho afinidade com essa forma de “cinema d’art” como dizem os franceses. Para mim cinema é mesmo cinemática, é movimento. Outro dia revi em bluray “Janela Indiscreta”(Rear Window) de Hitchcock. Podia passar sem falas (embora elas deixem o tom sarcástico que pinta os tipos). A gente entende o que as imagens apresentam. Puro cinema. Em “Cavalo de Turim” mais de duas horas e meia são gastas na edição final para mostrar pai e filha numa cabana no meio do nada com muito vento e frio por fora e até um poço sem água. Pouco falam, pouco se define quem são. Num prólogo cita-se Nietzsche quando de uma feita o filosofo apartou um homem que maltratava seu cavalo e por isso sofreu, ao que se supõe, uma isquemia que o deixou doente até morrer. Béla Tarr é tido como filosofo, pelo menos pretendia isso até se tornar cineasta (o que não quer dizer que tenha abandonado a tendência quando se meteu em outra forma artística). Mas se o filme do cavalo é uma situação bem demonstrada, afinal a solidão dos personagens passa na lentidão narrativa, isso é o equivalente de se tratar uma caminhada de alguns quilômetros sem cortar planos, seguindo o corredor com a câmera posicionada em ângulo estratégico (como do alto de um edifício). Não se fala dos atores, todos expressivos como figuras de uma situação. Mas sempre se pergunta pelo motivo de estarem morando num casebre perdido numa área indefinida, algumas vezes tentando sair mas sem conseguir fazê-lo. Lembrei “Vidas Secas” que Nelson P. dos Santos fez do livro de Graciliano Ramos. O enfoque é semelhante, mas as vidas molhadas do filme de Tarr não estão ali para mostrar o cenário de seu drama. E os personagens de “Vidas Secas” não precisam ficar parados assim como a objetiva define bem onde vivem sem precisar dormir num enfoque. Basta a luminosidade natural da fotografia de LC Barreto para definir a “secura” fotogênica. E mais: o filme brasileiro gasta na tela pouco mais de 100 minutos. E diz de quem e do que se trata. “O Cavalo de Turim” no máximo diz do quadro feito. Parece que o que fica é a ira de Nietzsche, e felizmente o espectador não fica doente como ele ficou.