segunda-feira, 24 de outubro de 2016

O Homem nas Trevas

“O Homem nas Trevas”(Don’t Breath/2016) é o que o americano chama da “thriller”, um projeto feito para assustar plateias com um tema fixo e “décor” único. Trata da invasão da casa de um cego por 3 ladrões (dois homens e uma mulher).O dono da casa, que vivia só, teria recebido muito dinheiro da família de uma pessoa que atropelou e matou sua filha. Mas o cego, que é um ex-combatente da guerra no Iraque, não é uma figura dócil como a que Audrey Hepburn encarnou no filme semelhante “Um Clarão nas Trevas”(Wait Until Dark/1967) de Terence Young, Aqui, sob a direção do uruguaio Fede Alvarez, é violência em série. O cego consegue transformar-se de vitima em vilão, atacando e matando os ladrões.
                Quem viu “Enterrado Vivo”(Buried)do espanhol Rodrigo Cortés, ganha uma reprise emocional. Difícil não tomar parte no suspense oferecido pelo uruguaio Fede Alvarez  nessa historia de cego versus gatunos (que acabam sendo as vitimas). São pouco mais de hora e meia de planos próximos bem cortados, bem montados, com atores impondo mascaras aceitáveis (especialmente Stephan Lang que faz o cego e Jane Levy a mocinha da trama, ou a ladra por quem se derrama simpatia). Também há um cachorro feroz que auxilia o suspense. Tudo oferecido em uma combinação exemplar de cortes, iluminação e efeitos sonoros.
                O filme de Fede Alvarez consegue irmanar com o do colega que tratou do motorista de caminhão enterrado vivo no Iraque. Não é fácil fazer esse tipo de cinema. É barato mas exige o arsenal técnico competente.

                Valeu.

Crianças Peculiares

O filme de Tim Burton “O Lar das Crianças Peculiares”(Miss Peregrine’s Home for Peculiars Children)deriva do livro de Ransom Riggs com roteiro de Jane Goldman.Para o trabalho o diretor usou uma cenografia modelar e atores como os veteranos Terence Stamp, Judi Dench,Samuel L.Jackson e Rupert Everett, ao lado de novatos como Asa Butterfield o garoto de “...Hugo Cabret” o filme 3D de Martins Scorsese.
            Não conheço o original, mas pelo filme penso que o roteiro tomou liberdades que o fizessem mais vendável. De base fica a ideia de que o mundo da infância, gravado na memória, luta contra a realidade que domina a idade adulta. São respectivamente os peculiares de miss Peregrine(Eva Green) e os monstros guiados por  Barron (Samuel L.Jackson) . Nesse quadro o jovem Jake(Asa) se impressiona com as historias do avõ(Stamp) e quando este morre de forma misteriosa ele virtualmente se transporta para a ilha que o velho lembrava, ganhando uma fenda nesse terreno e indo encontrar um prédio em ruinas que logo se recompões saindo do que aconteceu em 1943 quando bombardeios alemães o destruíram, mantendo-se incólume num hiato temporal que significa a perenidade da inocência infantil, enfim a base para ser uma criança peculiar.
            O final é que dispara contra a base poética dos mundos antagônicos que se digladiam com os anos.Passa a um caráter “realista” e transforma a viagem no tempo perdido em uma aventura com bandidos e mocinhos a ganhar até mesmo um beijo final.
            Não sei se Ramson Riggs pensou assim. O que fica é a imposição comercial que deixou a Tim Burton apenas a fantasmagoria que lhe é cara, retratando os feiosos vilões e as crianças vestidas de branco com uma orientadora com jeito de fada que se transforma em pássaro. Nem sei se o autor pensou no romance de uma adolescente fantástica com o rapaz que surge de visita à sua morada e acaba lhe acompanhando por um metafórico circo londrino que serve de escape aos “peculiares” indo acabar no tombadilho de um navio como aquela dupla do “Titanic”. Enfim, o filme foi feito para divertir e usar o recurso da 3D para dar ênfase ao fantástico mui caro ao diretor. Uma pena, pois quem tem mania de pensar vendo cinema queira mais...

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Cinema Espanhol

Do programa de filmes novos espanhois que chega agora ao nosso centenário Olympia destaco “Flores”(Loreak) de José Mari Goenaga (exibição dias 22 e 23). Trata de uma senhora que recebe regularmente ramalhetes de flores sem qualquer indicio de remetente. O marido dela quer explicações mas não importa: as flores continuam a chegar e a remessa acaba se relacionando com outro casal, revelando possivelmente a origem com a morte de uma personagem.
O filme não é só um enigma poético nem desvia para um argumento policial. É um estranho quadro de tipos e sentimentos visto de forma retilínea, sem flashbacks, sem alusões analíticas de personagens.
O já visto aqui “Pecados Antigos”(La Isla MInima) mostra como o espanhóis fazem bem o “noir” que o americano ( e o francês) jogou na historia do cinema. Os demais filmes mostram um artesanato moderno por assuntos nem sempre bem explorado. Menos “Ártico” que me pareceu tão distante do espectador como o nome no cenário rural (e/ou suburbano) evocado.
Interessante ver como o cinema da Espanha evoluiu da ditadura Franco, quando se limitava aos artistas mirins como Joselito e Marisol e só desviava para o melodrama com Sarita Montiel e provocava a censura com Buñuel logo em transito para o México(o clássico “Viridiana” que irritou o “generalíssimo” quando ganhou a Palma de Ouro do Festival de Cannes).

Vale a pena conhecer esta nova fase de uma cinematografia que sabe explorar o seu quadro geográfico ( uma beleza os grandes planos regionais). 

terça-feira, 18 de outubro de 2016

No Caminho de Marte

Quem curte  ficção cientifica não deve perder este modesto “Aproximando-se do Desconhecido”(Approaching the Unknown”/EUA,2015) feito pouco antes do “Perdido em Marte”(The Martian)de Ridley Scott.
Aqui é só o astronauta em viagem a Marte. Pouco flashback e muito da agonia do homem só, ainda mais quando queima seu aparelho de produzir água, contentando-se com pouco e mesmo assim não desistindo da viagem apesar dos apelos de Huston para cancelarar a missão como aconteceu paralelamente  com uma colega dele, no mesmo percurso, mas saída do rumo.
O roteiro é do diretor Mark Elijah Rosenberg e Mark Strong é praticamente o único interprete fazendo William Stanaforth o viajante do espaço. Careca, só nos últimos planos, marcando o tempo gasto na viagem (mais de 270 dias) aparece cabeludo e barbado , conseguindo chegar ao planeta vermelho e deixando com o espectador sua impressão filosófica à saída, ciente de que foi em uma viagem sem volta.

Nada de efeitos digitais e seres espaciais. O realismo é a meta e a modéstia da produção evoca a coragem dos produtores. Por isso não creio que chegue  a nossos cinemas. Vi em dvd. Busque e acrescente um bom titulo à sua filmoteca de viagens espaciais.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Inferno

Não li o livro de Dan Brown e não posso tocar nas omissões que o filme possui. Mas não me parece que essas omissões cubram os furos da narrativa. Chega a ser hilário o que se passa com Robert Langdon (Tom Hanks) na Italia,Turquia e pouco mais que se espelha como um tapete magico turístico.
                Desta vez Langdon não mexe muito com dogmas católicos como fez nas versões dos primeiros livros de Brown, especialmente “O Código Da Vinci”. Ele começa o filme desmemoriado, num hospital, socorrido por uma doutora que pelo empenho por sua saúde deixa a ideia de uma paixão platônica anciã(ela teria visto o Langdom quando tinha apenas 12 anos, em uma palestra que ele proferiu). Ela se chama Sienna Brooks (Felicity Jones) e na verdade é fanática na tese de que, para melhorar o mundo, deve-se diminuir a densidade demográfica, cultivando e espalhando um vírus que mataria mais da metade da população global.
                Sienna e seu “paciente”  fogem de assassinos visitantes e na fuga passam por diversos pontos de atração turística da Itália. A trama invade “A Divina Comédia”  alegando que Dante Alighieri previu quando escreveu sobre o inferno a morte de meio(ou mais de meio)mundo. Há uma busca da mascara mortuária de Dante que eu não compreendi como Langdon sabia que ela tinha a ver com o vírus mortal (a praga que matou milhares na Idade Media ,chamada de Peste Negra, pode ser a chave de Dan Brown). Mas como fica no filme chega a ser confuso. Interessa apenas um jogo de imagens, com muitos cortes e personagens sobrando as andanças da doutora e seu doente, uma caça do tipo gato atrás do rato que muito aparece e pouco se deixa elucidar. No fim, há uma série de falas que “explicam” as coisas, Parafraseando, seria como explicar mas não justificar. Em tese “Inferno” é um thriller banal em substancia, conseguindo chamar a atenção pela tarimba do diretor que joga com planos diversos em cortes rápidos tentando sempre chamar a atenção de uma plateia que nunca ouviu falar em Dante.

                A esquecer rapidamente exceto na concepção estatística(relação à obra do escritor).

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Mesmices

A falta de imaginação dos empresários ligados ao cinema norte-americano, hoje distantes dos “tycoons” que presidiam estúdios, é patente. Agora mesmo exibe-se “A Bruxa de Blair” e “7 Homens e Um Destino”. O primeiro filme volta ao quase amadorístico de anos atrás que inaugurou a promoção nas redes sociais.É como se técnicos tentassem ver o que aquela gente viu e gravou desaparecendo sem alertar para detalhes do que viu. O outro filme é mais um replay do clássico “Os 7 Samurais” de Kurosawa que já havia dado o western de John Sturges do mesmo nome e que gerou coisas como “A Volta dos 7 Homens” e “A Fúria dos 7 Homens”. O mesmo enredo, com bandidos perseguidos por aldeões capitaneados por um valente. Tudo bem que Kurosawa foi no miolo do western, mas voltar a sete vilões para que o gênero volte à gloria é falta de assunto. Mesmo que a narrativa seja boa.

Tenho ido pouco a cinema pois ando cheio das mesmices e do desconforto que hoje permeia as casas exibidoras com cadeiras numeradas e ar condicionado polar. Prefiro o cinema em casa além dos especiais. E pode piorar com o Cine Estação minguando sem o programador, restando o Libero Luxardo e o Olympia preso às embaixadas, por sinal um bom meio a ver, por exemplo, a mostra espanhola a chegar com pelo menos 3 títulos recomendáveis.

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Seriados antigos

Nos 1940 os seriados de aventuras eram fontes de lucro para os donos de cinema. Quase sempre traziam heróis dos quadrinhos. Agora mesmo eu comprei em dvd as séries de Batman, na época aqui chamado Homem Morcego, e Super Homem, ou Homem de Aço, hoje conhecido no original Superman. A Columbia os produziu, o primeiro em 1943, depois em 1948 e o segundo em 1948 e depois 1950. Os cinemas Moderno e Independência, do grupo local Cardoso & Lopes,exibiam esses filmes, primeiramente em séries (cada uma com dois episódios) depois, numa 2ª. ou 3ª.feiras, tudo de uma vez (uma ginastica com o distribuidor que pedia as copias depois de cada exibição de episódio).  Quem mais fazia seriado era a Republic, campeã do gênero, e muito menos a Universal (o caso de Flash Gordon).
                Revi pacientemente os filmes. Santa ingenuidade! Batman lutava em 1943 contra um japonês (interpretado por J. Carrol Naish/1896-1973). Na época os EUA estavam em guerra com o Japão e o inimigo cabia bem num tipo nipônico. Superman era mais sofisticado e seus inimigos variavam de cientistas birutas e um tal de Homem Atômico, vale dizer um sujeito capaz de manejar uranio e ameaçar o mundo com armas nucleares. O ruim dessa série era o fato do herói, ao voar, ser em desenho animado. Não tinha efeito especial para se ver um voo humano, economia da Columbia pois o Capitão Marvel da Republic(1941) “voava”.
                Em todos os episódios há sequencias de brigas. Mocinhos e bandidos distribuem socos e o engraçado é que ninguém perde o chapéu (claro que os heróis usavam suas fantasias). E não se veja logica. Clark Kent(Superman) ou Bruce Wayne(Batman) mudavam de roupa em qualquer lugar e não se sabe onde deixavam essas vestimentas. E cada episódio tinha de terminar em um momento de perigo para  o herói ou comparsas. Mas a garotada gostava disso. Nada de efeitos especiais. CGI era ficção cientifica. Curioso era ver, por exemplo, o vilão do filme de 1943 vendo TV privada. Isso não existia na época.

                Espero que outras séries cheguem em dvd. Não é nada e se recorda um tempo ido onde se exigia pouco para  se divertir.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Francofonia

Em”Francofonia”o cineasta russo Aleksandr Sokurov mostra-se mais explicito, ou na linha tradicional de documentário, apresentando o Museu Louvre(Paris)durante a ocupação nazista, como as obras de arte que lá ficaram, impedidas de serem retiradas por funcionários que previam saque por parte dos alemães e persistiram em seus lugares atraindo visitantes.
O filme tem muitas sequencias de época, mostrando Hitler e seus mandados, e, em planos de reconstituição os oficiais do Reich negociando a riqueza artística e demonstrando conhecimento do objeto.
É um trabalho artesanal correto, mas houve quem esperasse de Sokurov a alegoria que dispensou à sua “Arca Russa’, obra de vulto que por aqui, no entender dos críticos, ganhou o posto de melhor do ano em que  foi exibida.
Valorizando o museu francês, o diretor russo deixa claro que a cultura não tem pátria. É o atestado de inteligência do ser humano.

Vale uma visita ao cinema, no caso o Libero Luxardo por onde se encontra em sessões normais.