Foi em 26 de fevereiro de 1950 que inaugurei o Cine
Bandeirante. Explico: tinha chegado de minha primeira viagem de avião, vindo no
Constelation da Panair do Brasil do Rio de Janeiro onde passei dois meses com
meus pais e minha madrinha. Trazia um projetor sonoro 16mm de marca Revere,
presente de meu pai para que eu aturasse a vida na casa de meu tio, cenário que
não casava de forma alguma com meu jeito de ser.
Logo em casa, às 4 da manhã, botava o projetor para
funcionar exibindo um documentário do carnaval carioca desse ano. Mais tarde
passei a alugar filmes de longa metragem editados na bitola, comércio efetuado
pela firma F.Aguiar onde atuava como diretor um vizinho do Mosqueiro e amigo da
família: Argemiro Tobias.
O primeiro longa a passar no Bandeirante (ah sim, o nome se
deve ao pioneirismo no circuito domestico e pelo fato de eu ter viajado num
avião da chamada Frota Bandeirante) foi “Um Rival nas Alturas”da Metro, com
Heddy Lamar e William Powell. Meus vizinhos compareceram em massa à primeira
sessão. E daí em diante fui exibindo o que desse das empresas contratadas pela
F.Aguiar como a RKO (ligada a RCA que ela representava) e mais tarde Art Filmes.
Passando os anos fui descobrindo outras fontes de distribuição, como exibidores
do interior do estado, e programei Warner, Columbia e independentes, só
faltando Fox e United, a primeira chegando quando a empresa exibidora Severiano
Ribeiro aderiu à bitola menor(nos cinemas comerciais usava-se 35mm).
O Bandeirante foi o meu maior aprendizado de cinema. Via de
tudo. Quando surgiu o primeiro cineclube da cidade (“Os Espectadores” em 1955)
as sessões experimentais eram no Band, com a presença do diretor do clube,
Orlando Costa, e quem fosse designado para apresentar o filme na sede da
Sociedade Artística Internacional onde funcionava a exibição.
Tudo funcionava na garagem de casa. Os carros ficavam de
fora e como eu não sabia dirigir seguia o incomodo para meu pai, meu irmão ou
um motorista ligado à família.Só muito epois me dei conta desse incomodo. Mas
foi vendo cinema que aprendi muito na vida. Muito de tudo. E o aprendizado se
fez em todas as formas, vendo do bom e do ruim e logo também filmando(sempre em
16mm), usando raciocínio de quem vê muito cinema para efetuara edição na hora
da filmagem posto que usava filme positivo (o normal seria negativo para fazer
copião e editar). Aprendi fotografia “na marra”. E fui lendo historia do cinema
para não alugar gato por lebre.
O Bandeirante acompanhou minha juventude. Durou exatamente
34 anos. Em 1984 a casa da família estava à venda posto que os donos já se
tinham ido desta vida. A ultima sessão
foi num espaço molhado, com filmes caseiros. Triste.
Hoje vejo filmes em TV. Compro e gravo DVD & Bluray. Meu
Bandeirante 2 tem pouca plateia e muitas vezes sou o único espectador,
adormecendo em meio às estrelas.
Gosto muito de cinema. Viajo através dele e por isso pouco
saio de minhas dependências. E não tenho sequer curiosidade de ver além.A única
saída é para a velha casa na praia do Farol, na ilha do Mosqueiro, onde também
vivi meus verdes anos.
Hoje comemoro com uma festa intima, temperada de saudade, o
cineminha de garagem que me fazia feliz. E era interessante como eu fazia os
programas e distribuía na vizinhança. Cobrava ingresso para poder alugar os
filmes. Todos queriam pagar porque queriam ver os programas. Nunca se pensou
que se estava fazendo historia. Mas estava. Muitos espectadores viraram
cineastas ou escritores & poetas que botaram o Bandeirante em suas
matérias.
Um tempo.