quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Os Últimos Filmes de 2010

Na véspera de Natal re-re-revi “A Felicidade Não se Compra”. É o tônico para se enfrentar um novo ano. Não que me sinta um George Bailey, mas pela sensibilidade tocada por este personagem que o próprio Jimmy Stewart afirmava ser o seu melhor, ou o que mais lhe tocou numa carreira muito rica, edificada por gente como Hitchcock e John Ford.
No fim do período, em sala de cinema, vi Russel Crowe nos passos do colega francês Vincent Lindon, tentando tirar da cadeia a mulher amada. O filme de Lindon, “Tudo por Ela”, era menos tenso posto que a fuga se dava na França. Agora, no que Paul Haggis dirigiu, é nos EUA pós 11-9-01 quando se vê fantasma debaixo da cama. Talvez por isso a fuga francesa pareça menos fantasiosa(e menor em termos de projeção). Mas o remake hollywoodiano(“72 Horas”) diverte. No frio ártico do Cinépolis 7 consegui não olhar para o relógio.
O melhor do fim do ano nas salonas foi mesmo “Megamente” e “Rede Social”. No primeiro caso, a relatividade do que seja um vilão. No segundo, o potencial da internet como o sopro do Grande Irmão de Orwell no já distante (e profético) “1984”. O melhor, porém, foi no DVD caseiro. Mas na revisão do que me impressionou muitos anos atrás, critiquei-me com “A Dama do Cachorrinho”. Na época da primeira visão impressionou-me as aventuras formais do russo Iosif Kheifits, tentando dar imagem ao texto lírico de Tchekhov. Hoje me cansou. Os enquadramentos preciosos, as falas pinçadas diretamente do conto original, a fotografia vistosa de Dmitri Meskhiyev e Andrei Moskvin, tudo me pareceu imposição estética a rebuscar o tema (infidelidade conjugal). Mas ainda assim é um filme marcante. Os russos dos anos 50/60 faziam propaganda de seu regime para ganhar distribuição da Mosfilm. Este cachorrinho latiu fora. E Iya Savvina, a dama, seguia a face angelical de Zhanna Prokhorenko a doce Shura de “A Balada do Soldado”.
Mas eu tratei de bons momentos em DVD. Um exemplo (e eu não conhecia) foi “A Águia Fugitiva” de Roy Baker. O melhor de Hardy Krugger e o único filme nos anos 60 que mostrava um militar alemão da 2ª.Guerra como herói. Caso real. O personagem fugiu dos ingleses de três formas. Voltou a ser piloto do Reich e caiu no mar combatendo. Encantou-se – ou quem sabe encontrou o príncipe de Saint-Exupéry.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

OS MELHORES DO ANO

Votei assim:
Filmes:
1-O SEGREDO DOS SEUS OLHOS
2-TROPA DE ELITE 2
3-TOY STORY 3
4-O SOLISTA
5-AMOR SEM ESCALAS
6-REDE SOCIAL
7-ENTERRADO VIVO
8-ALEGRIA DE EMMA
9-PRECIOSA
10-TUDO PODE DAR CERTO
Diretor- Juan Jose Campanella (Segredo dos Seus Olhos)
Ator- Jamie Foxx (O Solista)
Atriz- Gabourey Sidibe (Preciosa)
Ator coadjuvante- Christopher Plummer (Dr Parnassus)
Atriz coadjuvante- Mo’Nique (Preciosa)
Edição- Daniel Rezende (Tropa de Elite 2_)
Roteiro original – Chris Sparling (Enterrado Vivo)
Roteiro adaptado- Aaron Sorkin(Rede Social)
Fotografia- Nicola Pecorini(O Mundo Imaginário do dr.Parnassus)_
Música- Dario Marianelli (O Solista)
Desenho de produção -Anastasia Masaro(Dr Parnassus)
Efeitos Especiais -Equipe de “A Origem”
Animação – Toy Story 3
Documentário – Senna
Diretor: Juan José Campanella (O Segredo de Seus Olhos_)
Ator- Jamie Foxx (O Solista)
Atriz- Gabourey Sidibe (Preciosa)
Ator coadjuvante- Christopher Plummer (Mundo Imaginário do dr.Parnassus)
Roteiro original- Chris Sparling (Enterrado Vivo)
Roteiro adaptado- Aaron Sorkin (Rede Social)
Fotografia-Nicola Pecorini (Dr, Parnassus)
Direção de arte- Anastasia Masaro e equipe (Dr Parnassus)
Efeitos Especiais- equipe de “A Origem”
Animação- “Toy Story 3”
Documentário- “Senna”
Figurino- Sandy Powell (A Jovem Rainha Vitoria)
Edição- Daniel Rezende (Tropa de Elite 2)
Com isso “los hermanos” ganharam não só a minha preferência mas da ACCPA com mais pontos (deu 5 vezes em primeiro lugar de listas).
Na reunião dos colegas da critica, por sinal muito fraterna este ano, Luzia foi alvo das homenagens pelo seu 38° aniversário de jornalista especializada em cinema (coluna “Panorama”).
O circuito alternativo foi comentado com um presságio nebuloso graças ao sucateamento das salas de exibição no governo que deixa o Pará. Esperam todos que dias melhores cheguem, sem a urucubaca que o filme desse nome dirigido por Cacá Diegues gerou quando da posse de Fernando Colllor.
Na verdade não houve um filme que venha a morar nos meus neurônios pelo resto de meus tempos. Mas fiz valer o melhor do que vi. Oxalá no novo ano veja mais coisas impressionáveis no bom sentido(Belém, dezembro de 2010).

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Blake Edwards

O cineasta Blake Edwards morreu no dia 15 aos 88 anos. Fez de tudo em cinema. E pelo menos deixou títulos marcantes em gêneros opostos: “Vicio Maldito”(Days of Wine and Roses) no drama e “Um Convidado Bem Trapalhão”(The Party) na comédia.
Edwards era casado a mais de 40 anos com Julie Andrews. Com ele a “noviça rebelde” ganhou prêmios internacionais por “Victor & Victoria”.
Eu gostei muito de “Vicio Maldito”, prova da versatilidade de Jack Lemmon, ali fazendo um alcoólatra que tentava tirar a mulher (Lee Remick) do vicio, mas acabava mergulhado nele. E tenho “Um Convidado Bem Trapalhão” entre as comédias que mais me fizeram rir desde que o cinema aprendeu a falar (outro filme é “Quanto Mais Quente Melhor”). Edwards entendia bem Peter Sellers, Ganharam dinheiro e elogios na série “A Pantera Cor de Rosa”. E na TV criou Peter Gun, um detetive a fazer inveja a muitos das tele séries de hoje.
Claro que houve besteira. “S.O.B.” foi uma delas. Esqueçamos. Edwards chegou a um “filme de família” interessante posto que sincero: “Assim é a Vida”(That’s Life). O plot era Julie esperando o resultado de uma biopsia que poderia revelar um câncer. Não era. Festa para todos. Jack Lemmon fazia o alter-ego do diretor e duraria pouco tempo depois disso.
Os nomes que faziam filme agradáveis, sem a violência explicita e os efeitos de CGI, estão desaparecendo. Uma pena. Mas os filmes ficaram. Cinema desafia aquele silogismo irregular (“a vida é uma série de fatores que resiste à morte”).

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A Vez dos Vilões

O desenho animado deixou de ser “coisa de criança”. Hoje já se pode dizer que o vilão é um mocinho que não tem vez. “Megamente”(Megamind) trata disso. Feito pela equipe da Dream Works com direção de Tom McGrath começa gozando a gênese do Super-Homem (Superman): assim como Jor-El e esposa lançam o filho no espaço quando o planeta deles agoniza, outro casal faz o mesmo. O destino das duas crianças é que se tornam diferentes: uma delas pousa num orfanato e o bebê recebe mimos e adoção. A outra cai no pátio de um presídio. Conseqüentemente o primeiro bebê vira o super-herói Metroman e o segundo o super-vilão Megamind (ou Megamente).
Herói e vilão se defrontam como manda o figurino até que Metroman bate as botas. Na verdade o herói saiu de cena cansado da guerra. Metrossexual ou simplesmente gay, prefere ficar em casa, trajando um pijama colorido, quem sabe recebendo os agrados de quem lhe atrai; Por outro lado, Megamente acaba sentindo-se só. E o pior: apaixona-se por uma jornalista e ela detesta a sua cara e a sua moral. Resultado: para não morrer de tédio cria um herói que substitua o inimigo aposentado. Escolhe o fotografo que sempre acompanha a jornalista e que de cara é um boboca. O resultado disso é que o medíocre com superpoderes que se transforma em destruidor da cidade.E o seu inventor, até por ter com quem brigar(ou brincar)passa a fazer tarefas de herói.Evidentemente a mocinha passa a gostar do que era bandido.
Com essa história o pessoal da Dream Works faz um cartoon diferente. Um dos mais engraçados dos últimos anos, e um dos mais afeitos ao principio de fabula que sempre norteou o gênero: a moral da história.
Segundo o filme, maniqueísmo é coisa dos Grimm ou de Perrault. Hoje o malvado pode ser melhor praça do que o bonzinho medíocre. Ou boboca. Para encerrar a festa há um arremedo do “Quem Quer ser um Milionário” de Danny Boye e todo mundo dança. Um show que se realiza não só à vista da garotada. Papais e mamães vão entrar no mesmo ritmo.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Bicho Papão

Vi em DVD um filme modesto chamado “O Segredo do Céu”(Night Sky). O roteiro aposta na confissão de abduzidos por seres extraterrenos feita à custa da hipnose. Nas telas grandes “Skyline” diz que ETs chegam à Terra botando pra quebrar. E a gente pergunta: será que seres de outros mundos a nos visitarem são sempre belicosos. Stephen Hawkins, o físico, imaginou o contato do 3° Grau como o dos colonizadores do passado com os índios. Pode ser. Na história de “Segredo do Céu” os feiosos (para os nossos olhos) ETs chegam a tirar um feto da barriga da mãe. Eles estariam estudando a nossa espécie. Seriam os novos “bichos papões” das lendas (inclusive amazônicas). Falar nisso, quem sabe se o Curupira não era (ou é) um alien? Bem, o certo é que o cinema maltrata demais essa turma: ET bonzinho só o de Spielberg. E Klatoo, o mais tragável, seria um mestre-escola a dizer do medo que a sua gente sente de viajarmos mundos afora ampliando a nossa violência. A história de “O Dia em que a Terra Parou” ganhou as telas em 1953 e está jovem ainda agora. Talvez porque além de boa idéia ganhou bom cinema. E é o que falta agora na moçada que grava luzes no céu. O terror é mais na sala de projeção do que no drama exibido. /

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Baixas

Foram-se Leslie Nielsen, Irvin Kershner e Mario Monicelli. O primeiro notabilizou-se como o palhaço de cabelos brancos. Fez rir quem se dispunha a isso na série “Corra que a Policia Vem Aí” e outras chanchadas como “2001, Um Maluco no Espaço”, desastrosa paródia do clássico de Kubrick & Clarke. Mas no seu começo de carreira Nielsen foi ator “sério”. Esteve bem no tribunal que cercou o suspense “Decisão Amarga”(Ramson) onde Glenn Ford pensava duas vezes antes de pagar o resgate por seu filho seqüestrado.E foi ao espaço namorando Anne Francis e enfrentando o monstro concebido pela mente de Walter Pidgeon em “O Planeta Proibido”(Forbidden Planet).
Irvin Kersher mostrou a que veio em pelo menos dois filmes: “Sublime Loucura”(A Fine Madness) e “O Amor é Tudo”(Loving). Mas ganhou fama dirigindo espetáculos como “Robocop” e “Star Wars,O Império Contra-Ataca”. Era um diretor acadêmico no melhor sentido. Sabia contar uma história com imagens e som.
Mas Monicelli abriu um vácuo maior. Com ele se fechou o livro dos grandes cineastas italianos. Resistia depois dos 90, entrando no time dos vovôs diretores, aquele em que o português Manoel de Oliveira atua como zagueiro. Iniciando em comédias com e sem Totó, muitas ao lado do amigo Steno, passou sozinho a botar sal na formula gaiata. Seus “Os Companheiro”(I Compagni), “Meus Caros Amigos”(Amicei Mei), “O Incrível Exército Brancaleone”(L’Armata Brancaleone) e “Parente é Serpente”(Parenti Serpeti) marcaram época. Ria-se e pensava-se. Foram obra densas e divertidas. Nesse patamar de jamais esquecer as agruras da vida em meio à comédia que repetiu Pedro Armendariz e se matou no hospital onde recebeu um mau diagnostico. Armendariz, ator do grupo de John Ford e a expressiva figura de “A Perola”(La Perola) de Emilio Fernandez, ao saber que estava com um câncer incurável, ainda no hospital, puxou da gaveta um revolver e atirou na cabeça; Monicelli preferiu se jogar pela janela. Pulou para a eternidade onde moram seus filmes, aqueles que ajudaram a fazer da Itália um grande centro de cinema.
Felizmente esses artistas deixaram peças para lhes garantir a imortalidade. Hoje basta rever seus trabalhos. E rir, e chorar, enfim sentir.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

A VEZ DOS VELHINHOS

“RED, Aposentados e Perigosos”(RED/EUA,2010) podia ser melhor. Reunir velhos personagens de filmes de ação numa história derivada de gibi seria divertido especialmente para quem acompanhou essa gente quando na ativa. Mas para isso o projeto precisaria de uma seleção correta. O filme de Robert Schwentke peca pela escolha capenga. OK Bruce Willis, que veio da série “Duro de Matar”(ou “duro de aturar”) . Mas tanto Morgan Freeman como John Malkovich, como Helen Mirren não se encaixam nisso. Freeman fez muito policial, mas sem usar os músculos (mesmo como adjunto de lutador em “Menina de Ouro”). Malkovich é um dos melhores atores do momento, injustiçado no Oscar desde “Um Lugar no Coração”(Place in the Heart/1984) passando por “Ligações Perigosas”(Dangerous Liasons/1988), quando figurou como coadjuvante.Freeman fez uma Rainha Elizabeth II de cara e porte em “A Rainha”(The Queen/2006) segurando a sua estatueta.E até os coadjuvantes com mais de 60, de Richard Dreyfuss, oscarizado em “A Garota do Adeus(The Goodbye Girl/1977) a Ernst Borgnine, hoje com 93, vencedor na Academia de Hollywood por “Marty”(1955) estão de fora da patota brigona.
Mas o filme escrito por John Hoeber e Erich Hoeber vindo de quadrinhos da DC Comics deriva bem para a comédia. Usa aquela arma que os Irmão Marx celebrizaram: o non sense. Por aí se vê uma bala entrar num projétil atirado de bazuca. E a velharada desviando-se de balas como se fosse alérgica a chumbo.
O filme foi feito para quem quer deixar de fora da sala de projeção os seus problemas existenciais. É o que diz vender: divertissement. E goza a finada guerra fria quando bota os russos ao lado dos americanos cool (legais) e como vilões pinta gente do governo dos EUA. Tudo bem que não é novidade. Mas dá para imaginar Helen Mirren dançando uma balalaica com Brian Cox. Só se lamenta “matarem”Morgan Freeman. E ninguém na tela chora por isso.
“Jackass 3D”(EUA,2010) é um glossário de pegadinhas cruentas. A turma guiada por Johnny Knowville apanha mais do que sovaco de aleijado. O grupo de amigos vive aprontando situações perigosas entre si.E usa o corpo de escudo. Maçã no rabo de um deles para um porco comer é uma das piadas. Soprar uma “língua de sogra” com um pum é outra. Há entre as mais escatológicas uma literal chuva de fezes acompanha de vômitos dos participantes. Aliás, o nojo é arma desse pessoal que inspirou ou foi inspirado pelos nossos meninos da TV-Pirata e TV-Pânico.
Quem for ver as peripécias dos meninos brincalhões precisa saber de que se trata. Eu nunca havia visto esse pessoal na TV (por onde andou anos a fio). Nem em tela grande por onde andaram já duas vezes (esta é a terceira). A nova gozação , em 3D, dá o “prazer” de ver cocô voar na direção da platéia. Um critico ortodoxo pode resumir que o filme todo é uma merda. Não é bem isso. É uma farra. O que eu não sei é se a turma que se exibe se diverte mais do que a gente que vê.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

DVD PARA NAO DORMIR

Três filmes em DVD mexeram com meu sono: “Perigo em Alto Mar”(The Reef), “Pânico na Neve”(Frozen) e “Altitude”. O primeiro, australiano, segue “Mar Aberto” mostrando jovens em férias náuticas que vêem seu barco afundar e pensam nas opções: ou nadar por quilômetros até chegar a uma ilha ou ficar no casco do barco, à deriva. Como o mar está cercado de tubarões a tragédia é inevitável. O caso é real. Espanta no cinema dirigido por Andrew Traucki. “Frozen” se assemelha. Três colegas, dois rapazes e uma moça, tentam chegar ao topo de uma montanha gelada, para esquiar, no fim de expediente do teleférico. Resultado: o funcionário do elevador deixa o posto, o substituto não chega, fecham motor e luzes e é um final de semana. Um dos rapazes pula do banco. Sofre fratura exposta e é comido por lobos. O outro consegue alcançar um poste, descer, e tentar esquiar montanha abaixo. Mas os lobos vão atrás dele. A garota, depois de mais de 24 horas dependurada, cai na neve e só não é devorada pelos animais porque eles estão comendo o amigo dela que não conseguiu alcançar a aldeia. Ela escapa. Caso também real. Filme canadense de Adam Green.Também do Canadá é “Altitude”, no caso amigos dentro de um bimotor doméstico, pilotado por uma colega,que sofre avarias em vôo e tende a cair. A direção cabe a Kaare Andrews. Não conheço nem ele nem os colegas dos outros filmes.Mas todos demonstram competência. E não gastam muito na produção.
Os 3 títulos mexem com os nervos. Só o último exibe absurdo e possui um elo forte de ficção. Mas o trio pode se filiar no gênero que se chama suspense.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

OS FILHOS DE PECKINPAH

Sam Peckinpah (1926-1984) foi um dos primeiros cineastas de Hollywood a esgotar o estoque de ketchup do estúdio. Não usava para temperar a bóia em seu trailer, mas para jogar no corpo de seus atores. Em “Meu Ódio Seria Tua Herança”(aquele “Wild Bunch” que um gaiato brasileiro achou por bem batizar com a pompa de uma ópera), por exemplo, ele fazia metralharem mexicanos e no revide cair balas nos gringos valientes (Bill Holden, Bob Ryan e tantos mais).No seu “Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia” ele mandava bala, de novo (pois estava no “Meu Ódio...”) o grande cineasta Emílio Fernandez. Pois agora, anos depois de Sam estar na cova, reina a dupla Roberto Rodriguez & Quentin Tarantino. De Rodriguez é este “Machete” que está chegando às telonas. A cara feia (e bota feia nisso) de Danny Trejo é o tipo que se vinga de senhores que faturam com imigrantes ilegais para os EUA. Tem tiroteio para nenhum filme de guerra com os de Raoul Walsh botar defeito. E o rapaz não pega uma só bala. No lugar de cavalo, como nos velhos faroestes, usa um calhambeque que parece rodar até sem gasolina.
Claro que há mocinha. Mas quem pede uma cena de amor de Trejo? É pior do que o Jean Marais de Fera beijando Josette Day de Bela.
Quando chegar aqui “Machete” vai ganhar putos elogios dos fãs da dupla que hoje brinca de realismo cinematográfico.
E como anda ralo o panorama de bons programas, a alternativa é a comédia romântica que agora usa criança sem os cahinhos de Shirley Temple ou a cara de funeral de Claude Jerman Jr. Um desses fedelhos salvou “Coincidências do Amor”.
De minha parte, saúdo o DVD meu de cada dia. Ai do meu cardápio cinemático sem ele!

domingo, 31 de outubro de 2010

Infelicidade sim

Arnaldo Jabor é mais conhecido pelos jovens como cronista de ironia mordaz, uma espécie de prosseguidor do estilo de seu falecido colega Paulo Francis. Mas ele fez parte do movimento “cinema novo”,a "escola" que revelou os talentos de Glauber Rocha, Leon Hirszman, Joaquim Pedro de Andrade, Cacá Diegues e outros que surgiram no inicio dos anos 60, muitos ligados a antiga UNE, estudantes combatentes ao regime instalado no país pelos militares.
No passado Jabor fez 9 trabalhos em cinema, entre produções curtas e longas. Gostava de títulos que fossem facilmente memorizáveis como “O Casamento”, “Toda Nudez Será Castigada”,“Tudo Bem”, “Eu Te Amo” e “Eu Sei que Vou Te Amar”. Desde 1990, quando dirigiu o curta-metragem “Carnaval”, passou a se dedicar inteiramente ao jornalismo. Este ano resolveu voltar às origens. E com o mesmo padrão de nomes & temas: “A Suprema Felicidade”. Quis ele realizar o seu “amarcord”, analogia com o clássico de Fellini. Seria uma lembrança, ou melhor, um álbum de lembranças, de seu tempo de juventude. Um roteiro (dele) que se iniciava no final da 2ª.Guerra Mundial (1945), caminhando pelas diversas mudanças político-sociais , sempre na ótica de um personagem, no caso uma criança no começo da historia, depois um adolescente que vai descobrindo o meio em que vive, a estrutura familiar e o seu próprio corpo.
O filme, agora lançado nacionalmente, revela-se uma decepção. Não pelo desvio artístico do autor, que na verdade nunca foi muito bom a não ser em “Tudo Bem”(1978) onde se via um casal de velhos em um apartamento rodeado de fantasmas amigos. Mas pelo desencontro das idéias, a desconexão do tempo e espaço a partir de uma porfia contra a linearidade do cinema tradicional, o embaralhamento dos fatos históricos, a desconexão com o próprio tipo principal. Basta dizer que a trama é centrada no garoto Paulo, e encerra no avô dele, Noel (Marco Nanini, o melhor em cena). Ainda mais que em tom apoteótico, seguindo um esquema teatral que parte das falas e segue pelo enquadramento onde se vê, por exemplo, tipos de corpo inteiro numa sala discutindo sem que a câmera se mova.
A progressão etária de Paulo segue a explicitude erótica exposta nos outros trabalhos do cineasta. O que se privilegia é o sexo. Não interessa o que o menino estuda, o que pretende fazer quando deixar a escola, como ganha o seu sustento(já que o que pai, aviador frustrado, é de classe média baixa e a mãe não trabalha), e o que pensa dos familiares mais próximos. Resta em um olhar (mesmo assim mal definido) para todas as situações dramáticas, com mais evidencia no papel do avô boêmio, exímio trompetista, ainda músico de bares .
Se a narrativa abdica de ser em primeira pessoa, o que é mostrado, entre reconstituição de épocas e pedaços de cine-documentário, é de uma gratuidade incômoda. Não há um encaixo histórico perfeito. As cenas são alegóricas, mas os planos de guerra, por exemplo, não refletem o que alguém esteja sentindo. É uma pontuação desigual, como um “tapa-buraco”.
Até os intervalos musicais são anacrônicos, como alguma musica estrangeira fora da época fixada (e nem se fala nos números nacionais). Aliás, se o filme fosse um musical teria mais liberdade e talvez acabasse menos ruim. Como está é falso e monótono. Além disso, guiado por um baixo erotismo a lembrar as pornochanchadas dos anos 60/70, com tudo de mau gosto que se exigia no tempo em que a meta era driblar a censura ditatorial.
Se as memórias de Jabor forem essas, faltou a participação da razão. Seria o quadro de um inconsciente freudiano ou de uma falsa interpretação de que o publico de cinema aposta no que seja “proibitivo”.
Concluí que foi uma suprema infelicidade o retorno do cineasta. E a suprema, pelo menos no meu caso, foi ver o filme terminar.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Pequenos Grandes Atores

Vi na TV paga o filme chinês “Pequenas Flores Vermelhas”(Kan Shang qu hen mei/2006). O melhor de minha semana (e olhem que eu vejo a média e 2 DVDs por dia).
O diretor Yuan Zhang ousa denunciar a educação despótica da China revolucionaria (o tempo de Mao). Um menino de 4 anos (Dong Bowen)é levado pelo pai para um internato onde as professoras o engajam no jardim da infância. Lá se tem hora para tudo: comer, defecar, dormir, as mais elementares necessidades. O menino mostra que não é de se deixar dobrar. Resiste aos mandos das tirânicas mestras. Uma delas chama de monstro e chega a convencer colegas a atacá-la no dormitório. No fim de uma temporada de castigos, o maior deles é não ganhar as pequenas flores vermelhas que se dá como prêmio ao bom comportamento diário, o menino foge. A última imagem é dele deitado na rua. Cruel como certas verdades.
Impressiona o domínio dos desempenhos infantis. Eu já dirigi criança e sei como isto é difícil. Deve-se alcançar um grau de intimidade com o menor para que ele pense que o trabalho adiante das câmeras é brincadeira. E controlar muitas crianças é um desafio. Todas (e são mais de 50) convencem no que lhes pedem para fazer. Uma menininha dedo-duro “é um prodígio. A graça infantil serve de contraponto ao terror do mando. Basta um close do menino triste por não ganhar a sua flor, ou quando diz que “não consegue fazer cocô”, para se reter o filme na memória.
Yuan Zhang fez co-produção com os italianos. Não deve ser persona-grata em seu país. “Pequenas Flores Vermelhas” é uma ode à liberdade e a criança representa em tese isso mesmo, a liberdade exposta de modo franco.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Melhor que o Primeiro

“Tropa de Elite 2”(Brasil,2010) consegue um fato raro: é melhor do que o primeiro filme com este nome. E não só porque todos os elementos de realização mostram-se afinados, da direção de José Padilha, passando pelo roteiro enxuto de Bráulio Mantovani, pela edição sufocante de Daniel Rezende, pela fotografia de Lula Carvalho, pelo elenco irrepreensível. O filme é maior porque vai além da formula “policia-versus-bandido”. Denunciando a corrupção na área policial, mostrando até mesmo a venda de armas para os traficantes nos morros cariocas, o roteiro vai fundo na área política e mostra o hoje coronel Nascimento(no outro filme era capitão), soltando cachorros na Assembléia Legislativa (“muitos dos deputados que estão aqui deviam estar na cadeia”), indo à uma CPI gritar contra a politicalha, enfim, tentar impor a lei e a ordem e ao mesmo tempo limpar seu nome de medidas constrangedoras que lhe macularam a farda como a invasão no presídio Bangu I logo no inicio do filme.

Desta vez Padilha apostou no realismo. A gente pensa que está vendo uma reportagem sobre a guerra nas favelas. Tudo funciona nas cenas de ação. E dizem mais do que as imagens mostram. Para cada movimento há uma falcatrua, uma reação a desejos feridos.

O filme termina com um plano aéreo de Brasília. Como diz Nascimento (Wagner Moura excelente até na maquilagem que o envelhece),”a merda cai no ventilador”. E fiquei pensando na estréia em tempo de eleição. Claro que Padilha e Mantovani não mostram siglas. Dizem que há coisas que precisam ser consertadas. E urgente.

Um belo filme. Merece a afluência de publico que está obtendo.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O Que Vier Funcion

Woody Allen volta à sua New York depois de um giro inglês (“Match Point”,”O Grande Furo”) e espanhol(“Vicky Cristina Barcelona”). E volta para dizer que não mudou. Se o seu novo filme (perdão,já tem outro pronto e mais outros no ovo) que aqui se chama “Tudo Pode Dar Certo” afirma, no original, que “O Que Vier Funciona”(Whatever Works). Não é conformismo: é descrença. Debaixo de uma ironia que deriva dos Marx Brothers usa de porta-voz, ou alter-ego, um cientista chamado Boris (Larry David), que é divorciado porque não mais aturou a mulher carola e chegou a tentar o suicídio ganhando com isso um andar manco, assemelhando-se “in totum”ao dr.Gregory House de Hugh Laurie na TV (é o caso de dizer que a cara de um é o focinho do outro).
Boris tenta levar a vida cantando todo dia, ao lavar as mãos, “Parabéns a Você”. O destinatário é ele mesmo. Cético em tudo, fala para quem acha que está lhe vendo (nós, espectadores), afirmando o que Allen sempre afirmou, da descrença em qualquer religião, da pouca ou nenhuma confiança no ser humano, do absoluto desprezo a sentimentos que vão do amor ao próprio trabalho. Só é frágil diante da doença (afinal um paradoxo para quem não dá valor à vida) e chega a correr de noite para um hospital quando pensa que a picada de mosquito é um melanoma.
A união de Boris com a jovem Melody (Evan Rachel Wood, ótima descoberta),resulta primeiro na capacidade de dar à ela o chamado “efeito mimético”. A moça que fugira de casa e estava morando na rua passa a repetir os resmungos do seu anfitrião, não importa se nada conheça de Física (ela cita a “Teoria das Cordas” porque ouviu Boris falar disso) e confunda próton com “chato”. O resultado é que acaba em casamento tão improvável como a própria capacidade do marido acatar qualquer relacionamento estável.
Mas se a união dura um ano e vê-se Boris dizendo para a tela que “não foi o pior ano de sua vida” acaba desmoronando quando entra em cena, ou melhor, no pequeno apartamento do casal, a mãe de Melody (Patricia Clarkson). Ela cai bem na ária de Il Rigoletto”(“volúvel como pluma ao vento). Logo está praticando “ménage a troi” e arranjando um novo marido para a filha. Como se não bastasse, chega também o pai de Mellody(Ed Begley Jr). E se ele começa demonstrando a sua educação austera e cristã não demora a se revelar um “gay”.
Tentando outra vez o suicídio(a meta é se atirar da janela), Boris agora cai sobre uma vidente a quem leva para um hospital e com quem vai se unir. Numa festa de ano novo à guisa de encerramento do filme, ele solta os velhos cachorros: detesta o tipo de festa pois lembra que “cada vez mais se chega à sepultura”. Mas considera que tudo o que cai (ele caiu para uma nova fase da vida) pode dar certo. Woody Allen caiu pelos encantos da enteada Soo Lyin e parece ter gostado. Chegar ao âmago do pessimismo e nele encontrar um balsamo é como ver uma flor na lama. Mas é assim que o cineasta comediante de 74 anos (beira os 75) trabalha. Faz cinema de idéia fixa, alertando que o que vale é viver a vida enquanto se vive. E não importa se o método de viver é o do solitário de “Sonhos de um Sedutor”(Play it Again, Sam), sua peça teatral que Herbert Ross dirigiu no cinema, ou o noivo de Annie Hall,ou o hipocondríaco de “Anna e Suas Irmãs” ou até mesmo o mágico que morre porque reclama a mão de direção dos ingleses em “O Grande Furo”.
“Tudo Pode Dar Certo” é bem um filme de Woody Allen. Pode ser radical, daí a piada no fim quando Boris diz que “ficou pouca gente vendo”. Mas é a cara dele. E hoje, no mundo do cinema, poucos realizadores são tão pessoais.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Ride Pagliacci

Longe da opera de Leoncavallo a gente, no cinema, ria de tantos traídos pela sorte(não apenas pela mulher) e/ou vingadores anônimos da sociedade. Os grandes palhaços estão morrendo. Afora Chaplin, que deixou este mundo em 1977 e já não mais fazia rir como no tempo em que as “fitas” eram mudas, os seus comparsas de diversos países desapareceram além das câmeras.
Quando eu via nos cinemas mais filmes do que os dias do ano (hoje nem que eu quisesse não podia arriscar tanto), os EUA tinham, por exemplo, Danny Kaye (o melhor showman que eu conheci). Eu não cito atores versáteis como Jack Lemmon, bons em comédias como em tragédias (“Se Meu Apartamento Falasse...” é a tragédia social do meio urbano). Os franceses tinham Fernandel, o “cara de cavalo”(fantástico em “O Carneiro de 5 Patas”). Os italianos iam à luta com Totó, o mestre feio, e Walter Chiari. Os ingleses, que tinham fama de não rir, botavam nas telas Norman Wisdom. Esses palhaços sucederam os heróis da comédia visual, o cinema em estado de graça que a partir de Chaplin e antes da extraordinária anarquia dos Irmãos Marx atacavam de Harold Lloyd, Buster Keaton, até mesmo Laurell & Hardy (e uma vez ou outra os imitadores Abott & Costello). Ah sim: tinha Jerry Lewis. Este ainda vive. Mas é um fantasma de corpo presente.
Norman Wisdom morreu este mês (outubro). Tinha 95 anos. Sua formula de fazer rir era ditada por uma expressão facial econômica. Mas o resto do corpo se mexia. E a cara de pedra, “a la Keaton”, ajudava. Chegou a fazer um filme americano: “Quando o Strip Tease Começou”(The Night They Raided Minky’s/1972) de William Friedkin. Basta este exemplo de filme A para qualificar Norman como o desajeitado que dava tombos homéricos, lembrava o tipo que Donald O’Connor tão bem encarnou em “Cantando na Chuva”.
Aqui em Belém passavam lotes de filmes baratos com Norman Wisdom, distribuídos por J. Arthur Rank (primeiro vinham através da Universal, depois pela própria firma britânica). Eu não os perdia. Ria o bastante para suportar o pior da rotina de estudante (especialmente quando fiz o curso de medicina).
Hoje os ingleses apostam em Rowan Atkinson. É outra norma. O ator é expressivo, mas o tipo que ele criou é de cartoon. Se as gags são bem escritas ele funciona. Mas se é cercado de boa produção não possui a ingenuidade do seu velho colega (ou mestre, fica melhor). Por sinal que Atkinson está deixando de ser Mr. Bean, o tipo que lhe deu fama. Sente que cansou. Não sei quem ficará no trono dos galhofeiros. Se não aparecer substituto nós, cinemeiros,estamos fadados a achar graça, apenas,do que se diz sério, dessas aventuras histórico-mitológicas de grande orçamento, onde a piada é justamente a falta de piada. Ou o ridículo em overdose.

domingo, 26 de setembro de 2010

TERMOMETRO DA AMBIÇÃO

“Wall Street, O Dinheiro Nunca Dorme”(Wall Street Money Never Sleeps/EUA,2010)é a continuação de um filme de 1987 em que se discutia o papel dos homens de negócios numa grande economia. Na verdade os filmes repousam na porfia engendrada pela ambição. “Quanto mais se tem mais se quer” é a formula. E numa só palavra: ganância. É o que diz o anti-herói Gordon Gekko (Michael Douglas), preso por 5 anos a partir do primeiro enfoque, que, ao sair da cadeia, no início da primeira seqüência da nova produção ora em cartaz, é um zero no mercado de ações, ganhando o portão do presídio sem que apareça uma só alma para buscá-lo.
Gekko é odiado pela única filha, Winnie(Carey Mulligan) desde que morreu o irmão dela vitimado pelo uso de drogas (a mãe deixou o lar depois disso). Não há um imediato reencontro com o pai. Surge para fazer a aproximação dos dois o jovem Jacob Moore(Shia LeBeouf), corretor de bolsa criado para isso por um mentor veterano,Louis Zabel(Frank Langhella). Ele é o noivo de Winnie. Mas o aprendizado desse moço é torpedeado pelo suicídio de Zabel, ocasionado pelas tramóias de Bretton Jones(Josh Brolin) um especulador que não hesita em prejudicar quem esteja na mira de seus negócios.É fatal o encontro do rapaz com o futuro sogro –e a “contaminação” pela ânsia de poder, fazendo jus a uma frase de Gekko:”O dinheiro não é tudo:importante é o tempo”.
Se você tirar alguma “lição” do roteiro escrito pelo próprio diretor, Oliver Stone(um cineasta controvertido, homem de esquerda que ultimamente está exagerando ao apoiar o venezuelano Hugo Chavez), é de que a anatomia da ambição leva à uma doença incurável. Ou melhor: para se tentar curar é preciso abdicar, ou melhor, perder alguma coisa em troca. Mesmo assim, no final só é púnico radicalmente Bretton Jones. O trambiqueiro Gekko, que rouba até a própria filha (e ela dá o troco), não parece “pobre” ao reaparecer diante dela pedindo que se não o perdoar pelo menos o ature. E o argumento é dinheiro em sua conta. Dinheiro que ele botou num banco suíço enquanto estava preso. Que dizer: o ladrão esperto rouba até quando está atrás das grades...
Mas o interessante de “Wall Street, O Dinheiro não Dorme” é um resumo da etiologia da recente crise econômica que partiu dos EUA em 2008. A mãe de Bretton Jones(Susan Saradon ) seve de exemplo. Ela compra e vende casas sem caixa para tanto. Compra devendo, vende o que não é seu. Resultado: a conta acaba nas instituições financeiras e estas, de tanto reembolsar títulos, acaba falindo. Entra o governo para o sistema capitalista prosseguir (sem essa ajuda os bancos quebram). E começa a bolha, um termo para a evasão que escorre pelo mundo afora.
O problema econômico aconteceu (e ainda tem resquícios). Nós, brasileiros, não sofremos tanto por estarmos bem embasados. O nosso país é até citado no filme como uma boa fonte de aplicação. Mas o mundo capitalista estremeceu. O tipo interpretado pelo veteraníssimo Eli Wallach (95 anos a completar no próximo dezembro) lembra o que aconteceu em 1929 (o grande “crack” que dilui fortunas e só acabou com a chegada da 2ª.Guerra Mundial em 1939 quando começou a produção bélica). Felizmente as coisas não chegaram a tanto, mas o filme de Oliver Stone faz um raio-x do sistema financeiro das grandes potencias, do fascínio do dinheiro que apesar de ser qualificado como “nem tudo”,na realidade, como diz o titulo do filme, “não dorme”.
É um filme bem feito sobre ambiciosos. O diretor faz contraponto aqui e ali com crianças brincando de bolhas de sabão. As bolhas voam, encontram-se em fusão aumentando de diâmetro, mas espocam. O problema é que outras nascem. As crianças só param de brincar quando cansam. Quem não é mais criança e brinca com a fortuna material não cansa nunca. Morre pela brincadeira.

Outro filme em cartaz, “Salomon Kane, O Caçador de Demonios”(Salomon Kane/Inglaterra,2009). O roteiro vêm dos quadrinhos de Robert E, Howard e trata de um guerreiro inglês do século XVI que depois de muitas aventuras sangrentas quer redimir seus pecados morando num mosteiro e tatuando uma cruz nas costas. Mas o superior do mosteiro é franco com ele: “- Você tem de enfrentar a sua vida se quer mudar. Procure fazer o bem nos seus domínios”. Ele tenta, ajudando uma família de agricultores. Mas os agentes do mal o perseguem, e ele pensa que o diabo cobra a sua alma. Vai à luta e pelo amor de um a menina da família que o abriga é redimido.
A trama é colocada de forma esquemática, demasiadamente ingênua. Mas o aspecto plástico do filme é interessante, da fotografia aos efeitos especiais. Ponto positivo é, também, a dedicação do ator James Purefoy (da telesérie “Roma”) como o Salomon do titulo. Contudo, o tema poderia render bastante e é esvaziado na porfia por um espetáculo da linha “blockbuster”(cinema para dar dinheiro e nada mais). A redenção pela fé é diminuída num ato de ação física, como se tudo tivesse de ser conseguido pela força. Uma pena.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Romance Gay

Um ator de verdade assume qualquer personagem, que lhe dão para viver em teatro ou cinema. Hoje nem tanto, mas imagino como há 20 ou 30 anos um ator heterossexual faria força para encarnar um homo adiante de câmeras. Ainda mais pelo fato de que, nessa época, o preconceito era grande. Tão grande que atores homos eram pintados de hetero pelos estúdios. Célebres casos são os de Rock Hudson, que chegou a casar por conta da Universal Pictures sendo sempre namorado de rapazes (morreu em conseqüência da AIDS), o de Cary Grant que escondia sua vida privada das colunistas fofoqueiras, e o de Vincent Price, característico em filmes de terror ocultando seus casos com o mesmo sexo, ele que era o intelectual exigente na moldagem de um estereotipo, e muitos “bi” . Chegou a ser feito um documentário sobre os gays do cinema, exibido por aqui no finado Cinema 1.
“O Golpista do Ano”(I Love You Phillipe Morris/EUA,2009), em cartaz nos cinemas locais depois de ter sido lançado em DVD, é o caso típico da liberdade de expressão atual e da capacidade de atores reconhecidamente heteros. Trata de um caso real, o de um advogado trambiqueiro que depois de viver anos como marido exemplar, pai de duas filhas, sofre um acidente e desperta de um estado de coma assumindo a qualidade de homo. Ele começa a fazer falcatruas, é preso, e na cadeia se apaixona por um detento ligado a furtos. Daí em diante o sujeito vive para o amante, aprimorando-se nos trambiques e com isso ganhando status de milionário.
Jim Carrey e Ewan McGregor fazem os namorados. Jim ganhou fama de careteiro em comédias medíocres, mas se firmou como interprete de coisas mais sérias como “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembrança” e “O Show de Truman”. Ewan eu vi no mesmo dia em que revi “O Golpista...;” fazendo um garanhão que se mete numa agencia de garotas de programa através de um golpista que se diz amigo. O filme, “A Lista”(Deception/EUA,2009), não chegou aos cinemas locais. Eles se beijam ardorosamente em diversos planos do filme dirigido pela dupla John Requa e Glenn Ficarra. Muita coragem recompensada com o fracasso de bilheteria da produção. E não vamos longe: Billy Zane, intérprete de “O Fantasma”(Phantom), versão da HQ de Lee Falk, disse na TV que era gay e o filme desabou. Tinha de tudo para começar uma franquia com o herói das selvas. O próprio Zane não conseguiu mais papel estelar.
Mas o sacrifício de Carrey e McGregor também não compensou esteticamente. O filme tem um roteiro demasiadamente esquemático não sei até quando extraído de um livro escrito por Steve McVicker (este roteiro foi escrito pelos diretores). Não se constrói bem as personagens nem se dá às seqüencias de “vigarices”o tom de humor e o “timing” que existiu, por exemplo, no “Prenda-me se for Capaz”(Cath me if you can) de Steven Spielberg(biografia de um tipo semelhante ao vivido por Carrey). Chega ficar monótono o vai-e-vem do advogado preso com seu colega e bem amado, como tampouco se torna convincente o final, com o tipo se fazendo de aidético e fugindo da cadeia por isso.
Há muitos filmes de bom nível que chegam ao DVD sem passar pelas nossas telas. Elas, em Belém, apegam-se aos blockbusters para faturar. E assim mantêm seu comércio. A variedade seria um desafio e os donos do negocio não se sentem aptos a desafiar com um alto custo operacional. O caso de “O Golpista do Ano”seria uma aposta na popularidade de Carrey e na “graça” de gays carinhosos, ainda um desafio para muita gente puritana.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

TARANTINAGENS

“À Prova de Morte”(Death Proof/EUA,2007) seria o duplo de “Planeta Terror” chamado no conjunto de “Grandhouse”. Tanto um (o filme de Roberto Rodriguez que mostrava uma mulher perneta a botar uma prótese de metralhadora) como outro,a idéia é de divertir como os filmes B do tempo dos seriados de aventuras com a diferença de que agora a violência pausteriazada de antes ganha a amostragem visceral, o derrame de ketchup, de desastres digitais e de nudez feminina até que se possa fazer diferença das fitas “hardcore” donas do incômodo X de “rating” que reduz a capacidade de bilheteria.
Na métrica do diretor, mesmo numa cópia divorciada de sua companhia, com acréscimo de planos, cabe um longo papo de mulheres sobre o nada e coisa nenhuma. Também cabe o contraste rítmico que é uma perseguição de carros a la “Operação França” que dura na tela aproximadamente 20 minutos.
Contem o tempo gasto do papo à corrida. Dá mais da metade de uma projeção em que a única fonte a seguir como cinema é a desobediência a velhos cânones e ao sempre modo de se falar de filmes, de alertar ao publico que a cinematografia não é só composta de obras ligadas a escolas ou tendências e tampouco devaneios de cineastas laureados.
Tarantino é uma espécie de cicerone dos exemplares baratos que passaram anos como anônimos, repousados na forma dada pelos diretores-funcionários, gente que filmava o que se mandava filmar e procurava se eximir de desvios artesanais para uma área mais cabeça de criação artística.
O problema é que este hino ao lixo nem sempre deixa de cheirar mal. A mim enjoa. Vi este “Death Proof” em DVD e não me estimulo a revê-lo em tela grande. Não tenho mais saco para sair de casa e presenciar mumunhas de rebeldes sem causa. E não é de agora: nunca fui de prestigiar os tarantinos da vida. Voto no cinema tradicional e bem feito, no que fez a glória de Hollywood e de Cinecittá, estúdios parisienses (antes da “nouvelle vague”) , Svenfilme, Toho, o mais que tenha trabalhado para aguçar a imaginação de quem vê. Mesmo porque vejo a simples exibição de violência como uma adesão nazista. Violência em cinema ganha mais campo quando sugerida, da mesma forma que o sexo.
Para os novos eu devo ser uma peça de museu. Mas sempre fui sincero em meus comentários e os norteio pela minha sensibilidade. O cinema de Tarantino, com raras exceções (como na comédia “Bastardos Inglórios”) não é minha praia.

domingo, 5 de setembro de 2010

Neste Mundo e no Outro

Peço emprestado para a coluna de hoje o titulo do filme de Michael Powell e Emeric Pressburger que no original se chamou “A Matter of Life and Death”(Um Caso de Vida ou de Morte”), ou, nos EUA, “Stairway from Heaven”(Escada do Céu). É o que posso usar como referencia a “Nosso Lar”(Brasil,2010) uma das estréias da semana nas salas de cinema comercial. Neste filme dirigido por Wagner Assis de um livro escrito por Chico Xavier,está a concepção da vida após a morte segundo os que professam a doutrina espírita.Impossível desligar as imagens do que escreveu entre 1304-1321 o poeta italiano Dante Alighieri em “A Divina Comédia” (o nome original foi “Commedia” ficando o “Divina” por conta de Boccaccio em alusão ao aspecto metafísico). Só que os tercetos(a série de versos) que definem Inferno, Purgatório e Paraíso, etapas que o poeta percorreu atrás de sua querida Beatrice, não ganham, no caso, uma linguagem cinematográfica acima do elementar. Aliás não há Inferno na concepção de “Nosso Lar”. Um quadro semelhante ao Purgatório é mostrado da mesma forma que se viu no filme “Amor Além da Vida”(What Dreams May Come/1998) de Vicent Ward de uma história de Richard Matheson (autor consagrado em ficção - cientifica):almas penam em um mar de lodo, pedindo ajuda a quem passa (como Dante ao navegar no barco de Caronte).O Paraíso é que apresenta diferenças. Mas o que interessa na analise do filme brasileiro em cartaz é o aproveitamento da idéia (argumento) em linguagem cinematográfica. Deixa a desejar não só a direção de arte, que impregna uma arquitetura “futurista” (até com o uso de laptops e ônibus voadores) a lembrar parte do que fazia o inglês William Cameron Menzies em “Daqui a Cem Anos”(Things to Come),como a pressa com que Wagner Assis trabalha as seqüências (a exemplo da visão da família de Andre Luis, coincidentemente reunida quando vista por seu espírito) e principalmente na estrutura das personagens, todas muito esquemáticas, dizendo e fazendo o que se pede no enquadramento (nenhuma chance de estudo dos tipos).
Mas o filme certamente foi feito para um determinado publico e este publico bateu palmas no final da sessão em que eu estive. Volto a frisar que meu comentário não é de critica à concepção religiosa ou filosófica do original. Trato de cinema. E penso que “Nosso Lar”poderia agradar a não-espiritas como agradou “Neste Mundo e no Outro”(não “Amor Além da Vida” que só valeu pelo “décor”, a lembrar várias escolas de pintura). Ali, os autores privilegiavam a sátira sem desrespeitar credos. Tarefa difícil, mas cumprida. O filme, para quem quer saber, foi feito em 1946 e exibido pela ultima vez, no Brasil,em um canal de TV paga há cinco anos. Foi remasterizado por Martin Scorsese e pode chegar um dia ao DVD nacional.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

O SENHOR NINGUÉM

Acho Jacon Van Dormael o cineasta mais criativo desses últimos anos. Já tinha na minha cabeceira seus filmes “O Homem de 2 Vias”(Toto Le Hero) e “O Oitavo Dia”(L’Huitiéme Jour). Agora coloco também “Sr. Ninguém”(Mr. Nobody), obra-prima que os nossos distribuidores ainda não adquiriram para exibir nos cinemas brasileiros.
O argumento parte de um homem centenário que fala a seu médico e a um jornalista. Sua fama não é só de ser um centenário. Em 2089 ele é o último mortal na Terra. Nesse tempo que para nós é futuro, descobriu-se um meio de preservar as células, evitando o envelhecimento, e as pessoas estão curiosas em saber como é que se....morria.

Nemo, ou como ele se diz, Nobody(Ninguém) tem falhas de memória e o seu relato é fragmentado. Nisso entra a Teoria das Cordas e a faculdade da opção. Se o universo que conhecemos é um dentre vários em dimensões diversas, as vidas podem ser paralelas. Uma realidade segue outra. E jogando para um prisma filosófico, a pessoa tem de optar pelo destino que lhe oferecem. No caso de Nemo, em criança ele é convidado a ficar com o pai ou com a mãe que se separam. Mostra-se o então menino correndo atrás de um trem que leva sua mãe. Trilhos de ferrovia servem em várias seqüências como ramais a seguir. Se ele for viver com a mãe as coisas acontecem como se vê na maior parte do filme. Se com o pai, um ligeiro interregno dá a idéia de outro comportamento. Da mesma forma vê-se 3 meninas colegas de infância. Ele cumprimenta uma a uma. Todas poderão ser suas mulheres. Mas a quem realmente ele ama ? A que o despreza por outro, a que é filha do segundo marido da mãe ou uma asiática que ele lembra salvando-o de afogamento numa piscina?

Os detalhes são tantos que não se esgotam numa visão do filme. Mas o que importa é a chave temática. O longevo pode ser feliz se amou e foi amado. Longe disso é um “ninguém”que a morte esqueceu.
Gente, o filme é extraordinário. A riqueza do tema salta na correspondência de estilo. Tudo é motivo não só de visão como de admiração. Dormael é belga, tem 53 anos, e consegue fazer uma produção cara e criativa. Muitos esbarram nas dific

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Roubando Sonhos

Desde que Freud escreveu sobre os sonhos começaram divagações em torno de como a mente humana se porta quando a pessoa dorme. Shakespeare divagava em “Hamlet”: “morrer, dormir, talvez sonhar”.E no cinema os sonhos abriram portas para o surrealismo, como em “Quando Fala o Coração”(Spellbund) de Hitchcock, ou em tantos outros exemplos onde o ato de sonhar rima com o fato de ter medo ou o de bem sentir certas fantasias.
“A Origem”(Incepction/EUA,2010) de Christopher Nolan ambiciona uma invasão do sonho de alguém por deliberada atitude de outrem. Mais explicitamente: um ladrão, Crobb (Leonardo di Caprio), rouba idéias de pessoas que as moldam quando dormem. E com esta facilidade ele chega ao ponto de tentar inserir uma idéia nova na cabeça de um rico herdeiro com o objetivo de seu patrocinador auferir lucro com esta operação. O problema, no caso, é que ele, o ladrão de sonhos, tem seus próprios devaneios e ultimamente esses devaneios partem do suicídio da esposa, atormentada depois dele inserir sugestões na vida dela através dos sonhos, como se tentasse manipulá-la a seu gosto. Com isso, a imagem da morta persegue as suas operações e chega até mesmo ser a vilã da história.
O filme é o primeiro com roteiro dom próprio diretor, conhecido por dois títulos ligados de alguma forma ao tema (“Amnésia” e “Insônia”) e um vislumbrando o intimo de um herói (“Batman, O Cavaleiro das Trevas”). Não é nada fácil simplificar idéias que mexem com a transitoriedade das próprias idéias. Alguém fala durante a narrativa que “não é fácil interagir no sonho alheio”. Portanto, a pretensão de “A Origem” esbarra no seu trajeto. O próprio Freud não foi muito explicito ao analisar a sua mais famosa paciente (ou ele próprio numa auto-análise). Afinal, como se dimensionar o que surge dos neurônios ou o que venha a ser guiado por uma força maior (e o cristão diria, a vontade divina)?
O filme é muito inteligente, mas surge complexo quando opta pela noção de videogame, querendo dizer que nos sonhos as pessoas extrapolam uma violência intrínseca, o falado “tigre adormecido”da psicanálise. E esta complexidade não é de todo resolvida. Dificilmente uma platéia sai da sala de projeção “entendendo tudo o que viu”. E isso não quer dizer simplesmente hermetismo. É mais insuficiência de dados, uma hesitação entre o fantástico e o clinico banhada em espetáculo de ação.
“Origem”é novidade em parte.A sua lição vem de Pascal, ou seja, “O coração tem razões que a própria razão desconhece”. No caso do herói-vilão com taquicardia.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Patricia Neal

Patricia Neal morreu aos 88 anos em Massachutts. Fez 68 filmes entre 1949 e 2009. Ganhou um Oscar em 1963 com “O Indomado”(Hud) de Martin Ritt. Viveu dramas angustiantes fora da tela, perdendo dois filhos e sofrendo um AVC que lhe deixou em coma por alguns dias miraculosamente não a deixando com seqüelas.
Eu guardei, com certo carinho, a imagem que deixou no filme “O Dia em que a Terra Parou”(The Day the Earth Stood Still) de 1951 dirigido por Robert Wise. Era ela quem via, apavorada, dentro do disco voador, o ET Klatoo(Michael Rennie) anunciar um discurso que no cinema só teve dois concorrentes gravados na mente dos fãs: o de Chaplin em “O Grande Ditador” e o de Charles Laughton em “Esta Terra é Minha” de Jean Renoir. A diferença básica é que a fala de Klatoo era um “sermão” aos malcriados seres humanos que se digladiam na Terra. Marco não só na ficção - cientifica.
Patricia também ficou nos papéis ganhos em “Um Rosto na Multidão”(A Face in the Crowd), um filme pouco comentado mas um dos melhores de Elia Kazan, e em “3 Segredos”(Three Secrets) também de Wise. Claro que eu coloco estes filmes pela lembrança que deles guardo. Gostava de ver a mulher madura de voz rouca, nada a ver com imagens de “vamps” como as que revistas do tipo Cinelândia usavam em capas. Era a fama pelo talento. E na sua filmografia ficou muita B - Picture, muito que os grandes estúdios não se lançavam a proclamar com gastos em publicidade. Assim ela viu Klatoo no “dia em que a Terra parou”. E eu aos 15 anos maravilhei-me com o que vi numa noite da Festa de Nazaré no finado cinema Iracema. Cheguei a perdoa o cochilo de edição (e Bob Wise era um excelente editor, tendo montado o “Cidadão Kane” de Orson Welles) na seqüência em que, dentro da nave, Patrícia se mexe em planos alternados quando deveria ficar estática observando o visitante do espaço.
As estrelas do tempo em que eu ia muito a cinema (hoje o cinema vem a mim através do DVD) estão se apagando. É a marca do tempo. Mas é justamente o cinema que se rebela contra esta inexorabilidade. As imagens das atrizes estão sempre jovens no que se projeta ou se aciona digitalmente. O tempo não apaga como diz o titulo nacional de um melodrama dos anos 50. Patrícia como tantas colegas estão à disposição de minha memória, checada em cada olhar a um filme gravado.
Frederic March como a Morte em “Uma Sombra que Passa”(Death Takes a Holiday) diz, a propósito de uma roda de fumantes, que os mortais a adoram. Ele não diz que é no cinema que reside esta adoração. O meio de ludibriar a ceifeira.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Melodrama

Venho de um tempo em que o melodrama era tão popular como os vampiros MELODRAMA OU O DRAMA AÇUCARADO
estudantes de hoje. Lembro de que exibi no Colégio Sana Rosa, só para ver a namorada, que era estudante-interna, a cópia em 16mm de “Amanhã Será Tarde Demais”(Domani e troppo tardi) de Leonide Mogui. Foi mancada, pois o filme pregava a liberdade de alunas oprimidas em colégio religioso. Mas tudo bem: havia o respaldo de um prêmio em Veneza e a presença de Vittorio De Sica(como ator), querido de irmandades religiosas por seu “A Porta do Céu”(La Porta Del Cielo).
No fim da sessão Orlando Costa, pioneiro do cineclubismo no Pará e meu convidado para fazer um debate depois da exibição, perguntou às colegiais qual seu filme predileto no período (1957). Todas: “Sublime Obsessão”. E o ator adorado era Rock Hudson. Impossível dialogar afirmando que Hudson nunca tinha sido ator e que “Sublime...”, por sinal uma refilmagem, eras melodrama da pior espécie.
Mas naquele tempo havia certa franqueza diante da empatia com histórias românticas contadas em cinema de forma linear. Douglas Sirk era um mago. Hoje ganhou o cetro oficialmente (conterrâneos dele, como Fassbinder, alertaram que o cineasta sabia contar suas histórias).Claro que ao eleger Rock Hudson as meninas não sabiam que o galã era homossexual. Contou-me Gilda Medeiros que chegou a tentar visitá-lo num hotel do Rio, junto com Ilka Soares.O cara estava de roupão, deixando que se visse ao fundo um parceiro. Desculpou-se afirmando que “tinha compromisso”.
Mas o que importa é o melodrama. Nunca fui de condenar o gênero radicalmente. Detestava os filmes mexicanos, derivados de boleros, mas aplaudia coisas como “Stella Dallas” de King Vidor ou “Ainda Há Sol em Minha Vida”(The Blue Veil)de Curtis Bernhardt. E isso me leva a Jane Wyman, atriz de “Sublime Obsessão” de Sirk e também de “Blue Veil”, ela que está chegando em DVD na praça com outro melo de Sirk : “Tudo o que o Céu Permite”(All THat Heaven Allows) –e com Hudson.
A atriz, oscarizada por “Belinda”(1949), ganhou Globo de Ouro por “Ainda há sol...”. Foi mulher de Ronald Reagan e chegou a dizer que purgou pecados por isso. Ela era uma espécie de trailler de Meryl Streep. Chorava bem em close. Fez, por isso, poucas comédias (como“Órfãos da Tempestade/Here Comes the Groom, de Capra em 1951). Mas quase sempre convencia. Já idosa ganhou Hudson de namorado por interesse comercial do produtor Ross Hunter (da Universal).
Em DVD eu vi esta semana dois melodramas. “O Medo Devora a Alma”(exibido no Cine Clube APCC com o nome de “Todos o Chamavam Ali”) de Fassbinder, e “Cárcere de Mulheres”de Miguel M. Delgado. Exemplos da diversidade de tratamento do gênero. Com Fassbinder a relação de uma alemã quase sexagenária com um marroquino jovem ,passa bem. O confronto cultural testa o amor. Mas com Delgado o germe da mediocridade que imperava nos filmes-boleros vê-se a olho nu. Sara Montiel ainda não havia casado com o diretor Anthony Mann nem feito “La Vilolera”. Ainda hoje canta. E canta bem. MiCroslava morreu cedo(suicidou-se aos 30 anos). Elas fazem as prisioneiras irmanadas numa tragédia. Choras-se,mas de raiva. Não falta quem diga “ter quiero com toda mi alma”. E um detalhe:não tem bolero. O tipo de filme vingou com “Pecadora”(1948), veiculo para AugustinLara lançar o seu “Maria Bonita”(dedicado a Maria Felix, sua paixão). Houve altos e baixos em mais de 20 anos. Mais baixos. Hoje se vê numa cultura. Sensibilidade deve pedir penico para História.
E é isso. O DVD ensina cinema.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Teatro Filmado

Dois filmes saídos de peças de teatro chegam ao DVD para testar a memóriade quem já os conhecia: “Sua Esposa e o Mundo”(State of Union/1948) de Frank Capra e “A Rosa Tatuada”(The Rose Tatoo/1955)de Daniel Mann.
“Sua Esposa...” foi mal recebido na estréia e não mudou de cotação com os anos. A dupla Spencer Tracy & Katherine Hepburn, namorados perenes à frente e atrás das câmeras, serviam ao diretor das gostosas comédias sociais para uma intriga resolvida em gabinetes de políticos onde um candidato em potencial do Partido Republicano testaria a sua capacidade de ser infiel à mulher e fiel às ambições inconfessadas na aceitação (ou não) da concorrência. No caso ele enfrentaria a amante (Angela Lansbury) mostrada nas primeiras cenas como a herdeira de uma velha raposa do partido, e o aparente bem estar no leito com a esposa (Katherine). Claro que no final ele faria um discurso providencial moralizando o entrecho. Vendo a esposa ameaçar sair do cenário, ele mesmo sai, alegando em bom tom que preferia a modéstia de cidadão comum a um cargo cercado de oportunistas.
Obviamente o roteiro não mostra que é só papo furado. Mas o filme acredita que o que se vê(e ouve) é o certo.Acaba com a dupla de tantas comédias de outros diretores, como George Cukor, trocando beijos e sorrisos. Angela fica num plano intermediário mordendo os beiços. Aliás, no filme não há um único fotograma dela beijando Tracy. Em 1948 vigorava o Código Hays, a censura dos estúdios, e Capra só criticaria isso no trabalho seguinte, o apagado e possivelmente(resta rever)mais divertido “Nada Além de um Desejo”(Riding High/1950).
O roteiro de Anthony Veiller e Myles Connoly é servil ao texto original de Howard Lindsay e Russel Crouse, Falas, falas, falas e pouco interesse ao espectador de longe do espaço físico e do tempo da ação.
O filme levou à falência a empresa que Capra criou quando veio da guerra(a 2ª.Mundial), a Liberty. Bem verdade, até “A Felicidade Não se Compra”(It’s a Wonderful Life) seu melhor titulo, não foi bem de bilheteria.
“A Rosa Tatuada” (The Rose Tatoo) tem roteiro do autor do original de teatro, o afamado Tennessee Williams. O diretor Daniel Mann era pródigo em transplantar peças para telas como “A Cruz de Minha Vida” e “A Casa de Chá do Luar de Agosto”. Neste que foi o seu terceiro trabalho atrás das câmeras ele contou com Anna Magnani solta, fazendo um tipo que imortalizou na sua terra, o da italiana “brava de guerra”. Ela é a viúva assediada por Burt Lancaster afinado num papel diferente do que fazia como motivo de demontrar seu talento acrobático. Desta vez as imagens não se prendem a 4 paredes. Há cenas exteriores, há muito movimento de objetiva, há um senso de cinema. Espanta porque todo o pessoal de apoio é de teatro, ao contrário de Capra e sua equipe em “Sua Esposa e o Mundo”. O que eu acho é que Capra quis voltar à formula do seu “Do Mundo Nada se Leva” ou mesmo de “Arsênico e Alfazema”(Este Mundo é um Hospício). Filmou teatro porque achou que assim encontrava a comédia que deixou antes de ir fazer documentários de guerra. Errou feio.
Os filmes são, de todas as formas, peças históricas. Estão em DVD com boas resoluções de imagens. Quem estuda historia do cinema deve conhecê-los.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Muito Barulho Por Nada

Os produtores de Hollywood pensam que os espectadores confundem cinema com videogame. Pior: jogo sem vitórias ou derrotas. Simplesmente o vicio de jogar. Não é de outra forma que se analisa este “Dupla Explosiva” (Knight and Day/EUA,2010) a ser lançado nos cinemas na primeira semana de agosto.
Tom Cruise e Cameron Diaz fazem e acontecem em duas horas de efeitos especiais. Uma linha de ação, entre as tarefas de CGI, que mostra Cruise como um agente federal perseguido. Todo mundo está contra ele. E todo mundo está em toda parte. O encontro com Diaz num aeroporto deixa pensar que ela também é uma agente e os dois são rivais. Engano: não se conheciam. E logo no avião, enquanto ela se embeleza no banheiro, ele mata uns seis passageiros que desejam o seu pescoço. No bolo estão o piloto e o co-piloto. Cruise não se afoba e nem pede que ela fique nervosa. Toma o manche do Boeing e aterrissa numa estrada espantando caminhões. Ele sai com ela e o avião pega fogo, Mas logo dá na TV que o aparelho caiu e que todos os passageiros morreram. Incrível como se acha a noticia escondida. Mais incrível o que passa a acontecer, com a dupla sendo perseguida por lugares turísticos diversos, acabando na Espanha e enfrentando a corrida de touros, tudo para revelar que ele guarda uma “bateria” cobiçada pelos colegas, que este objeto pode ser (ou se transformar em) uma bomba, que apesar de ganhar um ferimento na batalha acaba devidamente “sarado” e ao lado da companheira.
O roteiro é um insulto à inteligência do espectador. Mas seria o caso de dizer que o que interessa é a surrealista corrida com percalços sem se dar conta de onde, para onde, qual o motivo e como deve acabar (se é que acaba). Resumindo: uma demonstração de atividade ininterrupta no plano surrealista.
Mas há uma pergunta que não quer calar: seria preciso botar atores tão populares num filme de ação do tipo “Summer blockbuster”. Cadê a chance para o charme da dupla que se diz gaiatamente (em português) explosiva e, no original, faz-se ironia de “cavaleiro”(knight) com “noite” (night) da canção de Cole Porter (Night and Day)?
Os jovens aplaudem esse tipo de besteirol. Se não aplaudissem Cruise e Diaz não acompanhariam o lançamento da coisa vindo até mesmo ao Brasil. Por sinal que ele já fez “Missão Impossível 4” a ser lançado no final do ano. Quer dizer: o ator (que na verdade nunca foi ator) pensa cinema como brincadeira barulhenta. Talvez tenha razão porque quando evoca coisa mais séria, como “Operação Valquiria”, dá em merda.
Suportemos esses megalançamentos se quisermos sair de casa no rumo de um cinema. Um detalhe: parece que “Dupla Explosiva” não está editado em 3D. Ainda bem: poderia explodir na cara do coitado que pagou mais caro para se divertir.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Entre Ogros e Vampiros




Depois de quase 60 anos Belém volta a ver filmes em 3D nos cinemas. Isto quer dizer que uma das muitas garotas que suspiram pelo namorado vampiro pode esperar roendo as unhas que Robert Pattinson, o ator da série “Crepúsculo”, saia da tela e vá sentar ao lado, ou, quem sabe, sair para um programa como aquele tipo que Woody Allen apresentou em “A Rosa Púrpura do Cairo”.
O filme que reapresenta o 3D ao nosso público chama-se “Shrek Para Sempre”, a quarta exposição do ogro simpático que na primeira vez ia para a privada com livros de Grimm ou Perrault para usar como papel higiênico. Os piratas de plantão de há muito vendem o filme em seu modesto 2D. Na história, o herói entra numa crise de identidade e urra pela sua espécie de ogro macho. Bolas para Fiona, a esposa, para os 3 filhos, para a vida burguesa que lhe deram. Faz um contrato maroto com um vigarista e pela liberdade dá a ele um dia de sua vida. O sujeito escolhe a data de nascimento do ogro. Vale dizer que ele não nasceu. E se não nasceu, não tem mulher, filhos, preocupações domésticas, enfim, o que desejava, naquele momento, não ter. Mas com um detalhe: se terminar o dia e ele não conseguir receber um beijo de amor como personagem de conto de fada padrão, simplesmente morre. E o jeito é perseguir Fiona, que não sabe quem diabos ele é, pensando no beijo que mesmo que lhe dê reprise da rotina é a salvação da espécie.
Os autores do roteiro até que deram tratos à bola. Claro que eles não saem para uma partida com os colegas da PIXAR, empresa que em termos de animação está levando crianças e adultos às gargalhadas e às lagrimas (a boa formula chapliniana de fazer cinema). Mas foi um avanço. E este avanço dispensa o relevo das imagens. Em qualquer das formas de projeção o desenho é divertido. Se vai ganhar mais um episódio só a bilheteria pode dizer. E pelo que eu pesquisei deve ir. Shrek não é príncipe encantado, mas até por isso ganha pontos no mundo de hoje, quando a beleza física está em escanteio. Isto lembra os vampiros e lobisomens de “Eclipse”, o apêndice de “Crepúsculo” que está levando as meninas ao delírio. Hoje um filhote de Dracula e um parente de cachorro são mais queridos do que os bonecos do passado, do Valentino que as bisavós amavam por conta da vaselina nos cabelos, as vovós aplaudiam com a cara de pau de Rock Hudson, e as mamães adoravam bastando o galã ser cabeludo migrado de Woostock e tocar guitarra. Como critico de cinema dou os parabéns às gurias. O vampiro e o lobisomem ganham de sola os canastrões do tempo em que se amarrava cachorro com lingüiça. E como eu nunca fui fã de rock (nem do Hudson nem do ritmo), prefiro mesmo a graça do ogro, aquilo que os nórdicos vêem como “bicho papão”, respeitando, é claro, o papão do futebol paraense.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Money Money





Cada vez que eu vejo um desses replays camuflados made in USA lembro do Joel Grey cantando no Cabaret de Bob Fosse: “money money money....”
A diferença capital do cinema-industria para o resto de cinema é que a industria quer dinheiro (se não que diabos de industria é essa?). O demais é diletantismo, ou se queira ver por amor à arte. Ou à mania.
“Shrek Para Sempre” é um exemplo cristalino a ser cantado por Grey. Agarrando o sucesso das animações com o ogro simpático e a garota que só se tornou simpática ficando feia, os produtores resolveram esticar o que já estava no limite do esticado e botaram a mocinha prisioneira de um vilão mignon e o herói condenado a lhe dar um beijo de amor como qualquer príncipe desencantado de histórias infantis (aquelas que no primeiro filme ele devorava na privada limpando o rabo com os livros de Grimm & Perrault & Andersen & Cia).
São mais de hora e meia sem assunto. Melhor(ou pior); uma colagem de contos d”antanho com a diferença de que as brancas como a neve surgem verdes como a cara de pau dos roteiristas.
OK a garotada dos EUA engoliu. Ainda mais pelo filme, como o grosso da produção ambiciosa de hoje, foi feito para ser exibido em 3D. Penso que é uma forma de encantar as mocinhas que hoje deliram com namorados vampiros ou lobos. Será a glorificação do feio, uma pena a surgir quando Belmondo é aposentado, Palance é morto e Charles Laughton, mesmo que vivo fosse, abdicaria posto que sempre jogou sexo com o seu gênero.
Salve, portanto, a PIXAR que com o seu Toy Story 3 mostra que se pode comercializar cinema sem perder a qualidade. Basta ter inteligência. Ou não ter pressa.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Entrou Areia

Vendo “O Príncipe da Pérsia: Areias do Tempo” penso no meu tempo de garoto quando pegava a poltrona (de madeira, sem estofo) da 4ª. Fila do cinema Olímpia para ver Maria Montez , Jon Hall, Sabu e às vezes Turhan Bey fantasiados de árabes nas “fitas” ingênuas da Universal, seguidoras do que os Korda (Zoltan e Alexander)produziram para Michael Powell dirigir (“O Ladrão de Bagdá”).Engraçado é que eu, moleque, não gostava desses filmes. Ia por força de hábito. E endossava o que o único critico da cidade escrevia na “Folha do Norte”(“Montez, Hall e Sabu....Deus os fez e o diabo os juntou”). Maldade. Sabu esteve em Belém e mostrou ser gente boa. Maria morreu afogada numa banheira quando já morava em Paris com o marido Jean Pierre Aumont. Jon Hall fez “O Furacão” de John Ford e gostei do que vi. Turhan Bey é que tinha cara de boboca, uma luva para o tipo de filme que fazia.
A idéia de Jerry Bruckheimer, depois do sucesso de “Piratas do Caribe”, foi seguir a trilha dos filmes das vesperais (no sudeste se chamava “matinê”) de um tempo em que ele próprio era um recentemente desmamado. A Disney, pensando em nova franquia como no caso dos piratas caribenhos (salvos por Johnny Depp), topou a produção. E botou Mike Newell (“4 Casamentos e 1 Funeral”)para dirigir. A orientação era de que fosse o mais retrô possível, embora a garotada de hoje exija mais ritmo, mais trabalho dos editores. E um detalhe: o roteiro saiu de um videogame.
A história? Cabia numa noite da odalisca. Mocinho adotado pela nobreza persa gama pela princesa de um reino conquistado e com ela descobre o fascínio de uma máquina do tempo movida a areia. A coisa funciona assim: se a mocinha, por exemplo, morre, o mocinho volta no relógio e ela reaparece vivíssima. Também se mata vilão desse jeito.E vilão com a cara de Bem Kingsley nem precisa pintar na testa que é vilão.
O filme hiperativo é um salto de vara no vazio cinematográfico. Mas a garotada deste século pode gostar. Afinal, essa turma não viu o que a Universal andou fazendo quando seus avós eram guris.
Para não pensar em cinema é um programa receitável. Quem procura “mise-en-scene”(ainda há quem use este nome) pule fora. Tudo é administrado como um produto industrial. Newell mereceu o cachê. E Gemma Arterton não envergonha a memória de Montez, a Maria Bonita que concorria com aquela amada de Augustin Lara e estrela de filmes de Emilio Fernandez. Aliás, Jake Gyllenhaal é melhor do que Jon Hall. Apesar de ser um game em que não se joga, o resultado pode servir de adubo para uma série. Adubo orgânico.(Pedro Veriano)

terça-feira, 25 de maio de 2010

Deuses e Monstros

O titulo da matéria é de um belo filme sobre James Whale, aquele cineasta que fez a melhor versão, até hoje, do “Frankenstein”de Mary Shelley. Mas Whale não é o meu foque agora. Trato dos mitos gregos, da raça do Olimpo, comandada por Zeus.
Em criança eu li “Os 12 Trabalhos de Hercules” do Monteiro Lobato e o que sobre a mitologia greco-romana se escreveu na coleção “Tesouros da Juventude”. Depois fui adiante até porque minha paixão por astronomia levou a querer saber de quem emprestou nome aos astros. De Io, por exemplo, eu só conhecia o satélite de Júpiter. Vim, a saber, de seu papel até na mãozinha que deu a Perseu. E esta mãozinha está no filme “Fúria de Titãs”, da Warner, que François Leterrier assinou (o filme e o cheque recebido da produtora).
Quem fica sabendo no tempo de colégio dos deuses e heróis imaginados pelos gregos e depois servidos com nomes trocados aos dominadores romanos, vai achar mil e um defeitos nos filmes que lhes pedem ajuda. Neste blockbuster, que eu chamo normalmente de bloquebosta, falta tanta coisa que nem Atlas carregaria nas costas. Mas o pouco que existe, em ritmo de videogame sem interatividade (o que é muito chato), dá para incentivar os moleques a lerem sobre o assunto.]
Perseu ficou no nosso imaginário como o homem que matou a Medusa. Ela, uma das três górgonas, tinha cabelos de cobra e petrificava quem a olhasse de frente. Imaginem se a moça fosse a um salão de beleza! Pois o herói, filho de Zeus com uma mortal, aventurou-se a fazer-lhe um penteado . Pegou de um escudo que espelhava, presente de Atena que o filme esconde, e consegue com isso passar a espada no gogó da monstra levando a cabeça para lhe ajudar na libertação de Argos e de sua amada Andrômeda.
Os efeitos especiais fazem a festa. Hoje cinema comercial é feito por computador. E como o trabalho é de máquina, o resultado é, via de regra, impessoal, mecânico, sem alma. Agora, com a praga da 3D, mais um recurso para enfrentar o cinema em casa, mais e mais se moldam criaturas monstruosas para assustar quem assim deseja.
A mitologia grega é tão rica que abriu um ninho para o pouso de diversas ciências, desde a de amigo, ou filosofia, à medicina de Freud e mesmo de anatomistas. Isto sem falar na Física e na Astronomia. O mundo vive aprendendo com os deuses do Olimpo. Nesse monte advindo do imaginário antigo estão as paixões que os seres humanos experimentam desde que acionaram os neurônios além dos bíceps. E é só procurar para achar valores diversos ainda hoje saudados. Por causa, o cinema muito deve ao tema. E não vai pagar só com os megaespetaculos tridimensionais. A coisa é séria e pede recíproca. (PV)

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Robin Hood Perdeu a Inocência

Yes, já não se faz Robin Hood como antigamente. No meu tempo de garoto, vi na matinal domingueira do Olímpia aquele Robin Flynn, ou melhor Robin Errol Flynn, vestindo calça colante verde, blusa de carnavalesco, chapeuzinho de vinco dianteiro com uma pena do lado direito, atirando um animal de caça na mesa do rei João. Nessa mesma fita (e muita gente chamava filme de fita), o Frei Tucker dava barrigadas nos soldados inimigos (ou seja,gente do rei), e a mocinha Merian estava guardada, sacrossantamente, numa torre do castelo, esperando o amado como uma Branca de Neve sem espelho mágico, maçã envenenada ou sete anões fazendo a corte. Aliás, maçã era o que mordia o arqueiro verde (uai, não é o mesmo nome do herói dos gibis?) como um bom filho de Adão. Mais tarde no tempo, e eu já adulto, via Robin Hood velho, num Sean Connery maquilado para não lembrar James Bond, atirando um flechar para marcar a sua sepultura e deixando-se cair nos braços da querida Merian, agora Audrey Hepburn (antes era Olívia de Havilland), já distante da “bonequinha de luxo”.
Hoje Russel Crowe é um herói de porrada. Propaga a pinta do brutamontes. E não é só João o rei malvado. O próprio Ricardo, o Coração de Leão que Robin cultuava, dizia ser um monstrengo que mandou matar civis muçulmanos durante uma Cruzada (e isso nas barbas do amigo Robin). Quer dizer, o reino encantado de Sherwood virou zona. Todo mundo mata e esfola, e até o romance do herói é um beijinho e tchau tchau.
Com produção além dos 100 milhões de dólares, Ridley Scott conta a seu jeito, ou melhor, do jeito de seu “Gladiador” (até nas locações), a lenda inglesa que as crianças de longe aprenderam seja pelos papos com os mais velhos, seja pelos livros bem ilustrados, ou pelos filmes bem produzidos.
Um cenário realista numa mentira que servia os espectadores como um presente de fada, é de dar saudades do Pinóquio. Nada a ver com Collodi, mas com o sabor da inverdade. As lendas jamais deviam ser maculadas com uma pretensão realista. Contar lenda não é fincar o pé no chão até enterrá-lo. É voar além do insensato mundo como um bruxo pré Herry Potter.
“Robin Hood 2010” não me balançou.Na verdade, me encheu.

terça-feira, 11 de maio de 2010

SESSÕES ESPECIAIS

Sou do tempo da Sessão Passatempo, um programa que Adalberto Affonso bolou para as tardes de sábado no Olímpia com filmes de curta metragem e uma série (2 episódios) de um seriado de aventuras. Era a hora dos alunos de diversos colégios da cidade se encontrarem. E as atrações especiais ficavam com a entrada do Garcia (Agenor Garcia), um tipo que se deixava carregar para o interior do cinema, no apagar das luzes, acenando como um político em véspera de eleição. Aliás, o Garcia acabou se candidatando a vereador. Perdeu. Ele era melhor como maluco. Que digam os gêmeos José e Alexandre Farah, recepcionistas do tipo-assim como de outros que faziam do Olímpia a sua catedral, como o Affonso Alves “herdeiro do rei da voz”.
Além da Sessão Passatempo tinha, nos anos 50, a Sessão Última Chance nos dias úteis, com filmes que já tinham corrido o circuito comercial e muitas vezes só nessa hora eram descobertos(o caso do “Romeu e Julieta” de Renato Castellani e de “O Semeador de Felicidade” com Liberace, sucessos tardios). E finalmente o “Cinema de Arte”, programa de sábado pela manhã com um filme bem cabeça.
Hoje a moda voltou em DVD. No mesmo Olímpia criou-se sessões dominicais com os nomes Cinemateca, Fantasia. Nostalgia e Aventura. Uma para cada domingo do mês. Tenho um dedo nisso, e o Marco Moreira tem a mão. No menu estão filmes que de alguma forma atraíram públicos. Este mês, por exemplo, tem “O Pequeno Polegar” de George Pal com Russ Tamblyn, sucesso do finado Cine Palácio, “Um Lugar ao Sol”,o tipo do filme que enlevava os românticos e os críticos, com aquela celebre seqüência do beijo entre Monty Clift e Liz Taylor, um baile de montagem que fazia a gente pensar que o rapaz era mesmo um garanhão (e na verdade era gay). E finalmente, na Sessão Cinemateca, uma homenagem ao diretor japonês Akira Kurosawa, no ano de seu centenário, que na ocasião se despedida das câmeras: “Madadayo”(quer dizer: “ainda não”).
Com o cinema virado loja de shopping e os melhores filmes transformados em programas da TV caseira, esses espaços fatalmente nostálgicos são extremamente eficazes. Cinema é esse xodó que o tempo eterniza. A mim é uma fonte de lembranças agradáveis. Um capitulo a mais numa história de horas que a gente passa numa sala escura vendo imagens de pessoas que só existem ali, na tela, posto que os físicos já serviram de adubo a qualquer arbusto de cemitério.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

30 ANOS SEM HITCHCOCK

Poucos diretores de cinema ganharam marquises e até por isso tiveram seus nomes guardados pelo público brasileiro. Apesar de não ser um nome tão fácil de pronunciar como Steven Spielberg ou John Ford ou mesmo Frank Capra, Alfred Hitchcock foi um deles (ou É um deles). A fase americana do cineasta o promoveu a líder de audiência. E ligou seu nome a um gênero: o suspense. Quem não ficou tentando adivinhar quem era realmente Rebecca, a mulher que Daphne du Maurier inventou e no cinema dessas bandas ganhou um subtítulo que quase conta a história: “A Mulher Inesquecível”?. E quem não se perguntou se as SUSPEITAS seriam confirmadas e Cary Grant era mesmo um assassino que tentava matar a esposa Joan Fontaine ? Daí para uma série de indagações e “torcidas”: o assassino Raymond Burr mataria a namorada (Grace Kelly) do fotografo bisbilhoteiro que o espiava por uma “JANELA INDISCRETA?” Como o tenista (Farley Granger) se livraria do maluco (Robert Walker) que lhe pedira uma troca de crimes (ou um “PACTO SINISTRO”) ? A bela esposa do magnata(Kim Novak) que se atirara do alto de uma capela seria a mesma mulher por quem um detetive(James Stewart) chegado a vertigens por alturas se apaixonaria? Seria ela “O CORPO QUE CAIu”? E mais atrás no tempo, o que aconteceu realmente com a senhora idosa que viajava num trem e sumira misteriosamente (“A DAMA OCULTA”)?
Hitchcock não só atiçava o seu público como aparecia em seus filmes como que assinando o trabalho. Penso que só não o fez em “Rebecca”(1940)“Suspeita”(1941) e na fase inglesa. Chegou a deixar sua silhueta num cemitério em “Trama Macabra” como que premeditando o seu fim.
O gordo diretor que o mundo aprendeu a admirar. O esteta que conseguia um numero recorde de cortes numa seqüência filmando a morte de uma jovem no banheiro de um motel(“Psicose”), morreu no dia 29 de abril de 1980. Dia do aniversário do amigo cinéfilo e fã dele Alexandrino Moreira, e também da Cláudia Álvares, filha que não só gosta como faz cinema.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Um Festival de História

O cinema Olympia (agora de novo com o “y” perdido nos anos 40) comemora os seus 98 anos com um programa que tenta lembrar as 10 décadas que já viveu. As datas correspondem às exibições, daí se ter representando os anos 1930 um filme de 1928 e os 1940 um filme de 1938.
Engraçado que uma jornalista ao me perguntar sobre a importância dessa mostra deu a entender que me julgava um espectador de todos os períodos. Teria, sei lá, 90 e tantos anos. Quem me dera chegar a isso, mas o que não vi acompanhei por comentários de quem viu. Morei cercado de espectadores, de gente que ia a cinema até em sessão de tarde da noite(e numa época em que ladrão era de coradouro e assassino era trevo de quatro folhas). Esse pessoal conversava muito sobre o que via e eu, garoto, escutava. No papo saiam impressões pretéritas, com minha madrinha falando dos primeiros filmes falados, minha mãe contando como era o Olympia na fase do cinema mudo, enfim, cobrindo todo o percurso das exibições, antes acompanhadas por “orchestras” debaixo da tela (e uma na sala de espera), depois com o muito de canto e dança, contidos nas operetas ou nos musicais da Metro.
“O Lírio Partido”(Broken Blosson) é de 1918 e passou no Olympia em 1919. Lllian Gish, que filmou até a década de 70, faz a jovem amada de um chinês. Foi, pode-se dizer, a desculpa de Griffith, o célebre diretor, à sua investida no preconceito étnico que exibiu em “Nascimento de uma Nação” (Birth of a Nation/1914).
“Ben Hur” de Fred Niblo (1925) marcou época. Meu tio Oswaldo (Vavá) dizia-se, por causa desse filme, fã de Ramon Novarro, o ator. Machista inveterado não sabia que Novarro era gay. Se soubesse não escreveria no verso de uma foto: “Não é Ramon Novarro,é o Direito(como ele era conhecido)”.
“Alvorada do Amor”(The Love Parade) tem história por trás dos projetores. Foi o primeiro filme falado exibido bem Belém. Precisamente no dia 30 de novembro de 1930. A técnica iría para o Cine Moderno, em Nazaré, mas a revolução acontecida no momento fez com que a sessão fosse interrompida. Meus pais iam, mas foram avisados antes do que possivelmente iría acontecer. Escaparam por um fio.
O filme é do gênero opereta, um dos que mais atraía público no velho Olympia. Jeanette MacDonald era a soprano mais querida. O par dela, dos anos 30/40, era o barítono Nelson Eddy. Neste filme de 1928 que Ernst Lubitsch dirigiu, quem pontilhava era Maurice Chavalier, o “chansonnier” como chamavam. Ele cantou e encantou três gerações (até “Gigi” em 1958). Só pegou mal na época da França ocupada, quando chegou a cantar para os nazistas. Os resistentes não o perdoaram de imediato. O perdão viria em 1951 com “O Rei” (Le Roi), comédia com boa dose de erotismo onde lançava números marcantes como “La Cachucha” e a canção (linda) “C’Est Finit”. Foi um sucesso no meu Cine Bandeirante em cópia 16mm.
“As Aventuras de Robin Hood”(Adventures of Robin Hood) foi “a cara” das matinais domingueiras, sessão em que a garotada respondia presente em peso. E também das vesperais, todas superlotadas. Errol Flynn era o ídolo das multidões, sucedendo a Douglas Fairbanks, o astro-atleta da fase muda. Olívia de Havilland (ainda viva) seria a sua companheira não só como Lady Marian, o xodó de Robin, como também como a namoradinha de Capitão Blood e de outros heróis de capa-e-espada, que Flynn encarnou para alegrar a juventude pré-televisão.
“A Princesa e o Plebeu”(Roman Holiday) trouxe Audrey Hepburn, a “funny face” ou “bonequinha de luxo”. O tipo de beleza especial, angelical, nada comparado às “vamps”. Ela estrearia ganhando Oscar nesta comédia de William Wyler onde, como parte de realeza, namorava o repórter Gregory Peck. Atraiu muita gente.
“Hannah e Suas Irmãs”(Hannah and Her Sisters) é concessão a Woody Allen. Com o jazz descritivo trata de tudo o que lhe deu direito: da neurose do tipo que Allen interpreta aos romances contrariados. Mia Farrow era a personagem corneada. Sintomático em se tratando do ator-diretor. Michael Caine fazia o galã que pulava a cerca com a cunhada. E a dupla de coroas Maureen O’Sullivan e Lloyd Nolan faziam os pais das jovens focalizadas. Maurren, ex-Jane dos filmes de Tarzan, era na verdade mãe de Mia. Genial o fim, com Allen vendo os Irmãos Marx na tela e aprendendo que é bom viver.
“Um Estranho no Ninho”(A Fidler on the Cuckoo’s Nest) deu Oscar a Milos Forma (diretor)., Jack Nicholson (ator) e Louise Fletcher (atriz coadjuvante). Nicholson é internado num hospício e ajuda os doentes, embora acabe sacrificado ao tentar provar que é apenas “diferente”. O ator faria mais doidos em cinema, sendo o mais votado o de “O Iluminado”de Stanley Kubrick.
“O Sexto Sentido”(The Sixty Sens) revelou o diretor M. Night Shyamalan. Um garoto fala com os mortos e por isso é alvo de um psicólogo. Sucesso enorme de uma platéia que adora temas espiritualistas. Sucesso que se repetiu na década seguinte com “Os Outros”(The Others) do chileno Alejandro Amenábar, o filme que encerra o programa representando os últimos anos do cinema como sala comercial. Depois de 2006 ele seria adotado pela Prefeitura de Belém como Espaço Municipal Olympia. E assim prepara-se para o centenário daqui a dois anos.
Os filmes das décadas atiçam memórias e por isso trazem histórias por trás das histórias que contam. (Pedro Veriano)

sábado, 3 de abril de 2010

O Agente do Além

Francisco Candido Xavier (1910-2002) dizia que só iría desencarnar quando o povo brasileiro estivesse imensamente feliz. Um amigo dizia que nesse caso ele iría “ficar para semente”. Morreu no dia em que o selecionado do futebol brasileiro sagrou-se hexacampeão do mundo.
O mineiro virou um ícone do espiritismo. Criança, via a mãe que já tinha morrido e recebia conselhos dela. A forma de lidar com a madrasta que entre muitas maldades chegou a mandá-lo lamber uma ferida.
De Pedro Leopoldo a Uberaba, Chico, como ficou conhecido, foi o meio de muita gente se comunicar com o além túmulo.Conheci uma senhora, viúva de um médico que foi meu professor, e que visitou Chico e dele recebeu uma carta psicografada do espírito do marido. Chamava as pessoas pelos apelidos. Muitas a senhora, que viveu muitos anos com ele, não se lembrava. E tem muitos outros casos. Diziam, os céticos, que funcionários do médium entrevistavam as pessoas antes da consulta e sabiam de muitas particularidades enfim dissertadas pelas almas em comunicação. Mas com quem eu falei jura que não soltou “dicas” para ninguém; Seria telecinesia ? Transmissão de pensamento? Mas o nervosismo de quem estava na sala esperando as mensagens ocultava qualquer lance de memória.
O caso Chico é um prodígio que alguns vêem como fantasia, outros como realmente um dom de conversar com quem viveu na Terra. E ressalte-se: na última vida. O espiritismo crê na reencarnação e conheci colegas médicos que faziam e fazem regressão sem hipnose capaz do paciente relatar experiências de uma vida anterior.
Mas o que interessa agora é o filme “Chico Xavier” em cartaz nacional. Dirigido e produzido por Daniel Filho com base na mais conhecida biografia de Chico, a escrita pelo jornalista Marcel Souto Maior, é um “tour de force” para sintetizar um mundo de informações. Por isso tenta se eximir de muitas responsabilidades numa frase de abertura: “É impossível contar a história da vida de um homem em duas horas”.Resta sintetizar. E nesta síntese muita força se esvai. Alguns momentos são citados sem definição(o caso de uma reportagem feita por um jornalista do The New York Times). Outros ganham apenas citação, com uma brevidade que dilui a força emotiva dos personagens no momento. E não se define, por exemplo, a identidade de Emmanuel, o guia espiritual, e tampouco os empregos de Chico ao longo dos anos (apenas se vê ele datilografando mas não se diz onde ou o quê),e o modo como conseguiu adquirir as casas onde atendia os clientes(não recebia um centavo dos livros que psicografava,doando o dinheiro das vendas para instituições de caridade). Também não se toca na vida sexual do personagem, restando o episódio (muito interessante) das prostitutas que acabam rezando quando uma delas é selecionada para iniciar o adolescente levado por uma pessoa da família a um bordel.
O filme ganhou muito com os atores de forte semelhança física com o biografado. Mas em nenhum momento é eclético. Apesar de Daniel Filho e Nelson Xavier (que faz Chico nos últimos anos) dizerem-se ateus, o conteúdo é de homenagem, não de discussão cientifica ou histórica Quer dizer: foi feito para os espíritas, e no conhecimento de que o Brasil é o país com o maior numero de crentes na religião&ciência&filosofia (a definição de espiritismo é complexa) codificada por Alan Kardeck.
O resultado em termos de bilheteria deve ser espantoso, Tirei pela estréia em Belém, numa sexta-feira santa. Casa lotada. Mas não sei se a idéia de fragmentar a narrativa a partir da entrevista que Chico deu à TV Tupi (Programa “Pinga Fogo”) foi aceita pela maioria. Parece que o roteiro quis tirar qualquer ranço melodramático. Conseguiu em parte. Ainda mais quando deixou o bom humor do médium para o final. Rir faz bem à alma e não precisa de um homem com Chico Xavier para dizer isso.
Rodado nos locais dos acontecimentos, com uma boa produção, “Chico Xavier”, apesar de jamais chegar a esgotar o assunto, ganha o pódio dos filmes do gênero em terras brasileiras. Dá para satisfazer a equipe. Os críticos não. Tanto que mesmo se escondendo do melô, o encerramento com o processo em que a vitima salva o réu em um tribunal não deixa de focalizar as lágrimas dos pais dessa vitima (Christiane Torlone e Tony Ramos). E pode ser até que alguém da platéia responda de forma recíproca. Afinal, não há maior consolo do que se saber que um ente querido cujo corpo está sepultado na verdade prossegue vivo em outro plano da existência. E mais: consegue dizer que está bem.

sexta-feira, 26 de março de 2010

O Gigante Uruguaio e o Maluco Norte-Americano

Dois DVDs de filmes novos que pularam por cima dos cinemas locais: “Gigante” e “O Desinformante”. O primeiro é uruguaio e marca a estréia do diretor Adrián Biniez. O segundo é do conhecido Steven Soderbergh (“Che”).No caso do uruguaio a linha cabe na fonte neo-realista. Jará (Horacio Cananculle), funcionário de supermercado, encarregado de olhar os diversos departamentos através das câmeras instaladas, apaixona-se pela faxineira Julia (Leonor Svarcas). Tímido, ele observa o comportamento da jovem e sente-se enciumado quando aparece um homem que pretendia namorar ela, conhecendo-a pela Internet. O amor de Jará vira obsessão e ele acaba se tornando violento e despedido dom emprego quando sabe que a moça foi também despedida. Chega, finalmente, o encontro dos dois, focado numa praia deserta em um plano conjunto muito bonito.
“O Desinformante”(The Informant!) baseia-se no caso verdadeiro de Mark Wallace (interpretado por Matt Dammon), funcionário graduado de um grande firma especializada em manufatura de alimentos que na ânsia de promoção passa a gravar conversas que provam a venda de aditivos alimentares para outras corporações. Além disso, Mark conta uma história diferente de sua vida, passando por um ex-orfão adotado por um milionário e vencedor nos negócios por sua inteligência. As gravações e mentiras do rapaz geram grandes somas e ele acaba preso, embora saliente que é um bipolar, ou seja, que é doente mental e deve ser tratado como um paciente e não como um espertalhão.
O roteiro de Scott Z. Burns é um pouco confuso e a direção de Sodebergh não se mostra muito animada com o material que tem em mãos. O resultado podia ser melhor, mas Matt Dammon emprega a sinceridade exigida na construção da personagem Por ele o filme ganha o interesse de quem vê.
Curioso é que a história de Mark Wallace lembra a daquele superdotado que embrulhou muita gente e acabou trabalhando para associações financeiras. O tipo que Leonardo Di Caprio encarnou no filme de Steven Spielberg “Prenda-me se For Capaz”.
Os dois filmes chegaram à Belém em DVD. No sudeste alcançaram algumas salas. As nossas se satisfazem com os blockbusters de muitas cópias lançadas em território nacional.

quinta-feira, 25 de março de 2010

A Velha Dama Digna

Festejam-se os 80 anos de Jean Luc Godard e nem se fala nos 90 de Michèle Morgan. A grande dama do cinema francês completou esta avançada idade em fevereiro. Seu último filme para cinema foi “Estamos Todos Bem”(Stanno Tutti Bene) de Giuseppe Tornatore refilmado agora com Robert de Niro no papel que foi de Marcello Mastroianni.
] La Morgan encantou em “Fabiola”, em “Amar-te é o Meu Destino”, em “O Ídolo Caído” e, principalmente, em “Sinfonia Pastoral”. Era a beleza serena da mulher que não precisava mostrar pendores físicos para atrair os parceiros. Uma atriz de classe, a “classuda” de uma linha que em Hollywood pontuava uma Bette Davis, uma Barbara Stanwyck, ou mais atrás no tempo uma Janet Gaynor.
Hoje seria difícil fazer uma retrospectiva de Michèle com o que se tem em DVD na praça. Seria preciso ajuda da Embaixada da França. Mas certamente valeria a pena. A nova geração precisa conhecer essa gente que fez a “vielle-garde” depois injustamente desprezada pelos garotos que quiseram mudar o mundo (como o hoje oitentão Godard).

quarta-feira, 24 de março de 2010

A RAPOSA, O LIVRO E O JOGADOR

Os filmes dos nossos cinemas variaram em gênero, numero e grau. “O Fantástico Sr. Raposo” é uma fabula moderna em que os bons não são necessariamente bons. O Sr. Raposo do titulo, diz que vai deixar de ser ladrão de galinha, monta uma casa bacana debaixo de uma arvore,saúda a mulher que lhe vai dar um filho(no original literário é uma ninhada), e se dedica a escrever uma coluna no Jornal dos Bichos. O problema está na sentença de quem foi rei sempre será majestade, Raposo não resiste em atacar os galinheiros dos senhores Boque, Bunco e Bino. Aquela história do escorpião que pede carona a um sapo para atravessar o rio e no meio do caminho pica o sapo apesar de ter jurado se comportar. “-É minha natureza” diz o escorpião. É o eco ouvido pelo Raposo pai da família que ataca as aves chegando a armazenar carne em sua dispensa.
O diretor Wes Anderson não é um La Fontaine ou um Esopo. Intelectual da linha moderna fez “Os Excêntricos Tenenbaums” e “Vida Marinha com Steve Zissou”,filmes com gente estranha. Nada que o impeça de guinar para a animação e engendrar personagens avessas aos estereótipos cinematográficos. Na sua forma, o método “stop motion” de visualizar Raposo & familiares tem correlação com o que já mostrou. E na fidelidade a um tema, reafirma talento. Agora de forma mais acessível ao grande público. A garotada vai aplaudir e os mais velhos não vão se sentir incomodados em acompanhar seus fedelhos ao cinema.
“O Livro de Eli” é outro exemplo de fidelidade. Agora por parte dos irmãos Hughes , os que fizeram “Do Inferno” onde Jack,o Extirpador era uma figura nobre que não se revela de todo no desfecho da história. Desta vez os Hughes mostram-se crentes. Eli (Denzel Washington) é um andarilho no mundo pós-apocalipse que segue rumo ao oeste dos EUA levando consigo o último exemplar da Bíblia. No caminho ele encontra um tirano que deseja o livro. Eli parece inscrever o seu próprio livro no texto sagrado. Antes de sucumbir a um atentado do vilão consegue ditar os versículos do Velho Testamento que sabia de cor a um providencial escriba-editor. Ressurge a Bíblia. E a companheira que ele adquire na jornada é quem vai substituí-lo na reorganização do mundo.
O cinema anda filmando demais fim de mundo. Ainda ontem eu vi “A Estrada”(The Road) de John Hilcoat com base numa história de Cormac MacCarthy. Ali, pai e filho sobreviventes de uma guerra anônima buscam meios de sobreviver num mundo violento. No caso de “O Livro de Eli” é a mesma coisa, porém o sentido da fé e a história sagrada, permeiam o cenário e colocam um autêntico samurai na luta pelo Bem.
OK, tudo acomodado como um sermão pronunciado numa igreja. Mas o visual conseguido é muito bom, talvez o melhor dos filmes semelhantes, superando o de “Mad Max”,a trilogia australiana que lançou o ator Mel Gibson..Só isso já vale a ida ao cinema. E como o perdão é a alma da religiosidade, perdoar rasgos sentimentais é um aceno para a salvação do espectador.
Finalmente “O Sonho Possível”(The Blind Side) aquela coisa que deu um Oscar a Sandra Bullock. É como se ela própria abrigasse em casa o negro pobre vivido por Quinton Aaron, bolsista numa universidade por saber jogar futebol americano. Ela, madame Leigh Anne, é socialite de carteirinha. Mas samaritana de carimbo. O argumento deriva de um caso real, mas o ruim é a gente ter de agüentar cenas dos jogos, esse tipo de esporte que para nós, do pé na bola (ou “soccer”) é escrita chinesa. E convenhamos, Bullock não diz por onde ser digna de prêmio, Talvez tenha merecido mais o Framboesa de pior intérprete do ano dado pela turma irreverente que contabiliza o outro lado da medalha em Hollywood.
Um saco.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Mandela, Freeman, Eastwood

“Invictus”(EUA,2009) chega na hora da Copa do Mundo na África do Sul. Se os EUA não fossem mais beisebolistas eu podia pensar que o filme dirigido por Clint Eastwood era oportunista. Mas não deve ser. Conta a história de um campeonato internacional de rugby, justamente em Capetown (África do Sul). O presidente é Nelson Mandela. Ele acabara de sair de uma prisão que lhe comeu 30 anos de vida. O país, livre dos ingleses e do “appartheid”, não andava bem na economia. O campeonato seria uma forma de angariar divisas. Mas o negro sul-africano não tinha estrelas nesse esporte. O time nacional teria de ter maioria branca e preponderância de ingleses. Motivo para um comentário de Secretario de Estado: “- Ele(Mandela) passou tanto tempo preso e agora vai prestigiar seus carcereiros”. Os ingleses, por seu turno, temiam revanchismo na nova política do país. Os pais do atacante do time sulafricano(vivido por Matt Dammon), ingleses de nascimento, dizem ao filho que tenha cuidado. Mas a porfia só veio provar o caráter de Mandela, a sublime faculdade de perdoar. Mesmo em beneficio próprio.
O filme de Eastwood é, como se podia esperar, muito bem narrado. Eu que não pesco bulhufas de rúgbi torci pelos sul-africanos. E Morgan Freeman como Mandela é “a cara” do personagem. A gente não pensa que é o político. Esquece o ator.
Uma pena que o filme de Clint Eastwood não tivesse seduzido uma platéia como devia. Entrou no Oscar por Freeman, realmente impressionante. Mas do diretor coube, no passado, muito mais. De qualquer forma ele próprio me parece invicto. Tudo o que faz é no mínimo bom. Isto é raro no cinema, mesmo com o respaldo industrial que tem o que é feito nos EUA.
Outro milagre: o filme ser exibido em Belém. Certo que jogaram lá na linha divisória do gramado, ou seja, no shopping Castanheira. Mas quem tem coragem de enfrentar o entroncamento vai lá.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Quando Trabalhar É Mais Divertido

O profissional que se diverte trabalhando é um agraciado da sorte. Meryl Streep pode estar nesse clube. A atriz, hoje na casa dos 60, chorou rios em atuações pregressas como em “A Escolha de Sofia” e “Kramer Vs Kramer”. Agora ela ri. Riu como cantou e dançou em “Mamma Mia”, ri fazendo guloseimas em “Julia & Julie”, e ri em mais de 80 minutos dos 120 de “Simplesmente Complicado”(It’s Complicated).
No filme de Nancy (Melhor é Impossível) Meyer, a talentosa Streep é uma mulher divorciada que o ex-marido assedia e a leva a fazer sexo depois de 10 anos de jejum. Convenhamos que é muito. Uma amiga, dessas de rodas em bar (mulher também fazem esse tipo de reunião) conta que conheceu uma fulana que de tanto jejuar sexo viu fechar a sua vagina (“teve de fazer uma vaginoplastia”). Sei lá se foi medo ou a cantada de Alec Baldwyn deu certo: Meryl transa com o “ex” (que a chifrou no passado) e a coisa se repete pelo menos por mais duas vezes. É o ponto em que a mulher detém as gargalhadas e diz que não foi feita para ser amante de quem foi seu marido. No banco de reserva está o arquiteto vivido por um Steve Martin quieto demais. E do lado de Baldwyn está uma esposa, Lake Bell, com idade de ser sua filha.
O romance em geometria confusa (é um quarteto e não o velho triangulo) não se resolve plenamente. Nessa posição é que a diretora joga com um elemento cabeça: filma na chuva o balouço onde estavam Meryl e Alec conversando sobre a sua situação, e rima com Martin atendendo a convites de Meryl para comer um doce em sua casa. Aí a platéia entende que tudo vai ficar como antes no quartel de Abrantes (não é assim que se diz?). Mas...será mesmo ? “It’s Complicated” pode ser simples como o titulo porém o roteiro, da própria diretora, não embarca na canoa furada que é meditar sobre velhos amores. Para a platéia de comédia romântica o tempo corre numa horizontalidade sem desvios. O certo, porém, é que alguns atores parecem se divertir mais do que os que os vêem. Afinal, Meryl ri. Nem como propaganda de dentifrício se mostra tanto a dentadura. (Pedro Veriano)

domingo, 21 de fevereiro de 2010

O CÉU PODE ESPERAR

O cinema já mostrou diversas versões da vida depois da morte. Nem discute se isso existe: sendo matéria de atração popular, conseqüentemente de boa bilheteria, então tudo OK. A última versão do tema é “O Olhar do Paraíso”(The Lovely Bones), história contada por Alice Sebold em seu livro de 2002 que de tão sedutor para uma grande faixa de público ganhou edição brasileira:“Uma Vida Interrompida- Lembranças de um Anjo Assassinado”.
Desta vez a trama é contada pela morta. Mas nada parecido com o que o cadáver de William Holden na piscina de Gloria Swanson contou no “Crepúsculo dos Deuses”(Sunset Boulevard) de Billy Wilder Aqui a menina assassinada narra em espírito como morreu, como ficou a sua família quando soube de sua morte, e como se deixou inconformada (e por isso sem voar para o paraíso) por não ter concretizado o desejo que era ser beijada por um colega de escola.
Não conheço o livro, mas seria (ou será) interessante se analisar o que um beijo representava para as garotas de uma classe social em um tempo(o crime aconteceu em 1973). Lembra Rostand: “um beijo o que é que se não peça/ um voto que se faz mais perto/ uma promessa mais firme/ um ideal que o fato corrobora/um punto róseo no i do lábio que se adora...”
Mas o filme de Peter (Senhor dos Anéis) Jackson também fica, como sua heroína, entre o céu e a terra. Com uma enxurrada de efeitos digitais ele pinta um além que mais parece o caminho de Oz (a terra do mágico). E se desliga da vida terrena embora a câmera não a deixe, vendo a irmã de morta investigando e se arriscando na pista do vizinho “serial killer” que ela, enfim, desmascara mas fica por isso (não se sabe das medidas policiais em torno).
No plano celestial, ou na ante-sala do paraíso, estão as idéias da mocinha. Se ela está morta, se através de uma encarnação relâmpago consegue o beijo almejado, que importa o resto? O seu corpo jamais foi achado. Nós, no cinema, sabemos que ficou dentro de um cofre jogado no lixo de sucatas pelo criminoso. E o vilão jamais é preso. Morre velho, e ainda paquerador, numa queda boba que a julgar pelo degelo de uma falange de neve que desaba sobre sua cabeça pensa-se em castigo das almas que ele mandou para o além (são muitas e visíveis pela mocinha).
Uma das perguntas que se faz: se Susie, a morta, não decolava por causa de um beijo, qual o problema das suas colegas de infortúnio, que estão no limbo como ela? E que aconteceu com a investigação de um detetive amigo da família que vivia perseguindo quem tentasse abelhudar a vida do vizinho malvado?
Muitas perguntas ficam sem resposta. O filme empaca por não assumir a identidade sentimental de “Ghost” ou cair no carnaval de “Amor Além da Vida”. Tampouco flerta com o espiritismo e visa olhar um céu católico. É um meio termo como aquele outro limbo que dizem ser a casa das crianças não batizadas que os antigos cristãos descreviam como incapazes, por si, de acesso a Deus.
Jackson perdeu a bola. Seu filme só tem uma vantagem: não é chato. Vê-se com atenção e até por isso se percebe os furos.Dai a culpar o romance, só lendo. Mas cinema não é ilustração de texto. Há de se recriar. E aqui parece que se recriou para pior. (Pedro Veriano)