sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

O Apartamento

Candidato  ao Oscar de filme estrangeiro, “O Apartamento”(Forushande/Irã,2016) é mais um filme denso do diretor de “A Separação”, Asghar Farhadi. No roteiro um casal se muda para o pequeno apartamento de um amigo quando o seu está prestes a desabar. O problema é que o lugar havia sido ponto de uma prostituta e a esposa do novo habitante é atacada por um homem que procura sexo. O marido dela, ator e professor, encontra o sujeito e se vinga. Um drama familiar que é tratado numa linguagem simples, com excelente direção de arte, e desempenhos corretos de atores como Sahab Hosseini e Taraneh Alidoosti.
Espanta quem sabe da censura existente no Irã, onde as mulheres muçulmanas não tiram véu da cabeça, com a trama avança em dramaticidade que não deve ser de agrado do regime dos aiatolás. Mas assim como em “A Separação” Farhadi vai fundo no enfoque de pessoas simples de famílias bem organizadas. E desta vez faz um paralelo entre o que se passsa na vida de um ator com o que ele faz no palco em uma peça norte-americana. Um close de Hosseini se maquilando para entrar em cena no teatro, depois de ter submetido à tortura o homem que quase mata a sua mulher, é muito sugestivo. Ele, tido como pessoa pacata, está em vias de perder a esposa por quem tanto lutara e ver seu lar destruído como o foi na parte material quando foi obrigado a se mudar.
                Um bom filme que certamente só será visto aqui pelos investigadores da internet e/ou no Libero, a sala alternativa que está suprindo o belenense de cinema adulto.



quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Jackie


“Jackie”(em cartaz em algumas salas de shopping fora de Belém) é o que certamente Natalie Portman esperava para bisar o Oscar (ela ganhou por “Cisne Negro”). Em tom documental o roteiro de Noah Oppenheim segue Jacqueline Kennedy nas horas que seguiram a morte do marido dela, o presidente John Kennedy, deixando sentir o pesar de deixar a Casa Branca que ela decorou pensando em passar ali  por dois períodos de mandatos do marido. O filme dirigido por Pablo Larrain centraliza a ação na viúva que mal pode esconder o desespero que lhe deixou o momento do atentado em Dallas quando JFK foi alvejado mortalmente. Quase toda a ação se passa entre paredes da mansão presidencial e a câmera usa e abusa da atriz,ora em plano-conjunto ora em closes, autorizando expressões que fogem de um esquema teatral no modo como se mostra adiante das câmeras.
                O filme não prossegue na historia de Jackie Kennedy, muito menos no fato dela, anos depois, ter casado com um milionário grego (virando Jaqueline Onassis).  Também não alcança o mapa de tragédias que a família Kennedy viveu, seja a partir do cunhado da personagem, Bob(assassinado pouco tempo depois do irmão) ,passando pelos filhos (o pequeno John, já adulto, morreria num desastre de aviação em que ele mesmo era o piloto). Dessa forma não interessa a capacidade de Jackie em “dar a volta por cima”. O que se mostra é o comportamento dela na hora em que deixava de ser primeira dama dos EUA. E Natalie Portman deixa que se pense numa vaidade acabada, no inconformismo da ainda jovem que perdera o esposo rico e famoso de forma brusca.
                Natalie toma conta do papel e chega a lembrar fisicamente o tipo que interpreta. Uma pena que o filme não chegue à Belém na versão original onde se possa ouvir a voz da atriz, expondo os tons de desespero. Eu imagino de como a dublagem deve transformar o quadro dramático num espaço cômico...

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Moonlight

‘Moonlight, Sob a Luz do Luar”(Moonlight) encara corajosamente (em especial nessa era Trump) dois preconceitos : negro e homossexual. Com roteiro do próprio diretor,Barry Jenkins, trata de um menino, depois adolescente,depois homem feito(três atores), que sempre se viu “diferente” e por isso alvo de bullyng.Como ele é focalizado, nos diversos tempos da vida e no relacionamento com diversas personagens, a começar com a mãe que não lhe devota muitos cuidados e diz achar que ele “se safa de problemas”, é a métrica do enredo que deriva de um texto escrito por Tarell Alvim McCraney (uma peça teatral).
O filme não é apenas um desafio temático ou uma resposta dos autores ao olhar preconceituoso (e violento) de tantos de tantas etnias (pois há preto que trata mal preto e homossexual que critica parceiros de opção)_. É um quadro muito delicado de um (ou mais) problema. Vai no plural pois focaliza também a mãe prostituta, a miséria reinante, a violência que palmilha o quadro social.
Diz-se que Moonlight (Luz da lua) deriva de um conceito evocado pelo tipo vivido por Mahershala Ali que está na peça original: “Sob a Luz da Lua, Garotos Negros Parecem Azuis” . Não seria apenas uma visão homogênea da espécie mas um aceno poético por sobre um conceito racial. Ouvindo isso, o garoto Little (Alex Hibbert) poderia ser estimulado na sua busca interior, achando-se “diferente” sem aquilatar como ou por que.

Há momentos inéditos no cinema americano, como jovens e homens negros se beijando. Imagino como isso seria um escândalo na época do cinema em que brancos se pintavam de negros para certas sequencias filmadas. Agora mesmo vi uma comédia curta de Hal Roach com Harold Lloyd, feita em1920, que os negros eram pândegos. Há inclusive um garotinho negro brincando de fantasma. Por avançar no terreno do preconceito e por fazer um cinema artesanalmente interessante, “Moonlight” ganha lugar na história. Não é, por certo, o filme de grande plateia internacional, mas é o programa diferente que muitos pedem. E felizmente é lembrado para o Oscar embora não me pareça capaz de prêmios dos acadêmicos de Hollywood.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Aliados

                Vendo “Aliados”(Allied) a gente pergunta como Robert Zemeckis, diretor de sucessos populares (e de critica) como “Forest Gump” e “Naufrago”, foi se deixar seduzir pela historia de Steven Knight sobre um casal de espiões na França ocupada pelos alemães durante a 2ª.Guerra Mundial. Teria sido pensando em “Casablanca”, afinal o filme eleito pelos espectadores americanos como “o mais querido de todos os tempos”(ou o berço do que se chama “cult movie”) e no carisma de Brad Bitt aliado à Piaf do cinema, Marion Cottilard ?Também pesaria o fato de que Pitt se separara de Angelina Jolie a reforçar boatos de que a culpa esteve a partir das cenas amorosas do filme de Zemeckis, possivelmente emendadas com caricias fora das câmeras. Enfim, havia proposta comercial capaz de cobrir o custo de 80 milhões e a ousadia de filmar em estúdios como nos velhos tempos, usando uma direção de arte capaz a cargo do experiente Anthony Caron-Delion e mais o figurino de Joanna Johnston que é candidato ao novo Oscar. Mas não deu certo. O filme não chegou ao grupo de favoritos do box-office e a critica viu um diretor sem rumo numa historia banal.
                Pitt faz o espião canadense Max Vatan que se junta à experiente na resistência francesa ao domínio alemão. Marianne Beausejour(Marion Cotillard). Os dois chegam a matar muitos alemães inclusive uma autoridade numa reunião de cúpula. Mas há uma sombra levando a se pensar que Marianne é na verdade uma espiã nazista. E quando a situação engrossa a suspeita fica com o espectador a “torcida” se a garota (já mãe de um filho do colega) é mesmo “quinta coluna”(como se chamava simpáticos ao time de Hitler).
                O filme é desse que repousa no final. Conta-lo ao espectador é desmanchar o único prazer que ele traz. Digo único pois ninguém funciona a contento. Pitt está apático. Marion tenta impor seu tipo(e está acima da linha baixa) e o roteiro acadêmico não estimula até que alcance a suspeita de quem é quem na historia.
                Creio que Zemeckis foi vitima de uma ambição advinda do que se desejava nos antigos estúdios, na época que se retratou em “Barton Fink” onde tudo era armado pela “fabrica”em função de quanto cairia no gosto de grandes plateias. Chega a ser percebida a influencia de “Casablanca”. Mas falta Claude Rains expondo cinismo até quando anuncia amizade com Bogart (cena que muita gente achou uma cantada homo).

                “Aliados” só ganha circuito de shopping em Belém porque a produção ainda espera receptividade no “resto do mundo”. Quem admira Zemeckis deve sentir que a coisa ficou insuficiente. Tanto que a gente pensa como Brad Pitt se comportaria numa ilha deserta como Tom Hanks. No caso a bola de vôlei que Hanks fazia de Sexta Feira na lembrança de Robinson Crusoe seria objeto de masturbação. 

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Ainda La la land


                O primeiro plano de “La la land” traz a logomarca Cinemascope abrindo o quadro como se fazia quando a lente de Henri Chretién entrou na moda após o logotipo da 20 Century Fox(que comprou o invento francês). Com isso o diretor Damien Chazelle diz que seu filme tem a ver com o passado da indústria cinematográfica norte-americana. E passa a focalizar um numero musical a partir de um engarrafamento na ponte que leva a Los Angeles. Dali se apresenta o casal interpretado por Emma Stone e Ryan Goslin, ela pretendendo entrar para a Warner Bros, ele sonhando com um bar onde não só toca jazz em piano.
                A base da construção do filme passa pela conversa de Sebastian(Goslin) com um jovem de uma banda de jazz. Este reclama que o moço do piano só toca jazz antigo, que deve pensar nos jovens, no novo meio de expor o ritmo. Por aí passa o filme de Chazelle. A maior parte de sequencias é de musicais clássicos de Hollywood, inclusive a construção de imagens como na sequencia em que se dança sobre um cenário de céu azul a lembrar Astaire e Caron em “Papai Pernilongo”(Daddy Long Legs). Esta porfia pelo que fazia Stanley Donen, ou Vincente Minnelli, esbarra no realismo que os tempos modernos exigem para se “acordar da fantasia”.É assim que os amantes não encerram as suas deixas com um beijo à maneira de Kelly & Caron em “Sinfonia de Paris”(Na American in Paris). O que se vê é a mãe da família, casada com um estranho nesse ninho, assistindo ao velho amor no piano de bar de onde ele a vê e faz um gesto de quem sofre calado o desvio de seu romance. Para se chegar a esse “bad end” há uma profusão de planos dos namorados de ontem em seu auge de caricias (planos já vistos e lembrados em “machine gun cut”).Com este final, que fecha num aceno de despedida doloroso para os ex-amantes, o roteiro acrescenta que aquele cinema de musica e fantasia já ficou na memória de quem ainda via a tela cinemascope e não o panavision (a técnica que outros estúdios driblaram o monopólio).Só faltou fechar a cena em quadro menor e em preto e branco...
                Bem, “La la Land” me pareceu, numa revisão, um ensaio interessante sobre o cinema do passado, aquele das vesperais que alguns apelidavam de matinês. E com o cuidado de dizer que se cutucou memoria, até com musicas graváveis embora sem o charme de um Gershin ou Cole Porter .Não vejo como um “despertar” bem estruturado mereça tantos salamaleques como está recebendo. Mas reconheço que o que o jovem cineasta desejou ele conseguiu e esse desejo foi bastante criativo. Afinal, muitos que estão amando o filme de agora não viram os clássicos do passado. Penso até que essa influencia “genética”(os pais dos novos espectadores foram fãs de Kelly, Astaire. Cyd Charisse, Leslie Caron..._) seja um fato a considerar e quem sabe não passou pela cabeça do quase calouro (e certamente um admirador do cinema antigo) Damien. Só isto já basta para votar nele quando do Oscar. Muito mais a que o filme é candidato parece exagero.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Lion

Sunny Pawar não é candidato a Oscar de ator embora seu papel quando adulto, a cargo de Dev Patel (de “Quem Quer ser um Milionári”)seja, embora como coadjuvante(e é o principal). O filme chama-se “Lion” e o nome deriva de como se chama na tradução real o menor adotado pelos protagonistas Nicole Kidman e David Wenham,ela candidata num papel minúsculo. Bem, eu já disse mil vezes que Oscar não rima com lógica. Mas “Lion” é um bom filme. Narra linearmente o drama de um garoto indiano que se perde do irmão mais velho numa viagem pela ferrovia da região onde mora e, embarcando num trem, passa por diversos lugares virtualmente mendigando, até ser colocado como adotivo de um casal inglês. Mas o menino, depois rapaz, sempre desejou saber do irmão e da mãe. E na jornada para vê-los não importa se trata mal os pais adotivos.

                Bem fotografado em locações especificas, com edição acadêmica, o filme revela uma direção coesa do australiano Garth Davis e sempre interessa ao espectador. Naturalmente não resiste à uma analise realista pois ficam no ar indagações sobre o comportamento do garotinho de uns 10 anos no mundo cruel em torno (aqui seria logo violentado e morto). Mas é cinema, é ficção embora com base no livro biográfico de Saroon Bierley. Tomara que chegue aos nossos cinemas de shopping ou chegue a um alternativo (no caso só o Libero pois o Estação morreu) antes da entrega dos prêmios americanos. Pelo menos deriva na pauta em que gente como Ryan Goslin disputa vaga contra Casey Affleck, Denzel Washington, Andrew Garfield e Vago Mortensen. Todos superiores ao dançarino de “La la Land...”

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Estrelas Além do Tempo

“Estrelas Além do Tempo”(Hidden Figure) baseia-se no livro de Margot Lee Shaterley,afinal a produtora do filme. Allison Schroeder e Theodore Melfi cuidaram do roteiro e ao que dizem enxertaram ficção a ponto de tornar mais viável em termo de cinema-espetáculo a historia de 3 mulheres negras que trabalharam na NASA e uma delas foi a responsável pelo êxito do vôo pioneiro de John Glenn.
O filme dirigido por Theodore Melfi é candidato a 3 Oscar(filme, atriz e roteiro adaptado) e não se exime de uma linguagem linear que privilegia a odisseia de Katherine (Taraji P.Andersen), excelente matemática que por sua qualidade na matéria ganha posto no programa de vôo espacial que na época(1963)lutava para superar o feito dos russos que inauguraram a estada em orbita da Terra com Yuri Gagarin.
Não conheço o livro original e não sei, portanto, até que ponto entrou o preconceito com mulher negra na equipe de técnicos espaciais formada por homens brancos. Mas o argumento não fica em Katherine, chegando às amigas Dorothy e Mary Jackson, todas igualmente negras e estudiosas em contas & tecnologia.
A opção por uma linguagem cativante leva a critica ao preconceito racial e também ao papel da mulher numa instituição criada por homens. As atrizes dão bem o recado e o espectador sai do cinema crente de que se não fosse por Katherine o piloto da capsula Mercury, que ela chegou a conhecer e se mostrou simpático à sua atuação, teria queimado ao reentrar na atmosfera da Terra. Mesmo assim há suspense na hora da reentrada com o aquecimento do material ganhando limites do suportável.
Nada de obra-prima cinematográfica. Apenas um filme bem feito industrialmente sobre um fato histórico. No panorama atual da exibição comercial isto quer dizer muito. E surpreende ele chegar à Belém ganhando todas as sessões de uma sala do Cinepolis Boulevard em copia legendada. É para o fã agradecer de joelhos.