segunda-feira, 21 de setembro de 2009

SINDROME DE COTARD

Primeiro é preciso que se saiba que diabos é “sinédoque”. Diz-se de uma coisa que se compara a outra, ou que lembre outra. No caso do filme “Sinédoque Nova York”, o personagem principal, Caden Cotard(Philip Seimour Hoffman) faz uma “Big Apple” dentro de um teatro em que ele pretende encenar a “peça de sua vida”.
Depois há uma explicação para o nome do herói da história: Cotard, médico francês do século XIX, pesquisou o caso de um cliente que se dizia morto. Por se julgar morto, o homem se sentia em estado de putrefação.
Explicando isso se pode entrar no universo do cineasta Charlie Kaufman que, neste novo (2008) filme estréia na direção (antes ele foi apenas roteirista, e brilhante quase sempre, a provar “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”e “Quero Ser John Malkovich’).
Primeiro se conhece mr. Cotard. Antes de ele acordar vê-se uma sala escura, um desenho animado passando na TV, e o despertar de um hipocondríaco tipico. Quem conhece um deles sabe como esse tipo de pessoa, ou doente(pode-se dizer), faz a sua manhã. São diversas pílulas aguardando vez para seguirem goela adentro. Mas no caso focalizado, a hipocondria já está sendo contagiosa. A pequena filha de Cotard, chamada Olive (Sadie Goldstein), está impressionada porque o “seu cocô está verde”. A mãe minimiza a impressão. Mas logo o pai dá um grito. Ao se barbear bate no espelho e cai um vidro sobre sua testa produzindo um ferimento. A filha se impressiona com o sangue derramado. No caso, a caminho do hospital onde o pai ganhará alguns pontos na testa, ela diz que “não quer ter sangue”. O medo se define como a aversão à idéia de morrer. E isto passa para os atores no teatro onde Cotard trabalha.A idéia fixa de que a morte é inexorável passa num discurso do encenador para os intérpretes e lembra para o cinéfilo o Woody Allen de tantas vezes, especialmente de “Hannah e Suas Irmãs” quando a fobia de um câncer no cérebro leva o personagem a peregrinar por consultórios médicos e depois, ao ver uma tomografia limpa, festejar na rua para, em seguida, pensar que o diagnostico é prematuro, que “um dia a doença pode ser revelada”.
Morte e vida pontuam o filme, mas as primeiras seqüências realistas cedem espaço aos devaneios de Cotard a partir da chance de encenar o que deseja posto que recebeu um prêmio (em dinheiro) por seu trabalho anterior (criticado como um remake de peça antiga). Daí em diante o que acontece no plano real é detalhe de um ensaio para o palco. Sabe-se que a mulher dele, Adele (Catherine Keener), partiu com a filha e sabe-se que ele procurou sexo com a bilheteira Hazel (Samantha Morton) e em seguida com a jovem atriz Claire (Michelle Williams). Também se sabe que procurou a psicóloga Madeleine (Hope Davis), que os pais morreram (primeiro o pai, depois a mãe, de câncer), e que arranjou um ator para fazer o papel principal na peça, na verdade o seu “alter ego”.
É interessante que esta mescla de realidade e ficção se une numa pontuação em que uma ajuda à outra. Por exemplo, a casa que Hazel compra está sempre em chamas. Ninguém se importa com isso e até a corretora fala de incêndio como uma hipótese viável a qualquer morador. O fogo marcaria a mulher sensual que depois se junta a um outro tipo – e ainda se vê novamente só, no processo de tempo que se usa na feitura de peça e que apenas sintetiza a realidade (Cotard não envelhece tanto na vida como envelhece no palco).
Vendo o filme, e numa primeira vez certamente perdendo-se no labirinto de informações sobre o que se passa na mente do autor, a gente pensa que, perto do final, Kaufmann sai do esquema felliniano (há muito de “Oito e Meio” de Fellini) e põe um corifeu a “contar” o que se passa. Mas o filme não termina aí, desmentindo a totalidade da síntese falada. Há mais planos, como os da mulher cadavérica que mora no edifício para onde se refugiou Adele e vive dando um recado dela, como, e finalmente, o “velho” Cotard reencontrando Hazel (que pouco envelhece) e pedindo licença para botar a cabeça em seu colo. Esta conformação no carinho que não conservou em tempo hábil poderia fazer cair a cortina. Mas não se faz um recurso teatral para encerrar um processo de linguagem muito mais cinematográfico. O plano médio do casal (Cotard e Hazel) vai esmaecendo (fade in) e a tela ficando totalmente branca para receber os créditos finais.
Charlie Kaufman já se sabia ser um dos mais criativos roteiristas do cinema moderno. Agora também diretor. Um atestado de maturidade em um filme difícil que tenta ver dentro de uma pessoa até com efeito mimético. Seria aquele “raio-X da alma” que tanta gente quis fazer. Palmas à tentativa (Pedro Veriano)

domingo, 20 de setembro de 2009

KYESLOWSKI E O SEU "AMADOR"

Saiu em DVD um filme raro do polonês Krystoff Kieslowsky (1941-1996): “Amator”(1979), aqui batizado de “Cinemaniaco”(nome dado à uma comédia de Harold Lloyd). Uma feliz síntese do que pensava o cineasta no inicio de carreira. O herói, Filip Mosz (Jerzy Stuhr) compra uma câmera de 8 mm para filmar a primeira filha, nascida sob uma expectativa que o leva ao pranto. Mas o uso da câmera acaba fascinando-o mais que a garotinha. Logo está filmando funcionários da empresa onde trabalha, documentando reuniões e com isso conhecendo pessoas ligadas a cinema (inclusive uma bela produtora com quem chega a ter um breve caso). O “hobby” leva à destruição de seu casamento. A mulher mostra-se decisiva e sintetiza o drama ao demonstrar que ele, optando pela cinematografia, deixou de ser o marido fiel, humilde, carinhoso, feliz por ter a vida que escolheu em comum acordo com ela.
Há muitas reviravoltas na história, mas, no fim, o sofrido Filip filma o seu próprio rosto e diz quem era, o que desejava, o que acabou perdendo.
Será que Kieslowski era um desses simples operários da Polônia comunista que experimentou ser uma estrela da burguesia e se arrependeu? Como o roteiro explica, a arte não vale a paz de espírito, como se uma coisa só existisse sem a outra.
Basicamente o tema força um engano. Engano de quem vive o drama focalizado, engano de quem coloca em xeque um talento a emergir da mansidão que patrocina o anonimato. Neste caso, surge em primeiro plano, a idéia do operário benquisto que peca ao tentar ser patrão. E nem é preciso ir muito longe: o personagem filma um colega, o mais antigo de seu trabalho, homem modesto, deficiente físico, que numa entrevista conta que se sente feliz em estar com a esposa e sair de casa uma vez por semana para ir a um cinema ou a um bar. A filmagem leva à dispensa do velho.O patrão não quer que se divulgue detalhe da empresa ou de seus empregados.
O argumento é frágil, embora trate o cinema como uma fascinação. Quem filma em Super 8 mm passa a filmar em 16mm e pode chegar ao 35mm se continuar a gostar do que faz. Não é o caso em pauta, mas foi de Kieslowski como foi de Zanussi, cineasta que aparece numa ponta como convidado para uma exibição num sindicato. Zanussi em “Iluminação” tocou na mesma ferida quando seguiu um estudante inteligente, apto a ser um mestre em física, mas relegado a um emprego de escritório para poder manter a família que cedo constituiu. Para contar o seu drama o diretor foi buscar Santo Agostinho ao falar dos “iluminados”. Em “Amator” o caminho é o mesmo, talvez de forma mais explicita, com a luz apagando por conta de um dilema ético (ou moral).(Pedro Veriano)

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

DOIS CENTENÁRIOS MALDITOS

Muita gente falou do centenário de Joseph Losey, o diretor de cinema americano que a Inglaterra herdou depois do “maccarthismo” (ele fugiu da raia, pois seria preso como comuna-e não era). Mas ninguém badala a mesma idade de Marcel Carné e Elia Kazan. O primeiro, depois de ter feito obras-primas como “Os Visitantes da Noite” (Les Visiteurs du Soir/1941) e “O Boulevard do Crime” (Les Enfants du Paradis/1943) foi detratado pela turma da “nouvelle vague” como “um velho metido a jovem”. Isto porque Carné retratou a juventude francesa do pós-guerra (a 2ª. Mundial) no seu “Os Trapaceiros”(Les Tricheurs/1950). Aliás, os nouvellevaguistas crucificaram não só Carné, mas Jean Dellanoy e Claude Autant-Lara. Parece até coisa de gente daqui...
Kazan manchou o currículo delatando colegas para a Comissão de Atividades Anti-Americanas presidida pelo senador Joe McCarthy, o nome que entrou para as enciclopédias como sinônimo de intolerância, fomentando uma “caça aos comunistas”, tão ridícula como o nome que recebeu dos espectadores na época (anos 50): “caça às bruxas”.
Mas os que pregaram Kazan não fizeram o mesmo com outro dedo-duro: Walt Disney. Ninguém jogou na fogueira Mickey e Pluto, e muitos que atacaram Kazan levaram os filhos para passear na Disneylândia.
Nos seus últimos dias de vida. Kazan recebeu um Oscar honorário. Foi à cerimônia de entrega. Uma parte da platéia (a maioria) o aplaudiu de pé. Outra tentou uma vaia. Mas a História existe e não pode ser ignorada. A história de um cinema de bom nível quando isso era coisa de poucos produtores (como Stanley Kramer).
OK, Kazan gostava muito mais de teatro e ensinou muitos meninos do Actor’s Studio. Mas nenhum livro de história do cinema que se preze ignora “Sindicato de Ladrões” (On the Waterfront), “Uma Rua Chamada Pecado”(A Streetcar Named Desire), “Boneca de Carne”(Babby Doll) ou “Vidas Amargas”(East of Éden).
Eu acrescento aos melhores filmes de Kazan coisas hoje esquecidas como “Pânico nas Ruas”(Panic in the Streets) , “Um Rosto na Multidão”(A Face in the Crowd) e o brilhante e autobiográfico “Terra do Sonho Distante(América, América).
Os espaços da ACCPA devem abrir para esses dois ícones da cinematografia. Desconhecê-los é seguir o papo furado de alguns membros da “nouvelle vague” que achavam o cinema uma arte esclerosada e pensavam em refazê-lo como uma criatura do Dr. Frankenstein. (Pedro Veriano)

domingo, 13 de setembro de 2009

CINEMA ALTERNATIVO EM PERIGO

Sábado passado fui ao Cine Libero Luxardo(Centur) desejoso de ver o filme premiado (e de estréia) ao ator-cineasta Matheus Natchergaele: “A Festa da Menina Morta”. Quando ia entrando com o meu querido fusca na garagem do prédio um funcionário, delicadamente, perguntou-me se eu ia para o cinema. Disse que sim. E ele disse que não. O cinema estava suspenso por conta de um desarranjo no projetor. Não é a primeira vez que isto acontece. Penso que no meu caso é a terceira. O cinema alternativo, especialmente o que á alimentado pelo poder publico, é de extrema fragilidade.Quando poderia ser o contrário: o mais forte, ganhando gordura com o subsidio.
Soube depois do que estava (ou está) acontecendo. O projetor do Libero, um dos melhores de Belém, está precisando de manutenção. Pequenos estremecimentos indicam que a máquina pode quebrar a qualquer momento. Peças como a cruz de malta indicam o fim do aparelho, pois são tão caras que pedem um novo. A melhor opção é parar antes que tudo se acabe.
E agora a parte tragicômica da historia: o Centur tinha, no meu tempo de programador do cinema de lá, um senhor técnico: o Carlos Lobo.Ele se formou ali, aprendendo num projetor ruim, colocado no espaço não se sabe como, pois até o Secretário de Cultura da época, Acyr Castro, espantou-se quando foi visitar o esqueleto do cinema (ia ser inaugurado dentro em breve) e deparou com a maquinaria em fase de instalação. Manejar esse “Hercules” (nome do projetor) era, de fato, uma tarefa hercúlea. Mas o Carlos dava conta. E deu, depois,com as mudanças para melhor. Hoje conhecia a cabine da sala como sua própria casa. Não precisava ir buscar técnico na conchichina para endireitar um pequeno defeito. Acontece que o Carlos não fez concurso para funcionário (sua categoria não existe em editais) e, como interino, saiu da folha de pagamento da instituição. Contratá-lo por serviços prestados seria a formula. E assim foi feito até recentemente. Agora não tem disso. Não se paga mais uma pessoa que saiba tratar de projetores. Eles que se lixem.
E aí? Como vai ficar o Libero?
Do lado da Prefeitura (o Centur é por conta do governo do Estado), há outro prisma surrealista. O senhor prefeito não quer que se cobre ingresso do cinema Olympia, a casa quase centenária que ele, justiça seja feita, salvou da vontade do dono do prédio (ainda esperando ser tombado) em tirá-la do mapa. Mas se o salão serve para “n” coisas, a parte de cinema fica devendo ao DVD projetado e aos filmes de embaixadas que cedam cópias em 35 mm. Com outro agravante: essas cópias, obviamente, chegam do sul por via área. Carecem de pagamento de frete. E a PMB não paga isso. Então quem paga? Por outro lado, o “datashow” ou projetor de DVD, é muito precário (estava no Memorial dos Povos). Para o espaço seria necessário um que tenha no mínimo 6 a 8 mil lumens (brilho). O que projeta discos, atualmente, deixa sombras na telona, exigindo que se exiba preferencialmente títulos em preto e branco, pois o colorido esmaece de tal forma que se vê apenas...fantasmas.
O Olympia podia ter uma renda (com ingresso como o Libero, a 5 reais, e além disso, bomboniére terceirizada, que desse uma ajuda à boa vontade do prefeito). De graça precisa de verba para manter uma boa programação.
O Cine Estação, que é também do Estado, passou a fazer apenas um programa de cinema por mês no Teatro Maria Sylvia Nunes. Antes eram 3 programas. Uma pena, pois o espaço e o projetor convidam, especialmente em sessões que Belém perdeu como a matinal de domingo.
Quem ainda programa filmes para os cinemas subvencionados é gente que entende do assunto. O contacto com as distribuidoras de filmes existe e é feito com o necessário conhecimento dos produtos (quem não sabe come gato por lebre). Se o poder público olhasse um pouquinho mais para esses espaços a platéia estaria de parabéns. Cinema “de arte” não é artigo de luxo como alguns pensam. É apêndice do ensino, da cultura, do que se faz em escolas. Formar platéia para bons filmes é educar. Portanto, gastar dinheiro com cinema não é jogar fora. Mesmo, nos casos em pauta, é salvar patrimônio. Deixar as coisas flutuarem sem uma bóia é antever naufrágio. E depois do naufrágio haja dinheiro para fazer outros barcos. (Pedro Veriano).

domingo, 6 de setembro de 2009

O REI DO MELODRAMA

Engraçado: no tempo em que a critica nacional era capitaneada por Moniz Vianna (“O Correio da Manhã”) ele e colegas mais velhos (Alex Viany) ou mais novos (Sérgio Augusto, Paulo Perdigão), abominavam os melodramas dirigidos pelo alemão Douglas Sirk. O último de uma série, “Imitação da Vida”(Imitation of Life) refilmagem em 1959 de um romance de Fannie Hust (o filme anterior, de 1935, era dirigido por Joseph M. Stahl e tinha Claudette Colbert no papel que depois foi de Lana Turner), foi odiado. Eu fiz coro. Quando via a coisa no Olímpia, quase dou vaia no fim, quando aparece o funeral da mãe negra da mocinha branca (que a rejeitava). Mas o tempo mudou tudo. O cineasta Rainer Werner Fassbinder, um dos cabeças da nova onda alemã, disse que Sirk era um gênio e “Imitação...” a prova disso. Seguiram-se ovações internacionais no mesmo tom. Hoje, aplaude-se tudo que Sirk fez na Universal para o produtor Ross Hunter, inclusive os títulos interpretados pelo apático Rock Hudson (lembro de um debate no Colégio Santa Rosa em que as alunas bombardearam Orlando Costa que exibia “Amanhã Será Tarde Demais” de Leonide Moguy, dizendo que o melhor era “Sublime Obsessão”na versão de Sirk).
Quem está certo? O tempo ou os velhos críticos?
Nem tanto ao mar nem tanto a terra. O melodrama é um gênero. Criticar certos filmes por serem melodramas é criticar a base, o argumento. Naturalmente que o melodrama se alimenta das emoções despertadas. Visa as lágrimas do espectador. E força a barra para que isso aconteça. Mas entre alguns, especialmente nos de Sirk, cabe a excelência de uma história factível, de dores que podem ou não se só de cotovelo. O caso de “Chamas que não se Apagam” (There’s Allways Tomorrow), a meu ver o melhor do diretor e um titulo que eu sempre defendi.
Bárbara Stanwyck faz a velha namorada de Fred McMurray que reaparece quando ele está casado, com filhos adolescentes, mas prisioneiro de uma família que pouco se dá aos seus anseios. É uma carta a mais no jogo de interesses domésticos. Por isso, a volta da amiga, agora uma mulher independente e rica, é um choque. As tais chamas do titulo em português, a meu ver um raro caso de melhor do que o original (“Há sempre um amanhã”).
Não é um enredo, ou um melodrama em que um lar é desfeito por uma lembrança. No fim tudo volta ao que era antes. Nada muda. Mas para mostrar isso em cinema do melhor há um plano em que McMurray aparece de costas no fim de uma mesa e um brinquedo, um pequeno robô, sai andando de onde ele está até às proximidades da câmera. Vai andando até cair. Nada mais se mexe. A metáfora é clara, mas a exposição muito inteligente. Mais adiante ele ouve o ruído de um avião. A velha amada está indo embora.
Sirk sabia fazer chorar em cinema. Se hoje se reconhece, muito bem. Custou a se entender que as “fitas lacrimosas” são válidas.(Pedro Veriano).

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Hip Up

A turma da PIXAR entrou numa sinuca de bico: depois de “Ratatouille” e “Wall E” ficou na obrigação de só fazer obras-primas. “Up”(2009) não chega a tanto mas não deixa de ser um grande filme.
O senhor Carl Fredricksen é um viúvo que sonha em realizar o desejo da mulher, viajando para um lugar na América do Sul onde existe uma grande cachoeira emoldurando um ambiente paradisíaco. Quando o filme começa há outro assunto em foco: um explorador que é desmascarado quando mostra o esqueleto de um animal antediluviano e todo mundo pensa que aquilo foi montado de forma imaginosa sem corresponder à realidade. Nessa época Carl é um garoto que vê em gente como esse explorador, um super-herói. Logo em seguida surge uma menina que o persegue Menina assumindo o tipo pentelho. Ela provoca desastres para rir do colega. Mas as malvadezas se transformam em provas de amor. Sem uma só palavra exibe-se o namoro, o casamento, a vida a dois, a impossibilidade de a madame Fredricksen engravidar, as economias para a viagem dos sonhos serem sempre quebradas para atender alguma emergência, e a doença e morte da companheira.
Trabalhando a vida toda com balões de gás, o velho Carl, ao ver-se no dilema de ou vender sua residência ou ir para um asilo, infla mais de mil desses balões e com isso ergue a sua velha casa para seguir, de forma inusitada, à floresta sul-americana.
Russel, um pequeno escoteiro que persegue Carl para uma tarefa beneficente, acaba seguindo com o viajante “aéreo”.
Bem, não é bom contar todo o filme. Certo é que desse ponto em diante cabe a concessão de aventura para sustentar a garotada na sala de projeção. Mesmo assim uma derivação edificante. O filme prega o valor da amizade, a necessidade da caridade, o desapego às coisas materiais, a imagem nem sempre condizente de um ídolo, enfim, tudo o que justifica a humanidade (ou justificaria).
Há um momento muito bonito: quando a casa voadora parece fugir do controle de seu dono ele diz ao amiguinho: “- É apenas uma casa”. E a gente sabe o quanto custou tudo aquilo para ele e sua companheira inesquecível.
Em técnica volta o primor do pessoal da PIXAR. Também na escolha da trilha sonora. O que deixa o filme a um degrau menos do irrequieto Wall-E é o confronto com aquele explorador do inicio, retomado na mata onde pretende levar em seu dirigível a criatura pré-histórica viva para esfregar na cara de seus detratores. Uma vaidade acima da pesquisa cientifica.
Mas deixem pra lá. “Up” empina como um dos melhores filmes deste ano. O campeão na sua área. De novo PIXAR. (Pedro Veriano)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Tudo Muito Normal

Lord Cigano (José Wilker) em “Bye Bye Brasil”, diz, de uma feita, que “sacanagem tem que ser bem administrada”. O conselho não é seguido por José Alvarenga Jr(diretor), Alexandre Machado e Fernanda Young(roteirista) deste “Normais 2” ora em cartaz nacional (virada de agosto para setembro).
O plot é o casal Rui (Luiz Fernando Guimarães) e Vani (Fernanda Torres) percebendo que não fazem sexo regularmente. Ela concebe um gráfico, com colegas, e conclui que depois de 13 anos a atração sexual reduziu-se a décimos. Está,como diz a piada, candidata à teia de aranha vaginal. Com este gancho, a idéia persegue um possível “ménage à trois”. É noite e os pombinhos passeiam de carro pela cariocolândia atrás de quem tope ir para a cama com eles. É claro que surgem tipos diversos e absurdos. Poucos engraçados. A pornochanchada dos anos 1970 é evocada sem Helena Ramos ou David Cardoso. Isto pode ser até vantagem para “Normais 2”, replay da série global e de um filme que atraiu mais de 300 mil espectadores. Porém falta molho no prato. Não é só exibindo bandalheira que se faz boa piada. O principal é a originalidade. E que há de novo em sexo a três que não se realiza porque a terceira figura devia estar muito mais no manicômio?
Ri pouco. Uma vez foi da banheira espumante em que o casal, com uma hostess ficam presos e sufocados pela quantidade de espuma. E de vinhetas como a de Vani empurrar um enfermeiro e este empurrar uma paciente pela janela do hospital. Também há alguma piada na confusão com o idioma francês, onde “ménage” lembra “homenagem” e “savez-vous” lembra “rendez-vous”. Mas é preciso estar de bom humor para mexer os lábios. Por sinal que o bom humor deve nortear até a ida ao cinema.
Claro que o cineminha caboclo tenta achar o seu publico como os americanos fazem com as suas “American Pie”. Se depender do meu voto, “Normais 2” ganha de sola a torta gringa de meninos virgens nauseantes. Mas eu não creio que o filme chegue a derrubar a cifra do primeiro. Hoje o pessoal que vai ao cinema não quer só ouvir piada cabeluda: quer coisa nova, quer imaginação. E qualquer tipo de novidade passa longe dessa “normalidade” televisiva. (Pedro Veriano).,

De Porre Com a Vida




Taí: “Se Beber Não Case”(The Hagover) é uma rara comédia surrealista. No apartamento de luxo do Ceasar Palace em Las Vegas, posto de repouso de 4 rapazes em ritmo de farra por conta do próximo casamento de um deles,resta o caos (desarrumação) e detalhes que deliciariam Buñuel: um tigre no banheiro (e como a turma da cerveja poderia mijar ?), um bebê no chão e uma galinha passeando. Tudo isso e o sumiço do noivo, em tese o dono da bola.
O filme de Todd Philips é um hiato agradável na imbecilidade da comédia romântica tradicional, ou melhor, a que se está fazendo depois do “American Pie”. Boas piadas, bons intérpretes, direção que poda os pontos mortos, e uma surpreendente guinada para o absurdo, da galinha que não se explica a que diabos veio, do tigre do peso-pesado Mike Tyson (que pela primeira vez banca ator de cinema) e até de um asiático bom de porrada que se diz seqüestrador do noivo que sumiu (e a noiva está em contagem regressiva no altar armado em sua casa).
Rir não é muito fácil. A comédia é um gênero que merece muito respeito posto que é difícil de fazer. Claro que há pastelões, chanchadas, pornochanchadas, coisas baixas para os pólos da vida: os ricos que riem à toa e os pobres que riem de sua própria desgraça (como dizia Luis Delfino no “Tudo Azul” de Moacyr Fenelon). O caso de !Se Beber não Case”, ou “A Ressaca”, traz inventiva. Por isso vale enfrentar o transito desta Belém cada vez mais curta para tanta máquina volante e ir ao cinema. Ah sim: e enfrentar as filas para adquirir ingresso e para entrar na sala objetivada. Sinal dos tempos. (Pedro Veriano)