domingo, 27 de dezembro de 2009

OS MELHORES DE 2009 (ACCPA)

1º Alexandra (Idem. França/Rússia, 2007), de Alexandr Sokúrov – 68 pts.
2º Gran Torino (Gran Torino, Australia/ (EUA, 2008), de Clint Eastwood - 63 pts.
3º Amantes (Two Lovers, EUA, 2008), de James Gray – 55 pts.
4º Bastardos Inglorios (Inglourious Basterds, EUA, 2009) de Quentin Tarantino – 53 pts
5º O Sol (Solnze, (Rússia/Itália/França/Suiça, 2005), de Aleksandr Sokurov – 42 pts.
6º Inimigos Públicos (Public Enemies, EUA, 2009), de Michael Mann – 40 pts
7º Sinédoque Nova York (Synecdoche, New York, EUA, 2008), de Charlie Kaufman – 34 pts
Aquele querido mês de Agosto (idem, Portugal, 2008), de Miguel Mendes – 34 pts.
9º Up- Altas Aventuras (Up, EUA, 2009) de Peter Docter – 30 pts
10º Entre os muros da Escola (Entre les Murs, França, 2008) de Laurent Cantet – 24 pt.

Outras categorias

Melhor Diretor: Alexandr Sokúrov (Alexandra e O Sol)
Melhor Ator: Philippe Seymour Hoffman (Sinédoque , Nova York e Dúvida)
Melhor Atriz: Galina Vishnevskaya (Alexandra)
Melhor Ator Coadjuvante: Christoph Waltz (Bastardos Inglorios)
Melhor Atriz Coadjuvante: Emily Watson (Sinedoque Nova York)
Melhor Montagem: Jeffrey Ford e Paul Rubell (Inimigos Públicos)
Melhor Cenografia: Adam Stockhausen e Mark Friedberg (Sinedoque Nova York); David Wasco (Bastardos Inglório ); Nathan Crowley (Inimigos Públicos); e Jame Murakami (A Troca
Melhor Fotografia: Tom Stern (A Troca)
Melhor Trilha Sonora: Robert Althoff, Paul Aulicino, Paul Cohen e outros ( Bastardos Inglórios
Melhor Canção Original: A.R. Rahman (“Quem quer ser um Milionário”)
Melhor Figurino: Colleen Atwood (Inimigos Públicos)
Melhor Roteiro Original: Quentin Tarantino ( Bastardos Inglórios)
Melhor Roteiro Adaptado: John Patrich Shanley ( Dúvida )
Melhor Efeitos Especiais: Avatar, de James Cameron (Stan Winston Studios)
Melhor Animação: UP – Nas alturas, de Peter Docter
Melhor Documentário: Fellini – eu sou um grande mentiroso, de Damian Pettigrew
Melhor Reprise: “Morte em Veneza" de Luchino Visconti
Prêmio ACCPA - Cinema Brasileiro: "Moscou" de Eduardo Coutinho; e para o diretor Anselmo Duarte, pelo conjunto de sua obra.
Menção especial 1: Marco Antonio Moreira, presidente da ACCPA, pelas atividades de inclusão de novo e e manutenção dos espaços de cinema programados pela Associação.
Menção especial 2 : Fernando Segtovick, pelas ousadias em criar e produzir cinema em Belém/PA.
Menção especial 3: aos membros da ABDeC/PA e à gerência do Curro Velho, pela criação do Cine Clube “Pedro Veriano”, seja pela homenagem, seja por se constituir em mais um espaço de cinema alternativo e formação de platéia.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Melhores do Ano (2009)

Do que vi nos cinemas, neste ano que termina, elegi “Gran Torino” de Clint Eastwood em primeiro lugar. Sensibilizou-me a história do “velho ranzinza” que aprende não só a perdoar como a ajudar o próximo. O diretor-ator parece querer com o seu personagem redimir aquele que lhe deu fama nos idos de 60: Harry,O Sujo(Dirty Harry), detetive que fazia vingar a lei com uma pistola Magnum 44 em punho. Era outro Clint, jovem, atleta, saído dos faroestes italianos de Sergio Leone. E o começo da amizade com o diretor que foi o seu mestre nessa tarefa: Don Siegel. Hoje o que se vê é um homem maduro ciente da experiência ganha com o tempo, ensinando que o melhor é combater a violência e não usar da violência como uma forma de postura.
Em segundo lugar cito “Up”, a animação dos estúdios PIXAR. É o terceiro ano em que a turma dessa fábrica de desenhos animados em 3D invadem o meu campo de preferência. Os filmes dos anos anteriores foram “Wall E”(2008) e “Ratatouille”(2007). Neste exemplar que no ano em curso quase invade o primeiro posto, trata de um velho fabricante de balões que resolve voar literalmente para um recanto paradisíaco sonhado em comum com a esposa, recém-morta. O filme mostra todo o envolvimento do casal, desde que se conhecem até à morte da mulher. E sem falas, Um prodígio de linguagem cinematográfica, inovando o gênero até então restrito às crianças (a animação). Uma beleza de filme.
Em terceiro posto coloquei “Sinédoque em Nova York”, a idéia do cineasta Charlie Kaufmann, um dos mais inovadores que trabalham em Hollywood, que mistura teatro e vida, dizendo em uma edição prodigiosa que um diretor teatral tenta botar no palco as suas experiências pessoais e com isso imagina o seu mundo como parte desse palco (ou vice-versa). È “filme cabeça”, mas, no caso, vale a pena esquentar os miolos para compreende-lo.
“Amantes” segue um rapaz desiludido, único filho de pais que o protegem (ele é empregado do pai), que se aproxima de uma moça a quem o pai faz gosto de se tornar sua esposa, mas, por causa disso, capaz de rebelar-se e tenta achar que a sua eleita é outra mulher, uma vizinha sustentada por um homem casado. O diretor James Gray discute o aspecto "moral burguês"da história e discute com precisão as alternativas para o tipo sair de uma fossa. Ganha campo com bons desempenhos de todo o elenco, em especial de Joaquin Phoenix e Gwynett Paltrow .
“Rio Congelado”, meu 5° lugar, focaliza uma mulher casada, na fronteira dos EUA com o Canadá, a quem o marido deixa só com os dois filhos enquanto busca melhor trabalho. Passando necessidade, ela cede ao convite de uma índia em transportar imigrantes ilegais para o território norte-americano. O drama pessoal conjuga com a geografia ambiente. Tudo bem apresentado com a necesária "cor local", apoiando-se a narrativa em uma senhor atriz: Melissa Leo.
“Quem Quer Ser um Milionário?” foi o Oscar do ano e procede na acepção da luta do garoto indiano pobre que se torna autodidata e compete num programa de TV a ponto de se tornar atração nacional. O filme feito pelo inglês Danny Boyle segue a métrica do que se faz na industria cinematográfica da Índia, a chamada Bollywood(B de Bombain). É tão convincente a “cor local” que a gente custa a acreditar que se trata de uma obra “estrangeira”. Tudo funciona e com o otimismo raro no cinema moderno.E isso está longe de ser defeito como vê certa ala da critica.
“Alexandra”, filme do russo A. Solorov comove com a avó que vai ao campo de batalha ver como está passando o seu neto.
“O Visitante” acompanha um professor universitário que tolera imigrantes ilegais em seu apto em NY e acaba amigo deles através da música. Um exemplo de como a tolerância é importante na construção do bem comum.
“Carregador de Almas” é outro filme de diretor inglês bem aclimatado numa outra cultura (mais ainda do que fez Danny Boyle no seu “...Milionário”). Aqui é um desempregado que cede a um “bico” estranho: levar o corpo de um operário de construção civil, morto em serviço, para a sua casa perdida nas montanhas geladas. A lição da viagem aproxima as pessoas, reflete sobre vida e morte.
E ficou para o fim “Bastardos Inglórios”. Não pela explicitude da violência, mas pelo modo como se faz um glossário de cinema, citando filmes e fatos de forma cômica. Uma revisão gaiata da 2ª.Guerra pelo irreverente cineasta Quentin Tarantino. ([email protected])

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Pré-Natal

Chegando o fim do ano a gente que choca cinema passa em revista o que viu nos 12 meses. Hoje, com o DVD eu vejo a média de 2 filmes por dia(ou noite). Descubro e reviso imagens diversas. Às vezes penso no que disse o meu xará Peter Bogdanovich, mesmo que ele tenha desmentido depois:”os melhores filmes já foram feitos”. O problema é percebido pela sensibilidade de quem vê. Se antes eu pugnava pela grafia e temática hoje eu penso no que me toca. Devo ter percebido o que dizia o Didi (Edwaldo Martins), “o que balança o passarinho”. Tanto que a minha lista dos melhores de 2009 vai se arrastar para chegar a 10 títulos. Reconheço, por exemplo, que o cinema de Alksandr Sokurov tem valor. Mas não me seduz. E, sinceramente, não solto tantos foguetes para “Bastardos Inglórios” de Quentin Tarantino embora reconheça que é o melhor que este cineasta fez (não sou, decididamente, fã do que ele faz). Meus filmes mais queridos deste ano são “Up”, “Gran Torino”,”Rio Congelado”, e “Quem Quer Ser Um Milionário?”, embora dê espaço a “Sinédoque Nova York”, “Amantes” e “O Visitante”. Mas deixem pra lá, ainda não fiz a lista dos meus dez.
Morreu Gene Barry, o ator da primeira versão de “A Guerra dos Mundos”(infinitamente melhor do que a de Steven Spielberg, o foguetório amparado na computação gráfica). Lembro-me dele no esquecido “Cidade Atômica”(Atomic City) onde fazia um cientista nuclear às voltas com o seqüestro do filho por uma facção ligada ao pólo contrário da guerra fria. Gene, nesses papéis e em tanta coisa que fez para a TV, não era ator brilhante. Mas dava conta do recado. No “Guerra...” de Spielberg fez uma aparição meteórica até como uma homenagem ao seu personagem anterior. E seria a sua despedida. Tinha 90 anos.
Desde criança acompanho os lançamentos da Disney em desenho animado 2D. Tanto que o primeiro filme que eu vi foi “Branca de Neve e os 7 Anões”. Hoje quero ver “A Princesa e o Sapo”, embora não goste tanto do traço dos desenhistas, mesmo de Ron Clemens, já um veterano (dele “A Pequena Sereia”) como gostava do que faziam os “9 velhos”, a equipe que desenhou Pinocchio e Cinderella, dando espaço para quem esticou os personagens em “A Bela Adormecida”, afinal o advento de outra estética. Mas ainda prefiro a Disney nesta área da prancheta. O desenho dos estúdios PIXAR, aliado da empresa de Mickey, representam outra coisa. Acho fantásticos “Ratatouille’, “Wall E” e agora “Up”.
Dois filmes de Frank Capra foram programados pela ACCPA para o Natal: “Adorável Vagabundo”, titulo imbecil dado a “Meet John Doe” e “A Felicidade Não Se Compra!”, titulo genial dado a “It’s a Wonderful Life”(o próprio Capra disse que se soubesse antes do nome que deram no Brasil a seu filme mudaria o titulo de “Vida Maravilhosa”). Gosto de um e adoro outro. Gary Cooper é o arquétipo do New Deal de Roosevelt como o ícone adotado pelo povão a partir da vontade de gritar contra os desmandos públicos. A contra-ofensiva dos donos do poder o estraçalha mas, na noite de Natal, ele recupera o prestigio de ser um brilhante herói de ficção. Barbra Syanwyck, que foi namoradinha de Capra antes dele casar com a sua Lou, faz a jornalista que inventa o “John Doe”(equivalente ao nosso Zé Povinho).
Em “A Felicidade...”o herói é Jimmy Stewart, um tipo quixotesco que se vê ausente da vida de tantas pessoas e sabe como elas sentiriam a sua falta. Idéia de Philip Van Doren Stern que deu no mais bem trabalhado dos filmes de Capra. Basta a seqüência em que Stewart sabe do casamento do irmão e por isso de seu destino contrário ao que planejava seguir. Um close do ator em travelling é soberbo. Ele, Stewart, que fez tanto cinema com Hitchcock, disse várias vezes que foi o seu grande momento profissional.
Com essas jóias eu encerro o ano. Não desprezo a chegada de “Avatar” de James Cameron. Mas aí é outra coisa, é cinema-espetáculo. A ele a sua hora. (PV)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

LONGE DESTE INSENSATO MUNDO

O cinema de fim de ano, na área comercial, expande o terreno dos sonhos. Dos bons sonhos, diga-se. Pesadelos fazem a festa o ano inteiro, de fantasmagorias baratas a abordagens irresponsáveis no mundo marginal, com bandidos guinados a heróis em arremedos de uma triste realidade. Este ano, a festa começou com a nova arca, que não é de Noé mas um abrigo de norte-americanos e chineses (não à toa as maiores potencias do planeta na aferição de hoje) , singrando novos mares até que o chão reapareça para começar tudo de novo (“2012”). E prossegue com “Lua Nova” e ainda com “Avatar”.
A escritora Sephenie Meyer está de bunda pra lua desde que concebeu um vampiro estudante no seu livro “Crepúsculo” (Twilight), logo um filme. Ela descobriu que o tempo em que vampiro tinha a cara feia daquele lendário Max Schreck do “Nosferatu” de Murnau, ou de Bela Lugosi (and Christopher Lee), já era. Hoje o dentuça passa de galã e faz uma mocinha, colega dele na escola, morrer de amor por seu charme, a ponto de lhe entregar o pescoço (uma nova forma de encontro erótico). Robert Pattinson (o vampiro galã) e Kristen Stewart (a dona da jugular) reincidem em “Lua Nova” (New Wave) a mostrar que a senhora Meyer usa a lua de parâmetro para as suas histórias. E tanto prova que além do luar ser afrodisíaco para vampiros é a porta aberta para o lobisomem (Taylor Lautner) que substitui o filhote de Dracula no idílio em que, literalmente, o amor é, realmente, de morte.
As menininhas são as grandes fãs das tramas de Meyer. No seu primeiro fim de semana nos cinemas locais, “Lua Nova” teve seus ingressos esgotados. E notem que foi exibido em 4 salas, duas em cada shopping, com cópias dubladas e legendadas.
Para dezembro a festa é “Avatar” de James Cameron. O diretor não filma longa-metragem dramático desde “Titanic”, ainda o campeão de bilheteria mundial (mais um bilhão de dólares ao redor do mundo). Agora ele pretende dar um banho de efeitos especiais numa aventura fantástica locada em um mundo onde os duendes de contos de fadas assinam o ponto de forma fantasmagórica como manda o figurino moderno. Pode-se dizer que o filme leva os sonhadores além dos seus limites. É como ir, na fase REM (o sono profundo) além dos limites da nossa galáxia, quem sabe na borda de um buraco negro, quem sabe ao ponto em que se discute se o universo tem ou não um fim.
Com sonhos astronômicos, não apenas por licença poética, o cinema deste Natal é um verdadeiro presente de Papai Noel para os exibidores. Mesmo que eles paguem por filme 60% da renda na primeira semana de exibições, é negócio. Casas cheias, jovens rindo pras paredes, velhos lembrando que no tempo deles a fantasia ficava com Maria Montez & Jon Hall e Sabu nas mil e uma noites da Universal Pictures, curiosamente a mesma casa de Dracula e Lobisomen, tudo é motivo para festejo.
É o caso de lembrar Shakespeare em “Hamlet”: “morrer, dormir, talvez sonhar....” E nem a propósito: os críticos vão exibir no Olympia, dia 6 de dezembro, a versão de “Hamlet” por Laurence Olivier, o mesmo filme que em 1948 lotou a casa e ganhou estrelas de críticos de então como o poeta Mário Faustino. Mas esse quadrante da programação cinematográfica da cidade é motivo para outra coluna. Primeiro, brindemos os astros de temática, agora além dos astros da interpretação tão cultuados no tempo em que não se precisava ir tão longe para sonhar adiante de uma tela.(Pedro Veriano)

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Feitiço da Lua

Não, não quero tratar do filme de Norman Jewison que promoveu Cher, a atriz. A lua entra no texto por conta de Stephenie Meyer, a escritora que neste Natal vai apagar 36 velas de seu bolo. Li que ela encontrou o seu marido com apenas 4 anos de idade. Mas só o foi rever mocinha, ficando namoro e casamento restritos a 9 meses, ou seja, do “alô” ao altar apenas o tempo de uma gestação. Meyer hoje tem 3 filhos, é formada em inglês e gosta de escrever. Se a colega inglesa J. K. Rowlins imaginou um menino bruxo, ela imaginou um rapaz vampiro. Se outro inglês, J. R. R. Tolkien descreveu um mundo mágico com faunos e fadas, ela foi mais pé no chão jogando os seus heróis numa escola moderna. Esses escritores hoje ganharam mais espaço com o cinema. Tolkien já morreu, mas as duas mulheres estão bem, obrigado. E ricas. Se Harry Potter já encerrou a sua odisséia em romances, é possível que os vampiros e também lobisomens de Meyer já estejam restritos às telas. Seu mais novo livro, “The Host”(aqui “A Hospedeira”) trata de uma invasão de almas, ou seja, um triangulo amoroso composto de energia (ou espírito, como queiram). Meio “sci-fi” meio melô. Vai (também) dar filme.
Mas o feitiço da lua é o seguinte: na saga de “crepúsculo” é o satélite natural quem dá a dica. Em principio está esperando o sol ir embora para embalar os amantes (a mocinha humana e o mocinho filhote de Dracula). Em “Lua Nova” já se sabe que a luz da noite vai gerar o lobisomem que fica no lugar do sanguessuga. E em “Eclipse”, livro que eu não li (como não li os outros), há uma conjugação de criaturas sobrenaturais e astronomia visando a velha tecla de que o amor é passarinho que não se prende em gaiola.
A marchinha de carnaval pós Apollo 11 bradou que “todos eles estão errados,a lua é dos namorados”. Stephenie Meyer endossa. E os namorados podem trocar não apenas beijos, mas dentadas em jugulares. Interessa amar, e a forma de amar ganha corações frescos, muitos iniciantes no tipo de emoção.
O cinema sempre foi um ativador de hormônios. Prossegue, ainda bem. (Pedro Veriano)

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

QUANDO O MUNDO NAUFRAGAR

Descobriu-se água na lua. O cineasta Roland Emmerich perdeu a chance de mandar uma arca, semelhante à de Noé, para o nosso satélite natural. Seria mais interessante do que as balsas anfíbias que ele usa no seu “2012”, um fim de mundo bem maquilado pelo pessoal técnico (um mimo de efeitos especiais) e um glossário dos clichês usados em “disaster movie” desde o tempo do cinema mudo.
O gancho para o roteiro do novo filme do diretor de “O Dia Depois de Amanhã”, do extremamente ridículo “Independence Day” e do curioso “O Principio da Arca de Noé”, é o calendário maia, aquele que aponta o fim dos tempos para uma conjunção planetária a acontecer em dezembro de 2012 (“tá perto, apertem os cintos antes que o piloto suma”). No caso, o núcleo do planeta vai literalmente rachar. As placas tectônicas vão dançar sobre o magma, os oceanos vão invadir as áreas secas, as cidades vão virar deserto ou novos rios, e os humanos, como muitos animais, deixarão de existir.
No Gênesis Deus falou a Noé sobre o dilúvio e ditou como devia ser feita uma arca onde embarcariam as diversas espécies biológicas para salvaguardar a vida até que as águas baixassem. Hoje, com a ciência dando o seu teco, culpa-se a partícula atômica menos conhecida: os neutrinos. Sabe-se que neutrinos, oriundos da energia solar, atravessam tudo, até os nossos corpos. Mas eles só foram detectados, até agora, em ciclotrons, no choque de elétrons. Emmerich diz que os neutrinos vão ajudar na rachadura da crosta terrestre. Ajudados pela posição paralela de planetas. Não importa: a ficção pede que se veja, por exemplo, o Capitólio afundando, a Torre Eiffel mergulhada e empatando a navegação, o Cristo Redentor carioca dividido em pedaços, o Vaticano engolido por uma fenda (Buñuel, bem antes, viu isso desrespeitosamente em “A Idade do Ouro”) e até um monge no Tibet pegando uma onda de mais de dez metros de altura sem tábua para surfar...
É claro que o almanaque de desastres possui uma pequena história sentimental para mover a platéia. O casal formado é um escritor sem sucesso (John Cusack) e uma dona de casa divorciada (Amanda Peet). Ela separou-se dele, cria os filhos dele, o novo marido é pintado de boa praça (o filme sabe que muita gente que paga ingresso vêm de casamentos passados), e na hora h o escritor vive perigos que até mesmo os super-heróis questionam. Mas para o bem de todos e a felicidade geral dos financiadores do projeto, só morre quem está sobrando. Podem tentar adivinhar quem é. E se o mundo como conhecemos literalmente afunda, um novo aparece no último plano sem gaivotas para anunciá-lo como aconteceu com Noé e sua turma.
‘ O cinema já mostrou muitos fins de mundo. Chegou a explodir a Terra (“When Worlds Collide”/ 1952). Mas o cancioneiro popular sai em frente: “-... Se o mundo se acabar amanhã/quero sambar primeiro”. Ou ainda: “-O que se leva desta vida é o que se come, o que se bebe, o que brinca... ai ai”. Isto quer dizer que o mundo interior sai na frente da palavra fim. Todos nós teremos o nosso fim de mundo. O astro azul vai ter o dele, ou quando o sol virar uma anã branca, ou quando um meteoro do tamanho daquele que se chocou com Júpiter cair no Equador. Isto sem falar no esfriamento gradual, na cada vez menor intensidade dos raios solares ou na poluição crescente que ofuscará a energia do “astro rei” e esvaziará a atmosfera como aconteceu com Marte. Essas coisas todas não devem pegar a nossa ou mesmo a próxima geração. Mas a imaginação popular é pródiga e ainda há quem leia o Apocalipse de S. João ao pé da letra, entendo as bestas que anunciarão o “fim dos tempos” como criaturas vivas (ou zumbis). Também há quem pense no julgamento final, quando todos os que viveram reaparecerão e serão julgados. Neste caso não é preciso hecatombe. Basta o peso da “ressurreição da carne” para desequilibrar o planeta. Enfim, fim de mundo é prato que se serve frio. Roland Emmerich sabe disso e faz o seu cardápio. Pela primeira semana de exibição mundial sabe-se que está sendo consumido com avidez. Há gosto pra tudo.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Aconteceu Amanhã

“It Happened Tomorrow”, que por aqui se chamou “O Tempo é uma Ilusão”, é um caso bonito de dois títulos poéticos. O original, agarrado ao argumento, diz do homem que consegue ler o jornal do dia seguinte,portanto sabe das noticias que ainda não foram escritas. O que se deu por aqui joga com a fascinante Teoria das Cordas, ou do apêndice da Relatividade que trata da dimensão tempo como trata das outras dimensões conhecidas. Mas é maravilhoso ao jogar o calendário para cima e afirmar que não vale a pena se apegar contabilizar anos de vida quando a verdade é vida em anos.
O filme que saiu agora em DVD é o melhor que René Clair, o único cineasta a ganhar uma cadeira na Academia Francesa, fez nos EUA. Clair era um sonhador, também um poeta, e são muitos os seus filmes que fogem de um esquema realista propondo espaços oníricos (isto sem falar na sua adesão ao surrealismo quando iniciante em cinema). “Esta Noite É Minha”(Les Belles de la Nuit)é o meu preferido. Mas ainda tem “Entre a Mulher e o Diabo”(La Bauté du Diable), “`A Nós, a Liberdade”(A Nous La Liberte), “O Milhão”(Le Million), “Casei-me com uma Feiticeira(I Married a Witch), “Por Ternura Também se Mata”(Porte de Lilás) e até mesmo o seu canto de cisne, “Le Fête Galante”(As Festas do Coração).
Em “O Tempo é uma Ilusão” Dick Powell é um repórter que recebe de presente de um velho arquivista, na verdade o fantasma do velho arquivista (que ele não sabe se morreu) um exemplar do jornal do dia seguinte. O velho prova, dessa forma, a sua teoria de que o tempo é uma questão de busca em arquivo (uma página é o presente, virando à esquerda é o passado, e, no que se vai colocar à direita é o futuro). A “mágica” empolga e o jornalista pede mais. A oferta é alertada de que não se deve saber o que vai acontecer, e neste caso proporciona ao personagem a leitura da noticia de sua morte.
Na linha de comédia, começando com desmistificação, ou seja, apresentando o herói no dia de suas Bodas de Ouro, discutindo com a mulher que não quer que ele conte a sua história pois acha que todos vão rir, o filme é extremamente agradável, bem ao gosto de Clair nas seqüências curtas, no corte rápido, na alegria do elenco (Linda Darnell é a mocinha).
Eu exibi este filme através do Cine Clube APCC no auditório do Curso de Higiene da Faculdade de Medicina. Atendi ao colega Renato Menezes, fã de Clair. (Pedro Veriano)

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

CONDUTAS DISPARATADAS

O paraense Syn de Conde (Synésio Mariano de Aguiar), primeiro brasileiro a filmar em Hollywood, dizia que no tempo dele “uma fita era feita com um mocinho, uma namorada do mocinho, e um vilão”. Tudo o mais era o relacionamento entre esses tipos. Hoje em um filme como “Código de Conduta”(Law Abiding Citizen)a coisa surge embaralhada. O mocinho sofre a perda da família em um assalto e continua sofrendo quando sabe que um promotor público condena um dos criminosos (o menos culpado) e dá uma pena mínima ao outro(o verdadeiro assassino). A injustiça faz mudar a regra do jogo: o mocinho vira um vingador terrível e passa a ser vilão quando extrapola a sua área de ataque para o sistema judiciário, atacando praticamente a cidade inteira (a bonita Filadélfia).
De Conde não entenderia essa nova regra do jogo. Mas se o roteiro de Kurt Wimmer e Frank Darabont (o último responsável por bons trabalhos como diretor, a exemplo de “A Espera de um Milagre” e “O Nevoeiro”) condena a vingança pessoal, sugerindo que a lei é flexível, mas ainda é o que o cidadão possui para se defender, a direção de F. Gary Gray pisa no acelerador e faz do programa pouco mais de hora e meia de suspense, levando o público a dançar entre atributos de personagens, talvez carreando idéias malsãs em quem já tem mágoas com a lei.
Tudo bem que o cinema pode denunciar arbitrariedades. Mas é preciso ser responsável e quando a trama recai no realismo o bom é seguir uma forma realista e não fantasiar como agora, quando o vingador se transforma em personagem de gibi e emprega uma tecnologia da Marvel Comics na sua missão de vingar os entes queridos.
O diretor parece que só se dá conta da irresponsabilidade temática quando, no final, exibe em close o promotor maroto com um ar de quem está sofrendo algum trauma mesmo na hora de aplaudir a filha menor em um concerto. Ali é como se dissesse: as falhas judiciais provocam mais crimes. (Pedro Veriano)

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

A EDIÇÃO VALEU

Eu confesso que nunca fui admirador do rock. Especialmente do pesado, sem vestígio de melodia. Daí excluir Michael Jackson de minha discoteca. Apesar disso, fui ver “This is It” e reconheço o esforço do coreógrafo-diretor Kenny Ortega. Claro que ele só editou o filme (em película de 35mm) depois da morte do astro. Não acontecesse essa tragédia e os ensaios do show que não se realizou restariam fadados a bônus de DVD.
Ortega fez uma montagem fantástica. Há cortes e inclusões aos borbotões perseguindo cada seqüência. Parece que a técnica se propôs ao ritmo da música ou dança. É o que se chama de “machine gun cut” e eu só vi igual por George Sidney no “Amor à Toda Velocidade” que este diretor fez com Elvys Presley e Ann Margret.
Não tenho duvida de que vi cinema, desde que se conhece cinema como imagem em movimento. E o Ortega foi inovador em não jogar no trabalho o feitio de réquiem. Nem mesmo de tributo a MJ. Podia ter terminado com o artista de braços abertos. Foi além. Congelou a imagem depois que dissolveu qualquer resquício de emoção ligada à morte.
O único óbice, a meu ver, foi aquela menininha de braços abertos na mata quando se colocou o clip sobre ecologia. Desde “Menino de Engenho” de Walter Lima Jr dezenas de crianças rodaram com a câmera de braços erguidos imitando uma comunhão com a natureza. Até o amigo João de Jesus Paes Loureiro fez isso no seu curta “Colégio Sto Antonio”. E a garotinha do filme de MJ é digna de uma framboesa, aquele prêmio para as atrizes ruins. (PV)

domingo, 1 de novembro de 2009

Bastardos Irreverentes

Imaginem as caravelas de Cabral naufragando (todas) antes de Porto Seguro. A piada de que o Brasil sofre por estar descoberto, pegando sol e chuva, desde 1500, ganha suavidade. Diriam que as alterações na História (com H maiúsculo) é coisa de cinema. Pois é coisa de cinema “Gloriosos Bastardos” de Quentin Tarantino. Neste filme de mais de duas horas de projeção em que a 2ª.Guerra Mundial ganha foro de combate entre cow-boys e índios (nada de Little Big Horn mas de faroeste da Republic Pictures) , Adolf Hitler nem chega a se chamuscar com aquela bomba que se viu em “Operação Valquiria”. O “fueher” morre num cinema francês posto que em cinema deve haver participação do que se projeta com o que se olha, ou seja, a ficção é parte intrínseca da realidade (ou como diria Edmond O’Brien em “O Homem que Matou o Facínora”: “quando a lenda é mais forte que a ficção que se imprima a lenda”).
Os bastardos do titulo são mercenários franceses que desejam vingar as vitimas dos invasores de sua terra. Chefiando-os, um norte-americano chamado Aldo e apelidado de Apache, manda que se escalpe os nazistas aprisionados. Bom “índio” na pele de Brad Pitt. Mas a estrela é o vilão, Cel. Hans Landa,(Christophe Waltz)um oficial nazi conhecido como “Caçador de Judeu” . Estereotipado como deve ser num filme de aventuras, faz toda sorte de maldade e ainda quer tirar o corpo fora quando as coisas pendem para o lado contrário ao seu, tentando puxar o saco dos aliados e acabando cedendo a cabeleira para o mocinho.
Tarantino esboça a cada filme a cultura adquirida na locadora de vídeo onde trabalhou, nos “pulp fictions” que leu, no mundo “pop” que hoje vende ingresso até por efeito mimético. Se “Kill Bill” refletia os filmes de caratê, este “Bastardos...” vai à fonte dos “Doze Condenados” e vê a guerra com ironia. E é por aí que o filme cresce e aparece. O humor por trás da violência, a caricatura pondo para escanteio os tipos históricos, a ação bem jogada (até pelos intervalos de muita conversa), tudo contribuiu para que haja cinema na expressão mais simples do termo (“a mentira 24 vezes por segundo”).
OK, um garoto moderninho depois de ver “Bastardos...” escreve na prova de seu colégio que a guerra contra os alemães terminou em 1944 com Adolf Hitler, Josef Goebbles, Martin Borman e outras estrelas do nazismo virando torresmo num incêndio de fitas velhas (aquelas de nitrato) em território francês. Nada de suicídio em Berlim. Tarantino evitou, por exemplo, que Goeblles incitasse a mulher a matar os filhos menores no “bunker”. Aquilo que se viu em “A Queda” é que é ficção. Se a “tia” der nota zero o menino manda que ela se atualize. Afinal, cinema é o melhor dos “tios”. E quando passa na televisão é também baba.
Cultura e curtura é coisa do Cebolinha. (PV)

Meu novo endereço na Internet: [email protected]

terça-feira, 20 de outubro de 2009

ANTI-CINEMA

O sr. Lars Von Trier está precisando urgentemente de uma consulta com o amigo e colega Maiolino Miranda. Depois de fazer onda no seu “dogma”, uma liquidação das conquistas que valeram uma linguagem própria para o cinema, ele ataca no ramo da temática e mexe com o Gênesis, vendo um novo Adão e uma nova Eva, certamente às voltas com o diabo (um dos demônios que atentaram a Linda Blair em “O Exorcista”).
“O Anti-Cristo”(The Anti-Christ/Dinamarca. 2008) quer que se veja a animalização do ser humano, ou melhor, a regressão da espécie humana até chegar a comer capim. Não há uma pontuação “dogmática”, ou seja, daquele jeito que ele queria que ficasse o cinema, sem cortes, sem maquilagens, sem iluminação artificial, sem sem. No tom que se pode dizer normal, apenas em ritmo lento, com muitas seqüências em “ralenti” (câmera lenta), ele focaliza um casal que inicia o filme fazendo sexo e, nessa hora, o seu único filho salta da janela do prédio onde moram. O fato leva a mãe ao delírio. E há um pouco de culpa no pai, que deu um par de botas para o garoto e a mulher pensa que isso o fez se desequilibrar e cair. Diante dessa tragédia, marido e mulher partem para uma cabana, em uma floresta, onde ele, como psicólogo, acha que ela deve se recompor. Pergunto eu: que psicólogo é este que pensa na cura de um caso de angustia com excesso de solidão?
O casal isolado deixa fluir gradativamente comportamentos animalescos. Chega a um ponto em que ela corta o clitóris, lembrando Buñuel cortando um olho em “Um Cão Andaluz”. Isto depois de atirar um bloco de pedra sobre o marido o masturbar a ponto de se ver em primeiríssimo plano uma ejaculação sanguinolenta.
A luta de homem e mulher termina quando ele, o violentado Adão, estrangula a parceira como defesa de sua integridade física. Por sinal que esta integridade física é tratada de forma alegórica, com o sujeito desparafusando uma peça de ferro que transfixou sua perna(e ainda consegue andar).
Friers havia saído de uma crise de depressão ao se lançar na realização do filme. Percebe-se isso, e se perceberia mais se ele não tivesse um passado com obras formalmente insanas. Não é este o cinema que eu aprendi a gostar desde criança. Para mim, cinema-emoção parte do que se expõe de forma a comunicar essa exposição aos meus sentimentos. Forma é a valorização do conteúdo, como um rosto em close num canto da tela e, ao fundo, acontecimentos que dizem razão a esse rosto. Há como valorizar elementos de cinestética à maneira do que fez Orson Welles em “Cidadão Kane”, valorizando a profundidade de campo. Nunca é a rebelião por si, pela experiência gratuita. E se Von Triers era um experimentalista formal hoje é também temático, relendo o Velho Testamento em linguagem blasfêmica, mas sem tocar diretamente no texto bíblico à guisa de paródia como Buñuel fez em “Via Láctea”. Ele apenas mostra o seu inferno interior afiançando um destino que não condiz com um bom tratamento de sua doença. E, sinceramente, ver cinema de doentes não é meu forte, apesar de ter exercido a medicina por longos anos e visto muito filme experimental de laboratório farmacêutico.
“O Anti-Cristo” é, sobretudo, sacal. Não escandaliza porque é muito chato. O espectador comum talvez não se dê para a explicitude de sexo e violência porque já saiu do cinema entediado com a lentidão narrativa.
Bem, há quem goste. O problema é advogar o esse gosto.(Pedro Veriano)

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

HASTA LA VISTA,BABY

O hoje governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger, lançou a frase em espanhol que ficou na cabeça dos que foram ver “O Exterminador do Futuro” das primeiras partes da franquia: “Hasta la vista, baby”. Pois bem, agora, Eric Bana diz isso para Rachel McAdams. Ele é Henry, nascido com a faculdade de se mover no tempo. Ela é Claire, que o conhece em criança quando surgiu no mato perto de sua casa inteiramente nu (pela primeira vez viajar no tempo implica em tirar a roupa). O filme “The Time Traverler’s Wife”, chamado nos paises latinos de “Te Amarei Para Sempre”(conta o fim), é fruto de um romance de Audrey Niffenegger (que eu não conheço), de um roteiro de Bruce Joel Rubin (“Ghost”, “Alucinações do Passado”, “My Life”) e do diretor de “Plano de Vôo”, Robert Schwentke. Esse time joga na cabeça do espectador a história de um livreiro de Chicago que apesar de ser instável no presente, consegue casar e ser pai de uma menina. Esta menina também nasce com o gene de instabilidade temporal. Mas ela ensina ao pai (que não aprende) um modo de não viajar dias afora: “-Cante para ficar”. E a música é “Daisy”, aquela que o computador Hal 9000 canta ai ser desligado pelo astronauta David (Keir Dullea) em “2001, Uma Odisséia no Espaço”.
Para as mocinhas que se babaram com Christophe Reeve amando no passado Jane Seymour em “Somewhere in Time”(Em Algum Lugar do Passado), o novo filme procede. Desta vez a mulher não fica enciumada quando o marido viaja. Ela sabe que ele está noutra época, e o que vem de baixo não lhe atinge (difícil ele vir de cima, ou seja, do futuro). Mas no vai-e-vem temporal chega a época em que a morte pede presença. E numa das aparições Henry está ofegante, com uma bala no lombo. A filha sabe que o pai vai morrer. Mas nem ela nem a mãe sabem que ele pode voltar, como de fato volta em campo aberto, ajudado pela paisagem a dizer que o seu amor é eterno.
Faltou só uma canção para dar ao filme um lugar no peito das/dos românticas sobreviventes.
Stephen Hawkins escreveu que o tempo, como dimensão, é passível de ser percorrido por partículas. H.G.Wells não chutou à toa em “The Time Machine”. Mas nessa idéia de usar o tempo como Cupido eu ainda voto no Tyrone Power de “Jamais te Esquecerei”(The House in the Square), o substituto do avô em certo período da vida deste, conhecendo uma prima (do avô), Ann Blyth, que na sua atualidade (1953) não sabia sequer se havia existido. Quando volta ao seu tempo, o personagem procura indícios da moça (que naturalmente aprendeu a amar). Encontra no cemitério. Ela morrera logo depois que ele a deixou. Este filme, dirigido por Roy Baker, mexeu com a minha memória. Vi 2 vezes, a última no finado Cine Íris(Reduto). Usava o preto e branco no presente e o colorido no passado. Nunca mais vi. Nem em TV, nem em VHS, muito menos em DVD.
O romance em “Te Amarei...” fica diluído não só na idéia como-e principalmente-no tratamento dessa idéia. Os tipos ganham com atores bons, mas perdem no fracionamento da ação e nos furos de continuidade. Misturando “sci-fi” e melodrama, resta um híbrido. Tudo bem que é sempre curioso. Mas não emociona. E a emoção é solicitada pelo texto. A mão pesada do diretor é que entornou o caldo. (Pedro Veriano)

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

ET SEM TELFONE

Os discos voadores estão se contaminando com as maracutaias terrestres. Em “Distrito 9”(District 9) um deles cai em Joannensburgo e derrama um bando de crustáceos bípedes, logo segregados em um gueto a quem os habitantes do lugar chamam de Distrito 9. Mesmo assim, há medo de um dia a nave espacial voltar e dar a sua de “guerra dos mundos”(talvez por isso não se veja nenhum telefone por perto). Quem se apossa da matéria é o telejornalista Van der Werwe, que se insere no meio dos alienígenas e na ânsia de se comunicar acha um deles chamado Christopher Johnson (isso mesmo!), um camarão que fala inglês, faz um engenhoso capaz de subverter a situação, e “contamina” o personagem de nome alemão que acaba virando um meio-cá-meio-lá.
Na história sul-africana há o Distrito 6, do tempo do “apartheid”. O nome Wickus van der Werwe chegou a ser popular antes de Mandela assumir o governo. Talvez espelhe um alemão deslocado do finado 3° Reich. A graça do roteiro ainda catapulta outros detalhes. Mas a coisa não chega a se rotular de comédia. No fim o barulho é de blockbuster standard. E não se diz que o preconceito é plenamente vencido ou vence. Peter Jackson na produção e o amigo dele Neill Blomkamp na direção não esgotam a idéia. Por sinal que eles iam fazer outro filme:”Halo”, do videogame bem vendido. Faltou financiamento. E surgiu este engodo de superprodução, ou seja, filme aparentemente caro quando não é, e de sátira política, onde a profundidade se esconde num pseudodocumentário sem muita graça.
Eu não gostei, embora tenha achado que o tema pedia coisa boa. Mas não é a primeira nem será a última vez que se joga no vaso sanitário boa idéia. Por isso os canos andam entupidos na industria cinematográfica internacional. (PV);

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

PIADAS DE QUINTAL

Uma das piadas machistas mais infames é aquela que diz que o maior erro da natureza foi botar um cérebro em cima de uma vagina. Se esta faltou no cardápio de “A Verdade Nua e Crua”(The Naked Thru) outras apareceram para avacalhar as evas. Tudo em vão, pois o avacalhador acaba se apaixonando pela colega que o combate e no fim das contas selam o filme com o beijo de sempre.
Syn de Conde me dizia que cinema, pelo menos o que ele fazia, é feito do encontro de um rapaz com uma moça, do namoro entre eles e de um vilão que aparece para atrapalhar esse namoro. Agora, com a liberdade de expressão, o, rapaz encontra garota e vão logo transar. Gerard Butler como o apresentador de TV extremamente desbocado,não chega a isso com Katherine Heigl, mas não deixa que ela esquente a cama de um rival. A novidade é que o ciúme deste Cyrano sem nariz grande é que ele patrocina o namoro da amiga para depois tirar o sarro.
Há muito eu não via um filme com desempenhos tão ruins. Miss Heigl surge como uma Sonia Mamede ou Consuelo Leandro das velhas chanchadas nacionais. Só Butler,na postura de um sujeito grosso,ajusta-se no papel. E por aí se tira a qualidade do produto dirigido por Mike Chadway, melhor saído em “Legalmente Loura”.
Haja saco!

E O OSCAR ?

E O OSCAR ?

Vi “Salvo Geral” o nosso candidato a candidato ao Oscar de filme estrangeiro. No tempo em que o Brasil toma banho de otimismo, sediando as próximas Copa do Mundo e Olimpiadas, seria até previsível que a premiação norte-americana chegasse. Mas se eu conheço a história dessa premiação, creio, sinceramente, que o filme de Sergio Rezende vai sobrar. Oxalá esteja dando uma de mau profeta. Mas não creio que os acadêmicos de Hollywood aplaudam uma espécie de “duro de matar paulista”.
O filme revela um equilíbrio artesanal de quem já possui cacife de cinema-industria. Tem explosões de carros, corridas desenfreadas, planos de multidão, coisas que dão trabalho e exigem segunda unidade de direção. E nem se fala na técnica, no esmero fotográfico, no audível som direto, na edição que sabe dar ritmo à narrativa. O problema formal esbarra apenas nos diálogos improváveis (eu sei disso, pois fui médico de presídio durante 9 anos), num roteiro sectário que pinta bons e maus de forma bem distinta embora em posições “politicamente incorretas”, e na preocupação primordial desse roteiro para com a ação, baixando a densidade temática.
Mas é no recheio do bolo que está o problema. Os filmes sobre presos geralmente optam pela deificação destes em relação ao aparato policial. Fato internacional, a lembrar, a titulo de exemplo, “Alcatraz” de Don Siegel e “A Colina dos Homens Perdidos” de Sidney Lumet. Nem vou ao “Candiru” de Hector Babenco, onde o enfoque de uma rebelião ganha foros jornalísticos. Aqui, em “Salve Geral”, inspirado no levante da PCC em 2006, uma guerra que abalou S. Paulo, o gancho é a mãe recém-viuva que vê o único filho detido e tudo faz para libertá-lo. Nesse tudo está o contato com a cadeia, a vez de advogada que ela é e nunca exerceu, um atendimento ao sexo que não parece muito crível (ela resiste fumar, beber, cheirar droga mas não resiste a um prisioneiro que, em tese, seria contatado pelo prestigio que possui na prisão), e um modo de ficar com o dinheiro da gang interna (do presídio) e com isso pagar a liberdade do garoto molhando (melhor diria “afogando”) as mãos dos guardas.
Os detentos são vistos como pessoas esquecidas da sociedade e dos governantes. Numa hora um deles consegue sair da cela (com uma facilidade impressionante, pois não se vê um só guarda nos corredores anexos) e fazer um discurso sobre movimento revolucionário. Noutra, os chefes do PCC, que no filme ganha o nome de “partido”, é contatado pela direção do presídio que com isso pretende formular um pacto de não agressão (nessa altura a cidade está pegando fogo). Como essa gente “conferencia” com as autoridades, esbanjando ironia (para não dizer cinismo), é o xeque-mate na reposição dos heróis e vilões (bandidos são heróis, policiais são vilões). O fator tempo é desprezado na constante alternância de seqüências em que se vê coquetéis molotov explodindo nos bairros paulistanos e o “papo” com os chefões se arrastando em mesa.A conclusão que se tira, até pelo fato do acordo dar certo, é que realmente os homens atrás das grades possuem razões que a razão (ou a lei) desconhece. Completando o quadro, a mãe consegue libertar o filho, embora não se saiba até quando. O filme termina com o abraço materno, a lágrima filial, os dois seguindo de carro estrada afora. E o currículo deles já engrossa com duas mortes para ele e uma para ela.
Há desempenhos que impressionam. Denise Weinberg como uma advogada corrupta que arma a revolta dos presos (ou ajuda a isso) aponta bem a sua autoridade nas falas impressivas e na máscara correspondente. Quando ela ataca a amiga (Andréa Beltrão esforçada num papel esquemático), sabendo que esta deseja apenas libertar o filho, não hesitando em se apropriar da verba que daria outro andamento ao plano dos revoltosos, a cena é de filme de terror norte-americano (ela passando um garrote na comparsa e só não consumindo o enforcamento porque esta tira do bolso um revolver e atira). Por sinal eu saio do parêntesis e pergunto: como uma modesta professora de piano, aparentemente pacifica, sabe manejar arma com tanta desenvoltura ? Como uma pistola fica engatilhada no bolso da saia de quem, em tese, não é de atirar ?
O roteiro está cheio de licenças dramáticas. Mas tudo é perdoado quando a clareza do objetivo é bem defendida. Não é o caso. No geral, “Salve Geral” é um “divertissement”, um “blockbuster” falado em português. Com isso eu penso que os sócios da Academia de Hollywood vão cair de amores por concorrentes mais exóticos, mais distantes dos modelos que eles usam e abusam. Se premiarem um exemplar latino de uma formula anglo-saxã as coisas estão mesmo mudadas. Será que o filme vai faturar prêmio porque é a da terra governada por Lula, o nosso Polyano(ou Frank Capra)?....

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

SINDROME DE COTARD

Primeiro é preciso que se saiba que diabos é “sinédoque”. Diz-se de uma coisa que se compara a outra, ou que lembre outra. No caso do filme “Sinédoque Nova York”, o personagem principal, Caden Cotard(Philip Seimour Hoffman) faz uma “Big Apple” dentro de um teatro em que ele pretende encenar a “peça de sua vida”.
Depois há uma explicação para o nome do herói da história: Cotard, médico francês do século XIX, pesquisou o caso de um cliente que se dizia morto. Por se julgar morto, o homem se sentia em estado de putrefação.
Explicando isso se pode entrar no universo do cineasta Charlie Kaufman que, neste novo (2008) filme estréia na direção (antes ele foi apenas roteirista, e brilhante quase sempre, a provar “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”e “Quero Ser John Malkovich’).
Primeiro se conhece mr. Cotard. Antes de ele acordar vê-se uma sala escura, um desenho animado passando na TV, e o despertar de um hipocondríaco tipico. Quem conhece um deles sabe como esse tipo de pessoa, ou doente(pode-se dizer), faz a sua manhã. São diversas pílulas aguardando vez para seguirem goela adentro. Mas no caso focalizado, a hipocondria já está sendo contagiosa. A pequena filha de Cotard, chamada Olive (Sadie Goldstein), está impressionada porque o “seu cocô está verde”. A mãe minimiza a impressão. Mas logo o pai dá um grito. Ao se barbear bate no espelho e cai um vidro sobre sua testa produzindo um ferimento. A filha se impressiona com o sangue derramado. No caso, a caminho do hospital onde o pai ganhará alguns pontos na testa, ela diz que “não quer ter sangue”. O medo se define como a aversão à idéia de morrer. E isto passa para os atores no teatro onde Cotard trabalha.A idéia fixa de que a morte é inexorável passa num discurso do encenador para os intérpretes e lembra para o cinéfilo o Woody Allen de tantas vezes, especialmente de “Hannah e Suas Irmãs” quando a fobia de um câncer no cérebro leva o personagem a peregrinar por consultórios médicos e depois, ao ver uma tomografia limpa, festejar na rua para, em seguida, pensar que o diagnostico é prematuro, que “um dia a doença pode ser revelada”.
Morte e vida pontuam o filme, mas as primeiras seqüências realistas cedem espaço aos devaneios de Cotard a partir da chance de encenar o que deseja posto que recebeu um prêmio (em dinheiro) por seu trabalho anterior (criticado como um remake de peça antiga). Daí em diante o que acontece no plano real é detalhe de um ensaio para o palco. Sabe-se que a mulher dele, Adele (Catherine Keener), partiu com a filha e sabe-se que ele procurou sexo com a bilheteira Hazel (Samantha Morton) e em seguida com a jovem atriz Claire (Michelle Williams). Também se sabe que procurou a psicóloga Madeleine (Hope Davis), que os pais morreram (primeiro o pai, depois a mãe, de câncer), e que arranjou um ator para fazer o papel principal na peça, na verdade o seu “alter ego”.
É interessante que esta mescla de realidade e ficção se une numa pontuação em que uma ajuda à outra. Por exemplo, a casa que Hazel compra está sempre em chamas. Ninguém se importa com isso e até a corretora fala de incêndio como uma hipótese viável a qualquer morador. O fogo marcaria a mulher sensual que depois se junta a um outro tipo – e ainda se vê novamente só, no processo de tempo que se usa na feitura de peça e que apenas sintetiza a realidade (Cotard não envelhece tanto na vida como envelhece no palco).
Vendo o filme, e numa primeira vez certamente perdendo-se no labirinto de informações sobre o que se passa na mente do autor, a gente pensa que, perto do final, Kaufmann sai do esquema felliniano (há muito de “Oito e Meio” de Fellini) e põe um corifeu a “contar” o que se passa. Mas o filme não termina aí, desmentindo a totalidade da síntese falada. Há mais planos, como os da mulher cadavérica que mora no edifício para onde se refugiou Adele e vive dando um recado dela, como, e finalmente, o “velho” Cotard reencontrando Hazel (que pouco envelhece) e pedindo licença para botar a cabeça em seu colo. Esta conformação no carinho que não conservou em tempo hábil poderia fazer cair a cortina. Mas não se faz um recurso teatral para encerrar um processo de linguagem muito mais cinematográfico. O plano médio do casal (Cotard e Hazel) vai esmaecendo (fade in) e a tela ficando totalmente branca para receber os créditos finais.
Charlie Kaufman já se sabia ser um dos mais criativos roteiristas do cinema moderno. Agora também diretor. Um atestado de maturidade em um filme difícil que tenta ver dentro de uma pessoa até com efeito mimético. Seria aquele “raio-X da alma” que tanta gente quis fazer. Palmas à tentativa (Pedro Veriano)

domingo, 20 de setembro de 2009

KYESLOWSKI E O SEU "AMADOR"

Saiu em DVD um filme raro do polonês Krystoff Kieslowsky (1941-1996): “Amator”(1979), aqui batizado de “Cinemaniaco”(nome dado à uma comédia de Harold Lloyd). Uma feliz síntese do que pensava o cineasta no inicio de carreira. O herói, Filip Mosz (Jerzy Stuhr) compra uma câmera de 8 mm para filmar a primeira filha, nascida sob uma expectativa que o leva ao pranto. Mas o uso da câmera acaba fascinando-o mais que a garotinha. Logo está filmando funcionários da empresa onde trabalha, documentando reuniões e com isso conhecendo pessoas ligadas a cinema (inclusive uma bela produtora com quem chega a ter um breve caso). O “hobby” leva à destruição de seu casamento. A mulher mostra-se decisiva e sintetiza o drama ao demonstrar que ele, optando pela cinematografia, deixou de ser o marido fiel, humilde, carinhoso, feliz por ter a vida que escolheu em comum acordo com ela.
Há muitas reviravoltas na história, mas, no fim, o sofrido Filip filma o seu próprio rosto e diz quem era, o que desejava, o que acabou perdendo.
Será que Kieslowski era um desses simples operários da Polônia comunista que experimentou ser uma estrela da burguesia e se arrependeu? Como o roteiro explica, a arte não vale a paz de espírito, como se uma coisa só existisse sem a outra.
Basicamente o tema força um engano. Engano de quem vive o drama focalizado, engano de quem coloca em xeque um talento a emergir da mansidão que patrocina o anonimato. Neste caso, surge em primeiro plano, a idéia do operário benquisto que peca ao tentar ser patrão. E nem é preciso ir muito longe: o personagem filma um colega, o mais antigo de seu trabalho, homem modesto, deficiente físico, que numa entrevista conta que se sente feliz em estar com a esposa e sair de casa uma vez por semana para ir a um cinema ou a um bar. A filmagem leva à dispensa do velho.O patrão não quer que se divulgue detalhe da empresa ou de seus empregados.
O argumento é frágil, embora trate o cinema como uma fascinação. Quem filma em Super 8 mm passa a filmar em 16mm e pode chegar ao 35mm se continuar a gostar do que faz. Não é o caso em pauta, mas foi de Kieslowski como foi de Zanussi, cineasta que aparece numa ponta como convidado para uma exibição num sindicato. Zanussi em “Iluminação” tocou na mesma ferida quando seguiu um estudante inteligente, apto a ser um mestre em física, mas relegado a um emprego de escritório para poder manter a família que cedo constituiu. Para contar o seu drama o diretor foi buscar Santo Agostinho ao falar dos “iluminados”. Em “Amator” o caminho é o mesmo, talvez de forma mais explicita, com a luz apagando por conta de um dilema ético (ou moral).(Pedro Veriano)

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

DOIS CENTENÁRIOS MALDITOS

Muita gente falou do centenário de Joseph Losey, o diretor de cinema americano que a Inglaterra herdou depois do “maccarthismo” (ele fugiu da raia, pois seria preso como comuna-e não era). Mas ninguém badala a mesma idade de Marcel Carné e Elia Kazan. O primeiro, depois de ter feito obras-primas como “Os Visitantes da Noite” (Les Visiteurs du Soir/1941) e “O Boulevard do Crime” (Les Enfants du Paradis/1943) foi detratado pela turma da “nouvelle vague” como “um velho metido a jovem”. Isto porque Carné retratou a juventude francesa do pós-guerra (a 2ª. Mundial) no seu “Os Trapaceiros”(Les Tricheurs/1950). Aliás, os nouvellevaguistas crucificaram não só Carné, mas Jean Dellanoy e Claude Autant-Lara. Parece até coisa de gente daqui...
Kazan manchou o currículo delatando colegas para a Comissão de Atividades Anti-Americanas presidida pelo senador Joe McCarthy, o nome que entrou para as enciclopédias como sinônimo de intolerância, fomentando uma “caça aos comunistas”, tão ridícula como o nome que recebeu dos espectadores na época (anos 50): “caça às bruxas”.
Mas os que pregaram Kazan não fizeram o mesmo com outro dedo-duro: Walt Disney. Ninguém jogou na fogueira Mickey e Pluto, e muitos que atacaram Kazan levaram os filhos para passear na Disneylândia.
Nos seus últimos dias de vida. Kazan recebeu um Oscar honorário. Foi à cerimônia de entrega. Uma parte da platéia (a maioria) o aplaudiu de pé. Outra tentou uma vaia. Mas a História existe e não pode ser ignorada. A história de um cinema de bom nível quando isso era coisa de poucos produtores (como Stanley Kramer).
OK, Kazan gostava muito mais de teatro e ensinou muitos meninos do Actor’s Studio. Mas nenhum livro de história do cinema que se preze ignora “Sindicato de Ladrões” (On the Waterfront), “Uma Rua Chamada Pecado”(A Streetcar Named Desire), “Boneca de Carne”(Babby Doll) ou “Vidas Amargas”(East of Éden).
Eu acrescento aos melhores filmes de Kazan coisas hoje esquecidas como “Pânico nas Ruas”(Panic in the Streets) , “Um Rosto na Multidão”(A Face in the Crowd) e o brilhante e autobiográfico “Terra do Sonho Distante(América, América).
Os espaços da ACCPA devem abrir para esses dois ícones da cinematografia. Desconhecê-los é seguir o papo furado de alguns membros da “nouvelle vague” que achavam o cinema uma arte esclerosada e pensavam em refazê-lo como uma criatura do Dr. Frankenstein. (Pedro Veriano)

domingo, 13 de setembro de 2009

CINEMA ALTERNATIVO EM PERIGO

Sábado passado fui ao Cine Libero Luxardo(Centur) desejoso de ver o filme premiado (e de estréia) ao ator-cineasta Matheus Natchergaele: “A Festa da Menina Morta”. Quando ia entrando com o meu querido fusca na garagem do prédio um funcionário, delicadamente, perguntou-me se eu ia para o cinema. Disse que sim. E ele disse que não. O cinema estava suspenso por conta de um desarranjo no projetor. Não é a primeira vez que isto acontece. Penso que no meu caso é a terceira. O cinema alternativo, especialmente o que á alimentado pelo poder publico, é de extrema fragilidade.Quando poderia ser o contrário: o mais forte, ganhando gordura com o subsidio.
Soube depois do que estava (ou está) acontecendo. O projetor do Libero, um dos melhores de Belém, está precisando de manutenção. Pequenos estremecimentos indicam que a máquina pode quebrar a qualquer momento. Peças como a cruz de malta indicam o fim do aparelho, pois são tão caras que pedem um novo. A melhor opção é parar antes que tudo se acabe.
E agora a parte tragicômica da historia: o Centur tinha, no meu tempo de programador do cinema de lá, um senhor técnico: o Carlos Lobo.Ele se formou ali, aprendendo num projetor ruim, colocado no espaço não se sabe como, pois até o Secretário de Cultura da época, Acyr Castro, espantou-se quando foi visitar o esqueleto do cinema (ia ser inaugurado dentro em breve) e deparou com a maquinaria em fase de instalação. Manejar esse “Hercules” (nome do projetor) era, de fato, uma tarefa hercúlea. Mas o Carlos dava conta. E deu, depois,com as mudanças para melhor. Hoje conhecia a cabine da sala como sua própria casa. Não precisava ir buscar técnico na conchichina para endireitar um pequeno defeito. Acontece que o Carlos não fez concurso para funcionário (sua categoria não existe em editais) e, como interino, saiu da folha de pagamento da instituição. Contratá-lo por serviços prestados seria a formula. E assim foi feito até recentemente. Agora não tem disso. Não se paga mais uma pessoa que saiba tratar de projetores. Eles que se lixem.
E aí? Como vai ficar o Libero?
Do lado da Prefeitura (o Centur é por conta do governo do Estado), há outro prisma surrealista. O senhor prefeito não quer que se cobre ingresso do cinema Olympia, a casa quase centenária que ele, justiça seja feita, salvou da vontade do dono do prédio (ainda esperando ser tombado) em tirá-la do mapa. Mas se o salão serve para “n” coisas, a parte de cinema fica devendo ao DVD projetado e aos filmes de embaixadas que cedam cópias em 35 mm. Com outro agravante: essas cópias, obviamente, chegam do sul por via área. Carecem de pagamento de frete. E a PMB não paga isso. Então quem paga? Por outro lado, o “datashow” ou projetor de DVD, é muito precário (estava no Memorial dos Povos). Para o espaço seria necessário um que tenha no mínimo 6 a 8 mil lumens (brilho). O que projeta discos, atualmente, deixa sombras na telona, exigindo que se exiba preferencialmente títulos em preto e branco, pois o colorido esmaece de tal forma que se vê apenas...fantasmas.
O Olympia podia ter uma renda (com ingresso como o Libero, a 5 reais, e além disso, bomboniére terceirizada, que desse uma ajuda à boa vontade do prefeito). De graça precisa de verba para manter uma boa programação.
O Cine Estação, que é também do Estado, passou a fazer apenas um programa de cinema por mês no Teatro Maria Sylvia Nunes. Antes eram 3 programas. Uma pena, pois o espaço e o projetor convidam, especialmente em sessões que Belém perdeu como a matinal de domingo.
Quem ainda programa filmes para os cinemas subvencionados é gente que entende do assunto. O contacto com as distribuidoras de filmes existe e é feito com o necessário conhecimento dos produtos (quem não sabe come gato por lebre). Se o poder público olhasse um pouquinho mais para esses espaços a platéia estaria de parabéns. Cinema “de arte” não é artigo de luxo como alguns pensam. É apêndice do ensino, da cultura, do que se faz em escolas. Formar platéia para bons filmes é educar. Portanto, gastar dinheiro com cinema não é jogar fora. Mesmo, nos casos em pauta, é salvar patrimônio. Deixar as coisas flutuarem sem uma bóia é antever naufrágio. E depois do naufrágio haja dinheiro para fazer outros barcos. (Pedro Veriano).

domingo, 6 de setembro de 2009

O REI DO MELODRAMA

Engraçado: no tempo em que a critica nacional era capitaneada por Moniz Vianna (“O Correio da Manhã”) ele e colegas mais velhos (Alex Viany) ou mais novos (Sérgio Augusto, Paulo Perdigão), abominavam os melodramas dirigidos pelo alemão Douglas Sirk. O último de uma série, “Imitação da Vida”(Imitation of Life) refilmagem em 1959 de um romance de Fannie Hust (o filme anterior, de 1935, era dirigido por Joseph M. Stahl e tinha Claudette Colbert no papel que depois foi de Lana Turner), foi odiado. Eu fiz coro. Quando via a coisa no Olímpia, quase dou vaia no fim, quando aparece o funeral da mãe negra da mocinha branca (que a rejeitava). Mas o tempo mudou tudo. O cineasta Rainer Werner Fassbinder, um dos cabeças da nova onda alemã, disse que Sirk era um gênio e “Imitação...” a prova disso. Seguiram-se ovações internacionais no mesmo tom. Hoje, aplaude-se tudo que Sirk fez na Universal para o produtor Ross Hunter, inclusive os títulos interpretados pelo apático Rock Hudson (lembro de um debate no Colégio Santa Rosa em que as alunas bombardearam Orlando Costa que exibia “Amanhã Será Tarde Demais” de Leonide Moguy, dizendo que o melhor era “Sublime Obsessão”na versão de Sirk).
Quem está certo? O tempo ou os velhos críticos?
Nem tanto ao mar nem tanto a terra. O melodrama é um gênero. Criticar certos filmes por serem melodramas é criticar a base, o argumento. Naturalmente que o melodrama se alimenta das emoções despertadas. Visa as lágrimas do espectador. E força a barra para que isso aconteça. Mas entre alguns, especialmente nos de Sirk, cabe a excelência de uma história factível, de dores que podem ou não se só de cotovelo. O caso de “Chamas que não se Apagam” (There’s Allways Tomorrow), a meu ver o melhor do diretor e um titulo que eu sempre defendi.
Bárbara Stanwyck faz a velha namorada de Fred McMurray que reaparece quando ele está casado, com filhos adolescentes, mas prisioneiro de uma família que pouco se dá aos seus anseios. É uma carta a mais no jogo de interesses domésticos. Por isso, a volta da amiga, agora uma mulher independente e rica, é um choque. As tais chamas do titulo em português, a meu ver um raro caso de melhor do que o original (“Há sempre um amanhã”).
Não é um enredo, ou um melodrama em que um lar é desfeito por uma lembrança. No fim tudo volta ao que era antes. Nada muda. Mas para mostrar isso em cinema do melhor há um plano em que McMurray aparece de costas no fim de uma mesa e um brinquedo, um pequeno robô, sai andando de onde ele está até às proximidades da câmera. Vai andando até cair. Nada mais se mexe. A metáfora é clara, mas a exposição muito inteligente. Mais adiante ele ouve o ruído de um avião. A velha amada está indo embora.
Sirk sabia fazer chorar em cinema. Se hoje se reconhece, muito bem. Custou a se entender que as “fitas lacrimosas” são válidas.(Pedro Veriano).

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Hip Up

A turma da PIXAR entrou numa sinuca de bico: depois de “Ratatouille” e “Wall E” ficou na obrigação de só fazer obras-primas. “Up”(2009) não chega a tanto mas não deixa de ser um grande filme.
O senhor Carl Fredricksen é um viúvo que sonha em realizar o desejo da mulher, viajando para um lugar na América do Sul onde existe uma grande cachoeira emoldurando um ambiente paradisíaco. Quando o filme começa há outro assunto em foco: um explorador que é desmascarado quando mostra o esqueleto de um animal antediluviano e todo mundo pensa que aquilo foi montado de forma imaginosa sem corresponder à realidade. Nessa época Carl é um garoto que vê em gente como esse explorador, um super-herói. Logo em seguida surge uma menina que o persegue Menina assumindo o tipo pentelho. Ela provoca desastres para rir do colega. Mas as malvadezas se transformam em provas de amor. Sem uma só palavra exibe-se o namoro, o casamento, a vida a dois, a impossibilidade de a madame Fredricksen engravidar, as economias para a viagem dos sonhos serem sempre quebradas para atender alguma emergência, e a doença e morte da companheira.
Trabalhando a vida toda com balões de gás, o velho Carl, ao ver-se no dilema de ou vender sua residência ou ir para um asilo, infla mais de mil desses balões e com isso ergue a sua velha casa para seguir, de forma inusitada, à floresta sul-americana.
Russel, um pequeno escoteiro que persegue Carl para uma tarefa beneficente, acaba seguindo com o viajante “aéreo”.
Bem, não é bom contar todo o filme. Certo é que desse ponto em diante cabe a concessão de aventura para sustentar a garotada na sala de projeção. Mesmo assim uma derivação edificante. O filme prega o valor da amizade, a necessidade da caridade, o desapego às coisas materiais, a imagem nem sempre condizente de um ídolo, enfim, tudo o que justifica a humanidade (ou justificaria).
Há um momento muito bonito: quando a casa voadora parece fugir do controle de seu dono ele diz ao amiguinho: “- É apenas uma casa”. E a gente sabe o quanto custou tudo aquilo para ele e sua companheira inesquecível.
Em técnica volta o primor do pessoal da PIXAR. Também na escolha da trilha sonora. O que deixa o filme a um degrau menos do irrequieto Wall-E é o confronto com aquele explorador do inicio, retomado na mata onde pretende levar em seu dirigível a criatura pré-histórica viva para esfregar na cara de seus detratores. Uma vaidade acima da pesquisa cientifica.
Mas deixem pra lá. “Up” empina como um dos melhores filmes deste ano. O campeão na sua área. De novo PIXAR. (Pedro Veriano)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Tudo Muito Normal

Lord Cigano (José Wilker) em “Bye Bye Brasil”, diz, de uma feita, que “sacanagem tem que ser bem administrada”. O conselho não é seguido por José Alvarenga Jr(diretor), Alexandre Machado e Fernanda Young(roteirista) deste “Normais 2” ora em cartaz nacional (virada de agosto para setembro).
O plot é o casal Rui (Luiz Fernando Guimarães) e Vani (Fernanda Torres) percebendo que não fazem sexo regularmente. Ela concebe um gráfico, com colegas, e conclui que depois de 13 anos a atração sexual reduziu-se a décimos. Está,como diz a piada, candidata à teia de aranha vaginal. Com este gancho, a idéia persegue um possível “ménage à trois”. É noite e os pombinhos passeiam de carro pela cariocolândia atrás de quem tope ir para a cama com eles. É claro que surgem tipos diversos e absurdos. Poucos engraçados. A pornochanchada dos anos 1970 é evocada sem Helena Ramos ou David Cardoso. Isto pode ser até vantagem para “Normais 2”, replay da série global e de um filme que atraiu mais de 300 mil espectadores. Porém falta molho no prato. Não é só exibindo bandalheira que se faz boa piada. O principal é a originalidade. E que há de novo em sexo a três que não se realiza porque a terceira figura devia estar muito mais no manicômio?
Ri pouco. Uma vez foi da banheira espumante em que o casal, com uma hostess ficam presos e sufocados pela quantidade de espuma. E de vinhetas como a de Vani empurrar um enfermeiro e este empurrar uma paciente pela janela do hospital. Também há alguma piada na confusão com o idioma francês, onde “ménage” lembra “homenagem” e “savez-vous” lembra “rendez-vous”. Mas é preciso estar de bom humor para mexer os lábios. Por sinal que o bom humor deve nortear até a ida ao cinema.
Claro que o cineminha caboclo tenta achar o seu publico como os americanos fazem com as suas “American Pie”. Se depender do meu voto, “Normais 2” ganha de sola a torta gringa de meninos virgens nauseantes. Mas eu não creio que o filme chegue a derrubar a cifra do primeiro. Hoje o pessoal que vai ao cinema não quer só ouvir piada cabeluda: quer coisa nova, quer imaginação. E qualquer tipo de novidade passa longe dessa “normalidade” televisiva. (Pedro Veriano).,

De Porre Com a Vida




Taí: “Se Beber Não Case”(The Hagover) é uma rara comédia surrealista. No apartamento de luxo do Ceasar Palace em Las Vegas, posto de repouso de 4 rapazes em ritmo de farra por conta do próximo casamento de um deles,resta o caos (desarrumação) e detalhes que deliciariam Buñuel: um tigre no banheiro (e como a turma da cerveja poderia mijar ?), um bebê no chão e uma galinha passeando. Tudo isso e o sumiço do noivo, em tese o dono da bola.
O filme de Todd Philips é um hiato agradável na imbecilidade da comédia romântica tradicional, ou melhor, a que se está fazendo depois do “American Pie”. Boas piadas, bons intérpretes, direção que poda os pontos mortos, e uma surpreendente guinada para o absurdo, da galinha que não se explica a que diabos veio, do tigre do peso-pesado Mike Tyson (que pela primeira vez banca ator de cinema) e até de um asiático bom de porrada que se diz seqüestrador do noivo que sumiu (e a noiva está em contagem regressiva no altar armado em sua casa).
Rir não é muito fácil. A comédia é um gênero que merece muito respeito posto que é difícil de fazer. Claro que há pastelões, chanchadas, pornochanchadas, coisas baixas para os pólos da vida: os ricos que riem à toa e os pobres que riem de sua própria desgraça (como dizia Luis Delfino no “Tudo Azul” de Moacyr Fenelon). O caso de !Se Beber não Case”, ou “A Ressaca”, traz inventiva. Por isso vale enfrentar o transito desta Belém cada vez mais curta para tanta máquina volante e ir ao cinema. Ah sim: e enfrentar as filas para adquirir ingresso e para entrar na sala objetivada. Sinal dos tempos. (Pedro Veriano)

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

E Que Tudo o Mais Vá Pro Inferno

O que mete medo em cinema? Cara feia? Acordes súbitos para acordar os dorminhocos? Hemorragias? Fantasmas? Monstros? Tudo isso e mais uns trocados? Pode ser. Do bando de filme do gênero que eu vi em mais de meio século de cinemania, o único que me deixou insone foi “O Solar das Almas Perdidas”(The Uninvited/EUA,1943) de Lewis Allen.Revendo-o na televisão acho que teve algum problema colateral na sessão em que eu estive (no meu cinema caseiro, o Bandeirante, por volta de 1951 ou 52). Nunca esqueci a seqüência em que Ray Milland enfrenta um espírito que se materializa, atirando na direção dele um castiçal com cerca de 3 velas. A nuvem no topo de uma escada vai deixando que se veja a forma física da madrasta da mocinha, Rosalind Russel.
Nunca me espantei com os filhotes de Dracula, os descendentes da “Criatura” do dr. Frankenstein ou poltergeists diversos, mesmo aqueles taradinhos que transavam com Bárbara Hershey em um filme interessante de Sidney Furie (“Enigma do Mal”/The Entity). O melhor terror cinematográfico, tenho em conta, é o que faz rir. Pelo menos a mim. Por isso gostei de “A Noite do Demônio” de Sam Raimi. Aquele movimento louco de câmera a chegar numa cabana onde os mortos-vivos chegam para pegar Bruce Campbell era hilário. E os defuntos móveis, caindo aos pedaços, imprimiam um tom bizarro, uma farra no macabro.
Raimi, um fã desse gênero de filme, tirou uma folga da pré-produção de “Homem Aranha 4” para fazer este “Arrasta-me Para o Inferno” ora em cartaz. Quase acerta o tom. A cara da bruxa que vê negado o seu pedido de financiamento para continuar pagando na hipoteca de sua casa é digna dos zombies de “A Noite...”. O problema é que o roteiro de Raimi e seu mano Ivan possui uma espécie de moral de fabula. A bancária que nega o pedido da velha é a vilã e a vitima. Vilã porque nega auxílio à uma pobre velhinha desamparada. Vitima porque sofre a maldição de acabar no inferno do titulo quando o “happy end” está perfeitamente arrumado.
O que se quer é brincar com o medo. Mas nem o medo nem a brincadeira são eficazes. Tudo é muito temperado, muito ajeitado para assustar os assustáveis. Nunca é um filme daqueles que um amigo definia como o que “arrepia pentelho de recém-nascido”. Mas é o bastante para dissipar o sono de quem está aproveitando a sala refrigerada do cinema para uma soneca. Resumindo: não dá para rir nem para chorar.
Ah sim: os acordes são constantes. Uma sinfonia de tons agudos que castigam os tímpanos. Para uma brincadeira de férias é o que basta. (Pedro Veriano)

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Quem é o Pai do Cinema ?

Nos livros de história da cinematografia atribui-se a paternidade do cinema aos inventores do cinematographo, o aparelho que projeta imagens em movimento: Louis e Auguste Lumiére. Mas nos mesmos livros aprende-se que foi David Wark Griffith o primeiro a explorar os efeitos da linguagem cinematográfica, ou seja, quem valorizou cada plano e cada movimento de câmera. Fica a escolha do freguês: pai é quem concebeu ou pai é quem criou?
De Griffith em diante a narrativa por parte de um filme aninhou-se no inconsciente coletivo e não tardou a que se raciocinasse em termos de cinema. É mais ou menos assim: quando você está na sala escura à mercê das imagens projetadas começa a perceber a ação de forma que o objeto mais perto da tela seja o de maior interesse e o mais distante o contemplativo. Também percebe, sem chegar a ver que o mexer da objetiva joga a ação de um lado para outro, como a trama é conduzida, tudo porque se corta e se emenda as seqüências dentro de uma linha que conduza o que se vai contar (isto se chama montagem e é a alma do negócio).
Hoje interessa saber como o cinema em seus mais de cem anos, viu a figura paterna. Não os seus pais, mas o de outros em dramas e comédias.
Eu custei a chegar a um consenso e naturalmente tive de apelar para a memória. Foi melhor do que clicar o google para ler artigos de “n” pessoas sobre o assunto.
Em “O Garoto” Carlitos (Charles Chaplin) é o pai adotivo de Jackie Cooper. Dedica-se a ele inteiramente e chora ao reencontrá-lo depois de uma aventura que por pouco não os separava de vez. O público tende a chorar com ele.
Nas duas versões de “The Way of All Flesh” (a mais conhecida chamou-se no Brasil “Seu Único Pecado”), o pai faz-se de morto para não envergonhar a família e, mendigando, vai ver o filho (de longe) na noite de Natal.
O pai (Lamberto Maggiorani) persegue pelas ruas de Roma o ladrão de sua bicicleta, sempre acompanhado do filho(Enzo Staiola).(“Ladrões de Bicicletas” de Vittorio De Sica).
O velho pai (Victor Moore) é separado da mãe (Beullah Bondi) pelos filhos que dizem não poder abrigar o casal quando eles são despejados de sua casa (“A Cruz dos Anos” de Leo McCarey filmado depois pelo cinema brasileiro como “Em Família”, de Paulo Porto).
Clifton Webb é o pai rigoroso, mas adorado pelos filhos(“Nossa Vida com Papai”).
James Stewart é o pai de dois casais de crianças que rezam por seu destino numa noite de Natal (“A Felicidade Não Se Compra”, de Frank Capra).
Lionell Barrymore é o patriarca de uma família que faz o que quer em “Do Mundo Nada Se Leva”, também de Capra.
Em “A Sombra da Forca” de Joseph Losey o pai(Michael Redgrave) deixa se matar para livrar o filho de uma sentença de morte.
Para salvar o filho picado por um escorpião, Pedro Armendariz caminha desesperado com a esposa e o menino ferido atrás de socorro (“A Perola”)
A filha chora ao constatar de que o pai é um “vigarista” a ponto de chegar a falsificar remédio (“A Trapaça” de Fellini).
Dois pais sertanejos que migram com a familia: o de “Vidas Secas” que Nelson P dos Santos fez do livro de Graciliano Ramos e o de “O Caminho das Nuvens” de Vicente Amorim.
O pai nazista que sofre quando o filho vai para o campo de extermínio seguindo um amiguinho que conhece pensando que se trata de um garoto morador em uma fazenda (“O Menino do Pijama Listrado”)
E Gepetto, o pai de Pinocchio que chega a ser almoço de baleia? E o ogro Shrek que ensina os filhos a tomar banho de lama ? E o pai do príncipe que briga com o seu funcionário para que Cinderela atraia seu filho e seja boa mãe ?
Cada gênero cinematográfico apresenta em sua história um papel de pai. Certamente de mãe é maior, mas há muito pai projetado a cativar corações e mentes. A todos a homenagem pela data, reforçando a tese de que o pai muitas vezes é quem inicia o filho no fascínio que é ver cinema. (Pedro Veriano)

sábado, 1 de agosto de 2009

CINEMA ENDIABRADO

Há uma anedota em que uma jovem, ao sair de uma festa alta hora da noite, é assediada por um cavalheiro bem vestido que se identifica como o diabo. Ele pede que a moça não resista a um estupro. Ela atende com medo dele. Quando termina a transa ele pergunta a idade dela. Ela, trêmula, diz que é 16 anos. Ele continua se vestindo e, mudando o tom da voz: “-Com 16 anos você ainda acredita em diabo?”
Essa história parece ser a favorita pelos produtores, distribuidores e exibidores de filmes em que a formula se alimenta de sexo e violência. Eles advogam que o mundo é assim, que o mundo é cão, que Augusto dos Anjos estava coberto de razão ao declamar: “Acostuma-te à lama que te espera/ o homem que nesta terra miserável vive entre feras/ sente inevitável necessidade de também ser fera.” Mas ninguém em sã consciência quer deixar este mundo. E não se diga que as pessoas são visceralmente masoquistas. A dor incomoda. Se não incomodasse não se tomava analgésico.
Não vejo arte em filmes que exibem, por exemplo, em “ralenti” (câmera lenta) massacres diversos. Aquilo que Sam Peckinpah mostrou em “Meu Ódio Será Tua Herança”(The Wild Bunch) é uma pirotécnica da maldade, uma ode à fera interior das pessoas (Joseph Losey tem um filme sobre psicanálise que se chama no original “The Sleeping Tiger”, ou “O Tigre Adormecido”. Mas estas figuras animalescas liberadas do inconsciente é patologia).
Hoje a moda é explicitar o que antes era sugerido. Na sugestão, a violência mascara-se de artifícios galantes que merecem analise. O sexo também. O que é mais erótico: sugerir, como antes se mostrava um casal encaminhando-se para um contacto intimo ou uma exposição detalhada do coito? Um olhar de um bom ator ou boa atriz diz mais do bem e do mal interior. É preciso que se tenha em conta que o cinema não é um monologo para uma espécie de Robinson Crusoe. E é preciso que se tenha em conta a inteligência de quem vê cinema. Mesmo sabendo que as cabeças pensantes das platéias divergem não só sob o ponto de vista cultural como fisiológico. Subestimar o endereço da obra de arte acaba sendo uma atitude pedante.
Odeio a censura, mas desprezo os filmes que se acomodam no registro puro e simples do que de pior possa existir no gênero humano. (Pedro Veriano)

quinta-feira, 30 de julho de 2009

CINEMA E OUTRAS COISAS MAIS

Um filme, de uma peça teatral que eu não vi, chamou-se “Boeing Boeing”. Eu lembro agora com um novo blog editado pelo meu neto Olavo : “blog blog”. Sim, já tinha um “bloguinho” que me parecia a Conceição do samba: “se subiu ninguém sabe, ninguém viu”. Agora espero ter mais leitores. Mas se não tiver não faz mal. O jornalista Joaquim Antunes costumava dizer que escrevia para os seus 7 leitores. Eu não penso nem na conta de mentiroso. Escrevo porque gosto de escrever. E levo na gozação o que para muita gente é sério. Sou da escola do cineasta italiano Dino Risi: “rindo castiga-se mais”. Ou do velho conselho à titulo de receita: “rir é o melhor remédio”. Não é disparate: há remédios que doem, e os efeitos colaterais em muita gente que eu conheço não estão para mentir.
Começo o novo blog tratando da minha droga: o cinema. E neste julho moribundo a programação comercial do gênero assume outro tipo de droga. Depois de “Inimigos Públicos”, afinal um filme de gangster caro, bem feito, mas sem muito a dizer além do que se disse no tempo de James Cagney, só “Rio Congelado”, aquela pequena jóia encimada pela cara sofrida da atriz Melissa Leo, ela a cantar que o rio canadense não é sua rua mas o seu sofrimento, abandonada pelo marido, criando como pode dois meninos, obrigada pela necessidade a contrabandear gente para Nova York. O filme foi o que de melhor eu vi fora de casa este mês. Dentro de casa vejo a média de dois DVDs por dia. Revejo coisas que deixaram saudades como Irene Dunne atropelada ao ir se encontrar com Charles Boyer no Empire State Building segundo Leo McCarey (“Duas Vidas”/Love Affair) e descubro suspense(mesmo) como “O Vizinho” (Lakeview Terrace) de Neil Labute. Há muito na Fox Vídeo ou no meu arquivo. É o meu abastecimento. Sem ele já estaria mordendo cachorro. E agora nem isso: um dente safado está me lembrando que canal não é só o de Suez ou do Panamá, este último visitado no inicio do mês por duas filhas e suas famílias.
Bem, por hoje é só. Experimento este blog que a minha Luzia ajudou a dar a luz.Mas creiam-me: não vou abandonar o outro. (PV)

QUEM SURFOU NA NOVA ONDA?

Há 50 anos os críticos da revista “Cahiers du Cinema” passaram da teoria à prática. À frente do grupo os jovens François Truffaut, Jean Luc Godard e Claude Chabrol. Dos três, só um achava que o cinema estava na pré-história, que os filmes feitos até então seriam como “pinturas rupestres”, que se devia mudar a linguagem para não assumir a pecha de “vovozinha contadora de histórias”: Godard. O que ele passou a fazer foi definido pelo critico brasileiro Antônio Moniz Vianna, morto este ano, da seguinte maneira: “Os atores estão sentados adiante de uma mesa, cada um numa cabeceira, e a câmera não dá um plano geral, mas um plano médio, ou mesmo close, do meio da mesa”. Seria como fazem hoje nos DVDs de filmes scope em que se subtrai o processo panorâmico da gravação cortando as laterais na adaptação para a tela cheia (full screen). Quem comprou o DVD de “Gigi”(Vincente Minnelli, 1959) sabe disso: Maurice Chevalier canta e é respondido por Hermione Gingold, cada um em uma extremidade de uma mesa. A câmera faz um estranho campo-e-contra-campo, virando-se para um e para outro da forma que não existia no filme original (era um plano fixo).
Godard pensa filmando e derrama erudição nisso. Truffaut e Chabrol não seguiram essa trilha. Truiffaut foi eclético, trabalhando com elegância a linguagem tradicional ora em roteiros originais ora (e na maioria das vezes) adaptando obras literárias. Chabrol, admirador de Hitchcock (como Truffaut) fez e faz um cinema de fã, um cinema na linha de seus ídolos (Hitchcock à frente). Outros críticos que conseguiram chegar à prática não fizeram da “onda” (vague) um tusiname. Foram comedidos como Louis Malle, inventivos como Alain Resnais, ou literários com algum pedantismo como Eric Rohmer o mais velho da turma.
É certo que a narrativa cinematográfica mudou depois das “nouvelles vagues”: não só francesa como alemã, inglesa e até brasileira. Hoje já não se gasta filme explicando coisas. Por exemplo: se ma gente vê uma pessoa abrir uma porta o plano seguinte não é obrigatoriamente o desta pessoa do outro lado da porta. Pode-se ver um outro espaço e um outro tempo. O espectador engole o seu raciocínio indutivo e passa a imaginar o que aquilo quer dizer. Isso virou moda até em Hollywood. Mas é certo que a maioria das vezes emprega de forma gratuita a inovação. No recente “Nelly”(À Ce Soir/2004) de Laure Duthilleul, não se sabe de chofre quem são mesmo algumas das figuras em cena (a enfermeira, o médico, o morto). E se a intenção foi fazer uma comédia sobre um funeral inusitado ou se um drama em torno do estresse que a morte de uma pessoa causa na família.
Há uma frase dita por Burt Lancaster em “O Leopardo” de Visconti não sei se tirada de Lampedusa, o autor do original: “É preciso mudar para continuar tudo como está”. Seria a idéia de Truffaut e Chabrol, mas não a de Godard. Interessante é que ele, Godard, dedica o seu filme de estréia, “Acossado” (À Bout de Souffle) aos acomodadíssimos filmes C da Monogram Pictures, empresa norte-americana que produzia a ralé da industria (faroestes e policiais de uma hora de projeção). Nada mais diferente do estilo que o francês passou a usar. Seria como se você reescrevesse um livro denso a seu critério, um modo muito diferente do que estava escrito.
Atualmente, em especial no âmbito juvenil (que não se mede por idade), os critérios de um cinema com outra métrica são benquistos. Os jovens surfam bem na onda que visa destruir velhos castelos. Mas ainda se pede um mínimo de atração consciente, ou seja, de uma base para raciocinar o que o cineasta quis dizer fazendo assim e assado. Se não for desse jeito, um filme rodado com a câmera de cabeça para baixo é tido como uma nova forma de visualizar o mundo caótico em que se vive. Aliás, há um fato interessante nessa linha: contam que havia uma seqüência desfocada num filme do cinema-novo brasileiro feito por uma celebridade do movimento. O autor recebeu a noticia do laboratório, por telefone, e como não tinha grana para refilmar mandou que revelassem assim mesmo. A critica exultou com a propriedade do desfoque. E não vamos longe: em uma de minhas brincadeiras de cinema, “O Deus de Ouro”(1952), uma tomada com filme vencido deu em uma escuridão não planejada com lampejos de luz no meio do quadro. Era uma cena de safári, com os personagens atravessando um rio. Na projeção me perguntaram como eu fiz “os relâmpagos”.
Cinema é bom desde que comunique. Chacrinianamente ele se trumbica se não for assim. Ou melhor: fica restrito a um grupo que imagina outro filme.(Pedro Veriano)