sábado, 1 de agosto de 2009

CINEMA ENDIABRADO

Há uma anedota em que uma jovem, ao sair de uma festa alta hora da noite, é assediada por um cavalheiro bem vestido que se identifica como o diabo. Ele pede que a moça não resista a um estupro. Ela atende com medo dele. Quando termina a transa ele pergunta a idade dela. Ela, trêmula, diz que é 16 anos. Ele continua se vestindo e, mudando o tom da voz: “-Com 16 anos você ainda acredita em diabo?”
Essa história parece ser a favorita pelos produtores, distribuidores e exibidores de filmes em que a formula se alimenta de sexo e violência. Eles advogam que o mundo é assim, que o mundo é cão, que Augusto dos Anjos estava coberto de razão ao declamar: “Acostuma-te à lama que te espera/ o homem que nesta terra miserável vive entre feras/ sente inevitável necessidade de também ser fera.” Mas ninguém em sã consciência quer deixar este mundo. E não se diga que as pessoas são visceralmente masoquistas. A dor incomoda. Se não incomodasse não se tomava analgésico.
Não vejo arte em filmes que exibem, por exemplo, em “ralenti” (câmera lenta) massacres diversos. Aquilo que Sam Peckinpah mostrou em “Meu Ódio Será Tua Herança”(The Wild Bunch) é uma pirotécnica da maldade, uma ode à fera interior das pessoas (Joseph Losey tem um filme sobre psicanálise que se chama no original “The Sleeping Tiger”, ou “O Tigre Adormecido”. Mas estas figuras animalescas liberadas do inconsciente é patologia).
Hoje a moda é explicitar o que antes era sugerido. Na sugestão, a violência mascara-se de artifícios galantes que merecem analise. O sexo também. O que é mais erótico: sugerir, como antes se mostrava um casal encaminhando-se para um contacto intimo ou uma exposição detalhada do coito? Um olhar de um bom ator ou boa atriz diz mais do bem e do mal interior. É preciso que se tenha em conta que o cinema não é um monologo para uma espécie de Robinson Crusoe. E é preciso que se tenha em conta a inteligência de quem vê cinema. Mesmo sabendo que as cabeças pensantes das platéias divergem não só sob o ponto de vista cultural como fisiológico. Subestimar o endereço da obra de arte acaba sendo uma atitude pedante.
Odeio a censura, mas desprezo os filmes que se acomodam no registro puro e simples do que de pior possa existir no gênero humano. (Pedro Veriano)

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