sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Roubando Sonhos

Desde que Freud escreveu sobre os sonhos começaram divagações em torno de como a mente humana se porta quando a pessoa dorme. Shakespeare divagava em “Hamlet”: “morrer, dormir, talvez sonhar”.E no cinema os sonhos abriram portas para o surrealismo, como em “Quando Fala o Coração”(Spellbund) de Hitchcock, ou em tantos outros exemplos onde o ato de sonhar rima com o fato de ter medo ou o de bem sentir certas fantasias.
“A Origem”(Incepction/EUA,2010) de Christopher Nolan ambiciona uma invasão do sonho de alguém por deliberada atitude de outrem. Mais explicitamente: um ladrão, Crobb (Leonardo di Caprio), rouba idéias de pessoas que as moldam quando dormem. E com esta facilidade ele chega ao ponto de tentar inserir uma idéia nova na cabeça de um rico herdeiro com o objetivo de seu patrocinador auferir lucro com esta operação. O problema, no caso, é que ele, o ladrão de sonhos, tem seus próprios devaneios e ultimamente esses devaneios partem do suicídio da esposa, atormentada depois dele inserir sugestões na vida dela através dos sonhos, como se tentasse manipulá-la a seu gosto. Com isso, a imagem da morta persegue as suas operações e chega até mesmo ser a vilã da história.
O filme é o primeiro com roteiro dom próprio diretor, conhecido por dois títulos ligados de alguma forma ao tema (“Amnésia” e “Insônia”) e um vislumbrando o intimo de um herói (“Batman, O Cavaleiro das Trevas”). Não é nada fácil simplificar idéias que mexem com a transitoriedade das próprias idéias. Alguém fala durante a narrativa que “não é fácil interagir no sonho alheio”. Portanto, a pretensão de “A Origem” esbarra no seu trajeto. O próprio Freud não foi muito explicito ao analisar a sua mais famosa paciente (ou ele próprio numa auto-análise). Afinal, como se dimensionar o que surge dos neurônios ou o que venha a ser guiado por uma força maior (e o cristão diria, a vontade divina)?
O filme é muito inteligente, mas surge complexo quando opta pela noção de videogame, querendo dizer que nos sonhos as pessoas extrapolam uma violência intrínseca, o falado “tigre adormecido”da psicanálise. E esta complexidade não é de todo resolvida. Dificilmente uma platéia sai da sala de projeção “entendendo tudo o que viu”. E isso não quer dizer simplesmente hermetismo. É mais insuficiência de dados, uma hesitação entre o fantástico e o clinico banhada em espetáculo de ação.
“Origem”é novidade em parte.A sua lição vem de Pascal, ou seja, “O coração tem razões que a própria razão desconhece”. No caso do herói-vilão com taquicardia.

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