segunda-feira, 20 de junho de 2011

Memória Erudita

“Meia Noite em Paris”(Midnight in Paris/2011)é um Woody Allen europeu que lembra o nova-iorquino de “A Rosa Púrpura do Cairo”. A diferença é geográfica desde que se considere o tempo fora dessa geografia. Aqui a viagem pelo passado leva um tipo de agora pela Paris dos anos 20 com direito a um beliscão mais atrás para se ver Toulouse Lautrec pintando o can can.
No filme um escritor (o chato Owen Wilson) saturado da mediocridade de sua mulher, aproveita a estada em Paris e viaja de carro pela cidade de quase um século atrás. Vê gente que lhe inspirou intelectualmente: F. Scott Fitzgerald e sua Zelda, T.S.Elliot, Ernst Hemmingway, Gertrude Stein,Josephine Baker, os pintores Picasso, Gaugin e Dali,o compositor Cole Porter(e a musica dele aumenta o encanto do filme)_ sobrando uma fala para lembrar James Joyce. Nesse mergulho temporal há um romance com uma das amantes de Picasso(intervenção da atriz Marion Cottilard) e uma mudança de estado civil na volta ao presente para ficar morando em Paris (Gabrille/Lea Seydoux). Tudo para dizer que a capital francesa ainda é o paraíso dos intelectuais, a substituição perfeita da Manhattam que Allen amou e que acabou revisando quando percebeu que só lhe entendem na França (onde seus filmes se pagam).
Citações eruditas pulam mais pelas falas do que pelas imagens (o desconto de um prólogo com vistas turísticas da capital francesa). Mas o que se ouve (mais do que se vê)é bastante divertido para se achar que o filme é curto. Não olhei para o relógio no meio da sessão (o que é raro atualmente). Engraçado é que o roteiro, escrito em 2006, é de Allen para Allen. O personagem de Owen Wilson seria seu. A gente sente isso. E Wilson fisicamente é o anti-Woody Allen. Um desafio que não compromete porque a imaginação do comediante-autor mostra-se saudável. E se as citações englobam os artistas que as pessoas inteligentes conhecem,com maior ênfase para os de língua inglesa, faltando apenas René Clair. WA deve ter visto “Les Bellles de la Nuit”,o belo filme de Clair, onde uma viagem de jipe pelo tempo mostra que o saudosista sempre se manifesta elogiando o que passou. Até o homem das cavernas.
Carla Bruni, a mulher do presidente francês, faz uma ponta como guia de museu. Até aí a homenagem ao país. E com um detalhe que escapa dos guias turísticos: Paris é mais romântica com chuva. Essa é nova.

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