segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Dois Falam de Um

DIDI , PARA OS ÍNTIMOS
Luzia Miranda Álvares
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A Família Miranda (Abaetetuba e Igarapé Miri) tinha o dia 3 de outubro como uma data importante: aniversário da matriarca Gertrudes de Miranda Maciel (ou Mocinha) que ainda sob o peso da adolescência, teve que cuidar dos oito irmãos órfãos de pai e mãe falecidos numa distância bem curta – entre seis meses um do outro. Essa data se manteve também como marco das eleições, porque os meus familiares tinham sempre nas veias uma forte tendência para a luta política ou de divulgação dos seus candidatos. A pé, pelas ruas da cidade, ou de canoas a remo, pelos rios do interior, minha mãe ou meu pai nos incluiam nas suas “caminhadas” distribuindo cédulas eleitorais dos seus escolhidos, em busca de votos, culminando na data-símbolo festejada nas próprias cantigas criadas para o dia. Outra menção é para o navio que nos trazia até Belém, o “3 de outubro”, um “gaiola” de luxo que circulava através da linha do Tocantins, incluindo Abaetetuba onde aportava também.
A mudança de ambiente, da cidade pequena para a “grande” e de status civil, de solteira para casada, me fez inserir, no calendário de efemérides, outro marco para a data: o aniversário do Edwaldo Martins, jornalista que foi se incluindo no nosso meio de amigos de cinema e permaneceu entre os “mais chegados” (como referia) até sua “passagem” para outro plano de vida. Já conhecido do Pedro Veriano ainda solteiro, frequentava o “Cine Bandeirante”, mas, desse tempo não guardo lembrança. No avanço das mudanças, entre as sessões de cinema e os banhos de piscina com o mesmo grupo, a cada dia ele marcava a sua presença nas feijoadas e churrascos dominicais. E para ficar. Era também o tempo do barzinho onde nos reuniamos (o Corujão, o Garrafão, a Tonga, a Pop’s) para curtir um final de sábado, após uma sessão de cinema, ou os festejos coletivos de um aniversário (cada qual paga o seu e do aniversariante), ao tradiconal dia de Natal quando ele se transformava porque eleito na ocasião em secretário efetivo da então APCC para anotar o lugar dos filmes que cada sócio-eleitor relacionava nas suas listas. Sua presença era significativa e importante nessa função. Mas esse procedimento não era uma simples anotação do Didi: era acompanhada de uma frase chistosa quando o tal filme escolhido por um de nós era, para ele, “muito cerebral” ou se caia no desinteresse pelo tal diretor que ele achava sem pendores para a arte ou fora de seu gosto. Esse era o momento-chave de nossos encontros que hoje não temos mais, pois, o Didi era especial nas suas frases mordazes sobre as escolhas e seus eleitores. O que mais ele impinimava era na contagem dos valores, se era para os dez títulos ou dez lugares.
Da “Vila de Satanaz” (a casa dele na Braz de Aguiar), à Cova dos Monstros (a garagem de casa, onde ficava o “Bandeirante”) ou na “Casa do Pavor” (casa da Lana Gomes da Silva), a turma (mais chegada) da APPC, àquela época em que se reunia, vivia de graça os encantos do Didi. De suas viagens ao exterior, ao chegar, ele fazia a roda para contar as novidades e os lugares “de cinema” que tinha visitado. Sua emoção: curtiu um fim de tarde na Piazza de São Marcos, em Veneza, com uma orquestra tocando “Summertime”, a exemplo do filme de David Lean que ele amava. Falava da “Mariazinha” (Marilyn Monroe) de quem tinha um poster gigante à porta de seu apartamento. Distribuia cartazes de filmes de Chaplin e de outros, àquela altura, muito difíceis de encontrar no Brasil. Foi ele quem me deu a noticia da morte do ator-diretor-autor, com a voz embargada e sabendo que Chaplin era um dos meus mais queridos.
Um grande débito devo ao Didi: ele avalizou, junto a Rômulo Maiorana, a minha escolha para escrever sobre cinema, em “O Liberal”, no final de outubro de 1972, coluna batizada por RM como “Panorama”. Ele foi comigo na visita ao “italiano” e fez minha apresentação. Esse foi o meu primeiro emprego público. Desafio para mim e para o que eu sabia. Mas isso não invalidou sua insistência comigo para que o PV, a quem ele tinha uma especial admiração pelo estilo de crítica que este escrevia, assumisse a coluna após o fechamento de “A Província...”. Isso nunca foi em desrespeito pelo meu saber (dizia ele, “tu já tens a UFPA...”), mas pelo que ele considerava como um lugar cativo do seu amigo, no espaço da crítica de cinema em Belém.
Hoje, 3 de outubro, Pedro e eu resolvemos fazer-lhe uma homenagem, registrando seu “leva-e-traz” sobre cinema no tempo de sua presença entre nós, ele que hoje está “encantado”, no dizer de Drumond.
Beijo grande, Didi. (Luzia Miranda Álvares)

LEMBRANDO O DIDI

Na minha adolescência 3 de outubro era o dia de eleição e o nome de um gaiola, que fazia a linha do Tocantins (e por onde eu pretendia encontrar a namorada Luzia, acabando por me contentar com um teco-teco). Mas não demorei a acrescentar outra característica: era o aniversário do Edwaldo Martins, um garoto que montava uma página sobre cinema no jornal “A Província do Pará” competindo com que a sua colega Regina Pesce que fazia no outro jornal da cidade,”Folha do Norte”.
Edwaldo, mais tarde ganhando de minha família o diminutivo carinhoso de Didi, apareceu no meu Cine Bandeirante, a garagem que exibia filmes em 16mm, numa noite em que passava o neo-realista “Um Domingo de Verão”.filme italiano de Luciano Emmer. Lembro de que nesse tempo havia uma tumultuada greve de ônibus e alguna veículos tinham sido incendiados pelos grevistas. Mesmo assim o novo espectador viu a sessão e saiu corajosamente a pé no rumo de sua casa noutra rua.
Anos mais tarde eu era o critico de cinema de “A Província...” e tomava parte na Associação Paraense de Críticos Cinematográficos, nome pomposo criado por um grupo de amigos. Nos finais de ano o Didi era convocado não só para a escolha dos 10 melhores filmes do ano como para secretariar a sessão que acabava sendo uma festa natalina.
Por muito tempo Edwaldo contava os pontos dos filmes, resmungando, fazendo piadas do que se achava extraordinário e ele, muito prático, concluiu que aqueles títulos cabeça “não balançavam o passarinho”.
E não ficou por aí. Didi respondia presente em reuniões familiares, até em um réveillon com direito a banho de piscina, nesse ano trocando uma de suas reuniões sociais já que na época havia assumido a coluna especifica do jornal (e mais tarde de outro jornal, “O Liberal”).
Este amigo de muitas horas morreu cedo, desprezando os perigos de sua diabetes. Não preciso escrever que deixou uma cratera na lua de tantos. A última vez que o vi foi em seu apartamento, já com seqüelas da enfermidade. O cinema e o colunismo social abraçavam-se nas ironias do jornalista de vocação. Conseguiu concretizar sonhos como visitar a Piazza de s Marcos em Veneza e pedir para a orquestra de lá tocar “Summertime” como no filme de David Lean que ele adorava. E visiitou mais de duas vezes os EUA indo à calçada da fama, vendo as marcas dos artistas que desde criança admirava, chegando a ter a receber a “visita” de um furacão para lhe lembrar filme de John Ford.
Coerente sempre, seu filme predileto era “Mompti” com Romy Schneider e Alain Delon. Na primeira escolha dos críticos em grupo votou em “Rocco e seus irmãos” de Visconti. Dizia sempre que se devia votar, no fim de ano, em filmes exibidos nas salas comerciais e não nos cineclubes. Gostava de ver estrelas, ora...
Em cada 3 de outubro a lembrança de Edwaldo Martins fica mais forte. Não que ele se cultuasse. Era muito simples. Mas os amigos somavam muitos e não deixavam de prestigiar o seu natalício.
Neste calendário de saudade cito o Didi no espaço que me cabe. Ele manteve uma secção chamada “A Cara de Belém”. Botou muita gente mas esqueceu a dele, um bragantino que amava a capital do Pará. (Pedro Veriano)

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