sexta-feira, 26 de abril de 2013
O Silva
Na 4ª Feira, 24 de abril, perguntei ao Marco Antonio sobre o Silva. Doente, prestes a completar 90 anos, o amigo distribuidor de filmes era um relicário que eu sabia encaminhado, como escreveu Getulio Vargas, da vida para a história. Pois o Silva se foi logo no dia seguinte. Lembro-me do muito que ele deixou marcado nas andanças pelo mundo do cinema regional. O começo dessa lembrança passa por uma conversa que eu e Luzia tivemos com ele no antigo Pará Boliche, ocasião em que contou a sua participação na 2ª.Guerra Mundial como soldado da Força Expedicionária Brasileira(FEB) em campanha na Itália. “-A gente andava engatinhada para trás até chegar à casamata onde estava o comandante. Chovia bala e o comandante pensava que era ação dos aliados. Dissemos que na frente só tinha alemão. Ele foi conosco, de gatinho, para um lugar seguro.”
Em 1945,de volta à sua Recife, o praça Antonio enterrou explicitamente a farda. Casou e passou a funcionar como vendedor (distribuidor) de filmes da Columbia Pictures. Seu primeiro trabalho: lançar nos cinemas do nordeste e norte o famoso “Gilda” com Rita Hayworth (a imagem dela no papel chegou a figurar na bomba atirada em Hiroshima).
Surgiu o “Silva da Columbia”. Os exibidores tinham medo dele. Rigoroso, lutou muito com os dirigentes da Empresa Cardoso & Lopes de Belém (cinemas Moderno, Independência. Vitória)para que eles exibisse, de per si os episódios dos muitos seriados de aventuras. Victor e Arthur Cardoso faziam de tudo para passar a exibir o seriado de uma só vez quando corresse no circuito a última série(dois episódios).
Nos anos 50ª a Columbia havia deixado de programar para Severiano Ribeiro e em Belém só atuava nas salas da Cardoso & Lopes. Na época o estúdio ganhava o patamar das grandes produtoras, mesmo assim com um grande acervo de filmes B e C. O método de venda era “da produção do ano”com os títulos mais pretensiosos encabeçando uma lista que seria alugada. Só os títulos “da cabeça” eram negociados em percentual sobre a renda na bilheteria.
Quando eu me meti a passar filme, Silva foi logo contratado. O amigo José Maria Lopes, que tinha sido fiscal de distribuidoras, apresentou-me a ele. De uma feita eu o experimentei Meu cunhado havia perdido o certificado de censura de uma copia em 16mm alugada para o cineclube. Quando eu devolvi o filme veio a cobrança. Exorbitante. Fui imediatamente à sede da censura onde em plenos anos de chumbo se tinha de liberar qualquer programa. O censor, que já me conhecia, ao ler a cobrança se revoltou: “-Deixe isso aqui que eu mando prender o cara”. Mas eu pedi que não fizesse isso. Mandei uma carta para o Silva dizendo que a Policia Federal daria de graça uma segunda via do certificado. Foi o bastante para ganhar a amizade do distribuidor. E daí em diante sempre me ajudou nas tarefas de cineclube e depois nos cinemas 1,2 e 3.
Quando fui a Recife tratar do I Festival do Cinema Brasileiro de Belém, em 1974, Silva fez questão que eu e Luzia ficássemos em sua casa na praia de Boa Viagem.
Muitas vezes nos encontramos tratando de cinema. Alexandrino brincava que Silva era namorado de Miss Liberty a marca da Columbia. Dedicado a essa empresa jamais a deixou ou ela o deixou. Criando uma firma domestica que chamou de Sétima Arte, foi sempre da Columbia.
Com a morte do Silva acabou uma fase do cinema que eu conheci. Outros distribuidores como Werneck Sereno, Barbosa, Josué, Arlindo Gusmão, todos já se foram. Eles lançavam os filmes em 35 mm (alguns também em 16mm) no setor que ia do Recife ao Acre. E ajudavam bastante na divulgação, contando com os jornalistas. Eu e Luzia como parte desse grupo ganhamos a confiança deles.
Hoje os cinemas de rua ficaram restritos a salas especiais, os borderôs (relatório das exibições para computo da locação) foram levados à Internet. Tudo mudou menos o amor que a gente tinha pelo que via como arte. O Silva está nesse passado que nos sensibiliza.
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