segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O Espectador

Creio que foi no final de 1947 quando estreei o Colégio Moderno fazendo o exame de admissão ao ginásio que vi pela primeira vez Benedito Nunes. Ele e depois a sua mulher Maria Sylvia eram alunos de meu irmão, que ensinava Química. No ano seguinte a editora “O Globo”(na época “Rio-Gráfica”) promoveu a escolha dos “embaixadores da juventude brasileira”, eleição que se processaria nos colégios com o prêmio de uma viagem ao Rio de Janeiro para um encontro nacional. Os candidatos paraenses do Moderno (cada colégio misto indicava um casal) foram Benedito e Eva Andersen. Os cupons-votos saiam nas revistas de quadrinhos(“Gibi” e “Globo Juvenil”) e no jornal local “Folha do Norte”. Eu recortei dezenas de votos pois assinava os “gibis”. Ganharam Bené e Eva. Poucos anos depois o jovem acadêmico de Direito ensinava História e Filosofia no mesmo estabelecimento de ensino em que fez os cursos básicos. O modo como tratava o cinema num tempo em que a educação tradicional omitia esta arte, aproximou-me dele. Quando Orlando Costa fundou o primeiro cineclube local,”Os Espectadores”, lá estava o Bené e as sessões prévias dos filmes (em 16mm) eram feitas em minha casa, no lendário Cine Bandeirante. Nesse espaço a gente se encontrava. E não foi coincidência o fato dele estar entre os idealizadores do Centro de Estudos Cinematográficos da UFPa.

Guardo do Benedito, com relação a cinema, uma frase que disse em uma das sessões do Cine Clube APCC(1967-1986) no auditório quase vazio do Curso de Odontologia:”-Cinema para muitos é sobremesa. Costuma-se dizer que também vai ter, também, um cineminha...”

Listas de melhores com mais amplitude não existiam sem a presença de Benedito. E recordo das apresentações de filmes que ele chegou a fazer, uma delas a de “O Conformista” de Bertolucci no Grêmio Português. Nenhuma das muitas criticas “oficiais” haviam abordado Platão. E quando eu coordenei o livro “A Critica de Cinema em Belém” lembrei uma polêmica sobre “O Boulevard do Crime” de Marcel Carné em que Benedito atacava um detrator do filme que usava pseudônimo feminino. O humor presidia uma resposta bem embasada.

São muitas as lembranças que guardo de Benedito Nunes. Felizmente as tenho. Conviver com uma pessoa que exalava sabedoria a partir de uma simplicidade cativante, de um bom humor que presidia as suas contestações, é uma dádiva. Hoje o mestre-amigo está entre seus comparsas intelectuais que fizeram brilhar forte uma geração: Francisco Paulo Mendes, Orlando Teixeira da Costa, Max Martins, Rafael Costa, todos membros de “Os Espectadores”,um espaço/tempo mais que um cineclube: a sístole da cultura cinematográfica no norte do país.

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